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Projeto "Moisés" deve proteger Veneza de inundações

15 nov 2019 - 12h53
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Barreiras que levam o acrônimo de Mose, nome do profeta bíblico em italiano, devem isolar Veneza do mar. Cheia que atinge a cidade mostra urgência do projeto, mas explosão de custos e corrupção atrasam conclusão da obra.A fim de liberar ajuda financeira mais rapidamente, o governo italiano declarou estado de emergência após as inundações devastadoras em Veneza. O fato de a cidade ter sido mais fortemente atingida pelas enchentes não surpreende os especialistas.

Com a mesma frequência que a Praça de São Marcos é atingida pela "acqua alta", ou seja, pelo fenômeno das inundações, também se discute a finalização do projeto Mose - Moisés, em italiano, e acrônimo de Módulo Experimental Eletromecânico. Trata-se de um projeto de comportas metálicas para proteção contra inundações, cujo planejamento e construção já se arrastam há várias décadas.

Para conter as marés de tempestades, 78 comportas metálicas submersas deverão ser instaladas nas três entradas da laguna de Veneza. Elas são retráteis e, quando necessário, sobem até a superfície para evitar que a água do Mar Adriático inunde a cidade. Como o Moisés bíblico, o maior projeto de infraestrutura da Itália deverá - um dia - ser capaz de dividir o mar, dizem os apoiadores da obra.

Concebido na década de 1960, o planejamento concreto do projeto ocorreu nos anos 1990. Em 2003, o então primeiro-ministro Silvio Berlusconi lançou a pedra fundamental. Desde então, a realização da enorme barragem - inspirada em construções semelhantes na cidade portuária de Roterdã e no rio Tamisa perto de Londres - sempre foi acompanhada de atrasos, explosões de custos, paralisações e escândalos de corrupção.

Atraso de sete anos - até o momento

A princípio, o início de funcionamento estava agendado para 2014. O primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, prometeu na última quarta-feira (13/11) durante uma visita à Veneza inundada, que o Mo.s.e (= modulo sperimentale elettromeccanico) deve entrar em operação no início de 2021. "92 ou 93% estão concluídos", disse Conte.

Quase todas as comportas metálicas amarelas estão ancoradas em sua base de concreto no fundo da laguna. Atualmente, o software e a eletrônica de controle estão em fase de testes. Pouco antes da atual cheia devastadora, outro teste foi agendado, mas foi cancelado devido a inconsistências técnicas.

"Gastou-se muito dinheiro, houve muitas controvérsias e escândalos, mas se considerarmos o todo e tivermos o interesse público em mente, teremos que assumir a decisão de finalizar agora o projeto", disse o chefe de governo italiano, após visitas a bairros inundados.

Resgate controverso

O atual prefeito de Veneza, Luigi Brugnari, é um claro apoiador do grande projeto Mo.s.e. "Se já estivesse concluído, teríamos sido poupados do pior desta vez", afirmou Brugnari na terça-feira, quando a marca da água, 187 centímetros acima da média, atingiu seu nível mais alto desde 1966.

No passado, também houve prefeitos que trabalharam contra o projeto. Ambientalistas também alertam que as comportas perturbariam sensivelmente o ecossistema da laguna. Quando os portões estiverem fechados, a troca natural de água é interrompida. A quantidade de oxigênio na água cairia então acentuadamente em torno de Veneza. O número de fechamentos das comportas e sua duração devem, portanto, ser limitados a alguns dias por ano.

A empresa operadora do Mo.s.e, o Consorzio Venezia Nuova, afirma que as comportas só precisam ser fechadas por algumas horas durante as fortes inundações. No entanto, a tendência é ampliar esse intervalo de tempo devido ao crescente número de níveis críticos de água, explicou uma porta-voz do consórcio.

O professor de engenharia hidráulica Luigi D'Alpaos alertou anos atrás que, devido ao aumento do nível do mar, a barragem precisa ficar fechada por semanas para ser eficaz. No entanto, isso não é compatível com os requisitos ecológicos, afirmou D'Alpaos na revista spektrum. As mudanças climáticas podem fazer com que o nível do mar na laguna suba mais meio metro em algumas décadas, temem os ambientalistas.

Subsidência natural e cruzeiros

Além disso, existem outros fatores que tornam a mundialmente famosa cidade da laguna suscetível a inundações. Veneza, que foi construída sobre estacas de madeira fincadas em solo lamacento, está afundando lentamente. Desde 1897, consta que ela afundou 25 centímetros. Houve planos de embasar a cidade inteira sobre uma fundação de concreto ou elevá-la novamente com água que seria bombeada no subsolo.

Mas esses planos foram reiteradamente rejeitados ao longo dos anos. Em 2017, a administração da cidade decidiu construir um sistema de pequenas barragens, em parte móveis, com bombas para manter secas pelo menos a Praça de São Marcos e a catedral, com seus delicados mosaicos de piso, durante as cheias anuais normais. Mas esse sistema também não foi concluído até hoje.

O crescente número de navios de cruzeiro e o tráfego marítimo como um todo sobrecarregam a cidade de Veneza e as ilhas vizinhas. As ondas corroem os pilares de madeira das casas. Os canais profundos, necessários para navegação, canalizam mais água para a laguna.

Além disso, há também o assoreamento natural da laguna. Como os sedimentos, ela fica cada vez mais rasa, fazendo com que, no caso de tempestades, as massas de água que são levadas pelo vento transbordem mais rapidamente. Se o nível de inundação exceder a marca de 110 centímetros, a prefeitura da cidade emite o alerta "laranja". Nas estatísticas da cidade de Veneza, pode-se ver que, atualmente, esse nível de aviso é emitido quatro vezes mais frequentemente do que há 40 anos.

Altos custos construtivos e operacionais

Quando algum dia a barreira Mo.s.e estiver operacional, ela terá custado ao menos de 6 bilhões a 7 bilhões de euros (cerca de 27 bilhões a 32 bilhões de reais), em vez do 1,36 bilhão de euros previsto inicialmente.

Em junho de 2014, o Mo.s.e vivenciou o seu pior golpe: o então prefeito de Veneza, Giorgio Orsoni, foi preso e depois condenado junto com outros cúmplices, por desviar meio bilhão de euros em conexão com o megaprojeto.

Seguiu-se uma paralisação da obra. Os portões metálicos começaram a enferrujar. Somente anos depois, eles puderam ser movidos novamente. O que também não está claro é como serão financiados os custos de manutenção, calculados entre 20 milhões e 100 milhões de euros.

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