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América Latina

Argentina: milhares marcham em memória de promotor morto

Sob forte chuva, manifestantes caminharam até a sede do governo

18 fev 2015 - 21h12
(atualizado às 21h57)
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 Milhares de pessoas se reúnem em Buenos Aires para exigir respostas sobre a misteriosa morte do promotor Alberto Nisman
Milhares de pessoas se reúnem em Buenos Aires para exigir respostas sobre a misteriosa morte do promotor Alberto Nisman
Foto: AP

Promotores e políticos da oposição lideraram nesta quarta-feira uma grande passeata em silêncio, um mês depois da misteriosa morte de um promotor que acusou o Irã pelo atentado antissemita de 1994 e a presidente Cristina Kirchner por acobertar os suspeitos.

Sob uma forte chuva, dezenas de milhares de manifestantes, segundo uma estimativa preliminar da polícia metropolitana, marcharam protegidos por um mar de guarda-chuvas, avançando, calmamente, no trajeto que separa o Congresso de Buenos Aires e a Praça de Maio, em frente à sede do governo.

"Homenagem ao promotor Alberto Nisman", dizia um cartaz gigante exibido por seis promotores - confrontados com o governo - que convocaram esta manifestação de 1,7 km, que contou com a adesão maciça da classe média da capital argentina.

Pingando da cabeça aos pés, os promotores e a ex-mulher de Nisman, a juíza Sandra Arroyo Salgado, e as duas filhas que ela teve com o promotor, de 15 e sete anos, foram aplaudidos ao serem reconhecidos pelas pessoas.

Em ordem, respeitando o lema do silêncio, casais e, sobretudo idosos, só soltaram a voz para pedir justiça e murmuraram o hino nacional.

"Estou aqui para pedir que haja justiça por este pobre homem que deu a vida pela verdade", disse à AFP Marta Cánepal, uma professora de 65 anos.

Argentinos se reúnem na Praça de Maio em manfestação realizada em memória de Alberto Nisman
Argentinos se reúnem na Praça de Maio em manfestação realizada em memória de Alberto Nisman
Foto: AP

Em outras cidades argentinas, como Santa Fé e Mar del Plata, centenas de cidadãos também aplaudiam nas praças em solidariedade.

O ato teve réplicas também em frente às embaixadas argentinas em Brasil, Espanha, Itália, França, Austrália, Israel, Chile e Uruguai.

O governo criticou o protesto, convocado para às 21h00 GMT (19H00 de Brasília), considerando-o parte de uma manobra "golpista", e afirmou que a denúncia do falecido promotor Alberto Nisman contra Kirchner é uma tentativa de envolver o país no conflito do Oriente Médio.

"Peço que abram bem os olhos. Não estou falando de conspirações, é um mundo de interesses em que uns querem subordinados e que enfrentam governos como este", declarou Kirchner em um ato público transmitido em rede nacional horas antes da manifestação.

Ao inaugurar a ampliação de uma central nuclear 150 km ao norte de Buenos Aires, a presidente sugeriu que a passeata responde à interesses que buscam fazer fracassar as políticas de seu governo, entre as quais destacou a produção de urânio enriquecido para fins pacíficos.

A origem do caso, que envolve uma confusão judicial e política, é a explosão que destruiu há quase 21 anos a mutual judaica argentina AMIA, um ataque que deixou 85 mortos e 300 feridos.

Nisman foi encontrado morto no banheiro de seu apartamento em 18 de janeiro, com um tiro na cabeça de uma pistola calibre 22 emprestada por um colaborador. Havia apenas uma bala no chão e o corpo obstruía a porta.

 Um grupo de procuradores seguram uma bandeira com a frase "Homenagem ao procurador Nisman; marcha silenciosa", durante ato em homenagem a Alberto Nisman
Um grupo de procuradores seguram uma bandeira com a frase "Homenagem ao procurador Nisman; marcha silenciosa", durante ato em homenagem a Alberto Nisman
Foto: AP

Na Argentina quase ninguém acredita na hipótese de suicídio. Nisman havia acusado Cristina Kirchner quatro dias antes e na manhã seguinte a sua morte deveria justificar a denúncia no Congresso.

Em 2005, com o apoio do falecido ex-presidente Néstor Kirchner (2003-2007), Nisman acusou do atentado contra a AMIA ex-governantes iranianos, entre eles o ex-presidente Ali Rafsanjani.

Mas em 2013, Cristina Kirchner assinou um acordo com o Irã para criar uma comissão de investigação integrada por juristas que não fossem nem argentinos, nem iranianos, que levaria os acusados aos bancos dos réus.

Nisman e a numerosa comunidade judaica discordaram do acordo e alegaram que Teerã não era confiável.

Na acusação contra Kirchner, apresentada na sexta-feira pelo promotor Gerardo Pollicita, Nisman disse que a presidente tentava liberar das acusações os iranianos em troca de petróleo, apesar do combustível de Teerã ser incompatível com as refinarias argentinas.

Outro argumento é que Kirchner pediu a retirada dos pedidos de captura internacional contra os iranianos, mas a Interpol negou a acusação.

"Não há nenhuma prova que mostre que a presidente ou o ministro (das Relações Exteriores, Héctor Timerman) ou alguém mais oferecia impunidade aos autores do atentado", disse o ex-procurador-geral do Tribunal Penal Internacional (TPI) Luis Moreno Ocampo.

Moreno Ocampo considera que a passeata deve ser usada para pedir a reformulação dos serviços de inteligência, "que vêm da ditadura (1976-83) e são inaceitáveis em uma democracia".

A dissolução da Secretaria de Inteligência será aprovada nesta quarta-feira por iniciativa de Kirchner, mas a esquerda denuncia que a nova agência utilizará os mesmos agentes questionados.

AFP Todos os direitos de reprodução e representação reservados. 
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