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América Latina

Menina grávida de estuprador reacende tema do aborto no Chile

11 jul 2013 - 13h34
(atualizado às 14h09)
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O caso de uma menina de 11 anos que engravidou após ser estuprada pelo padrastro colocou o direito ao aborto no centro do debate político no Chile. A discussão ganhou força com as declarações do presidente Sebastián Piñera, cujo governo defende a legislação em vigor, que proíbe todo tipo de interrupção da gravidez.

A vítima, chamada Belén, vive no sul do país e está grávida de pouco mais de três meses. O drama da garota fez com que médicos e setores da oposição passassem a pedir a revisão da lei que proíbe a interrupção da gravidez.

Belén, por sua vez, disse que, apesar do grau de violência sofrido, quer manter a gestação. "Para mim vai ser como uma boneca que vou amar muito apesar de ser deste homem que me machucou tanto", disse a menina ao Canal 13 de televisão.

Apesar da disposição da vítima, o presidente do Colégio Médico do Chile (associação que reúne os cirurgiões do país), Enrique Paris, disse que a interrupção da gravidez em casos assim é pertinente e que a lei precisa ser revista.

Para ele, o departamento de Ética do Colégio Médico tem uma posição clara ao defender que o aborto terapêutico deve ser legalizado no país "nos casos em que a vida da mãe está em perigo e que o feto seja inviável, e no caso de violação." "Imaginem uma menina de 11 anos grávida. Ela corre risco, e o bebê pode nascer com deformações", afirmou.

Piñera

Durante um ato público, Piñera entrou no debate na última terça-feira e disse que a menina tinha "surpreendido a todos" ao dizer que estava decidida a ter o bebê. "Ela surpreendeu a todos ao falar, com profundidade e maturidade, que, apesar da dor provocada pelo homem que a violou, quer ter e cuidar do seu bebê", disse o presidente.

O discurso de Piñera e declarações de membros de seu governo contrários a qualquer mudança na lei geraram manifestações de apoio e ira nas redes sociais. "Senhor presidente, uma menina de onze anos não sabe o que quer e não tem maturidade para ficar com um bebê. Fico ofendido com um presidente que diz tamanha estupidez", disse o usuário identificado como Ignácio Chehade Rivera, no mural do Facebook da rádio Cooperativa.

A porta-voz do governo, Cecília Pérez, descartou que a revisão da lei tenha respaldo da atual administração, cujo mandato termina em março de 2014. "Não estamos de acordo com nenhum tipo de aborto, sequer com o terapêutico (em casos específicos, como estupro, má formação do feto e perigo à mãe)", disse Pérez.

A posição do governo foi endossada pela Igreja Católica. O presidente da Conferência Episcopal do Chile, Ricardo Ezzati, disse que a manutenção da gravidez da garota Belén "significa cuidar da vida". Autoridades locais chegaram a ir à Justiça, pedindo o que evolução da gravidez de Belén não seja noticiado pela imprensa. Mas setores da oposição disseram que pretendem levar a discussão adiante.

Herança da ditadura

A atual lei que proíbe todo tipo de aborto no Chile foi sancionada em 1989, nos últimos meses da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990). Durante o regime militar, a interrupção da gravidez em casos específicos era permitida.

Diante do caso, a ex-presidente Michelle Bachelet (2006-2010), candidata às próximas eleições presidenciais, em novembro deste ano, defendeu que o direito aborto seja permitido no país. "Acho que o aborto deve ser autorizado principalmente nos casos de violação ou por questão médica, não importando a idade da pessoa. Mas no caso desta menina de onze anos (o aborto) é ainda mais importante. Ela tem toda uma vida pela frente e deve ser protegida", afirmou.

Durante sua presidência, Bachelet promulgou a lei que permitia a pílula do dia seguinte - na época, o debate gerou forte polêmica no país. "Que pena que essa menina não tenha tomado a pílula do dia seguinte", disse Bachelet.

A ex-presidente também disse que não é possível negar o fato de que muitas chilenas praticam o aborto, apesar da proibição. "A realidade existe e não podemos fingir que o aborto não acontece no país. O problema é que ele é possível somente para quem pode escolher e pagar (por ele)", disse Bachelet.

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