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Congelamento de salários e greve: entenda a crise na USP

Problemas suscitaram discussões sobre cobrança de mensalidade, proibida pela Constituição

22 jun 2014 - 11h38
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Cena de protesto de funcionários, professores e alunos da USP (foto de arquivo)
Foto: Ivane Sousa / Sintusp / Divulgação

A crise financeira das universidades estaduais paulistas, tornada evidente com as greves, trouxe novamente a discussão sobre a cobrança de mensalidade nas universidades públicas. A Constituição garante a gratuidade do ensino público. Ainda assim, há quem defenda que a cobrança pelo ensino ajudaria a valorizar e equilibrar as finanças das universidades.

Em maio, o Conselho de reitores das Universidades Estaduais de São Paulo (Cruesp) anunciou o congelamento dos salários de professores e servidores das três universidades do Estado: USP, Unicamp e Unesp. A justificativa seria o peso que as folhas de pagamento representariam aos orçamentos das instituições, que tem o repasse de 9,57% do ICMS arrecadado pelo governo do Estado. O gasto com pessoal consumiria 105% dos recursos da USP, 97,33% da Unicamp e 95,42% da Unesp.

Em nota, o reitor da USP, Marco Antônio Zago, informou que, para honrar compromissos, teve que buscar recursos da reserva da universidade que teve uma queda de R$ 3,23 bilhões, no final de 2012, para R$ 2,31 bilhões em abril de 2014.

Descontentes, os trabalhadores das instituições entraram em greve no fim de maio. O Fórum das Seis, que reúne os sindicatos de professores e servidores das três universidades, argumenta que a ampliação de vagas nas faculdades (93% nos últimos anos, segundo a entidade) deve ser acompanhado de um aumento no repasse do governo do Estado. A Associação dos Docentes da USP (Adusp) reclama que valores referentes a programas do governos paulista são descontados do ICMS e não entram no valor total do cálculo de repasse para as universidades.

Os servidores reclamam ainda que as reitorias não cobram do governo a correção do cálculo, que, segundo a Adusp, implicaria em quase R$ 2 bilhões não repassados entre 2008 e 2013. Mesmo com o cálculo atual, nos três primeiros meses de 2014, o governo de São Paulo deixou de repassar de R$ 209 milhões, previstos no orçamento. A Secretaria da Fazenda explica que a arrecadação do ICMS foi menor que o previsto para o período, por isso a diminuição do repasse.

O coordenador do Sindicato dos Trabalhadores da Unicamp (STU), Valério Paiva, questiona os números apresentados pelo Cruesp. “Eles apresentam os números do ICMS, mas esta não é a única fonte de renda das universidades", afirma. Paiva ainda acusa a reitoria da Unicamp pelo pagamento de “supersalários” a determinados cargos.

Em sessão ordinária do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, no dia 10 de junho, a prestação de contas da universidade foi rejeitada. O voto do relator da matéria, Antonio Roque Citadini, aponta irregularidades como pagamentos de salários à alta administração da universidade que superam o teto do estado e contratações irregulares através da Fundação da Unicamp (Funcamp).

Cobrança de mensalidade

Desde 1995, tramita na Câmara dos Deputados uma Proposta de Emenda à Constituição que autoriza a cobrança de mensalidades nas universidades públicas. A PEC 123/1995 é de autoria do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB/ PR), que, procurado pela reportagem, não quis se pronunciar sobre o assunto neste momento.

A Folha de São Paulo, em reportagem do dia 2 de junho, apresenta um cálculo em que 60% dos alunos da USP poderiam pagar mensalidade. O número foi questionado pela ombudsman do jornal por colocar todos os pós-graduandos da instituição como potenciais pagantes. A simulação foi feita a partir dos dados socioeconômicos dos calouros de 2013. Em 2014, os alunos oriundos de escola pública representaram 32,3% dos ingressantes na universidade, atingindo um recorde histórico para a instituição.

Para o professor Sadi Dal Rosso, do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília, que pesquisa gratuidade e democracia na educação superior, a cobrança não é uma alternativa e poderia inclusive aumentar a crise. "O sistema de cobrança não é suficiente para manter o padrão das universidades públicas”, afirma.

Dal Rosso salienta ainda a importância da gratuidade para a democratização do acesso. “Cobrando mensalidades, se estabeleceria um ensino pago para toda a população. Isto é bom para a democracia? Teria que se buscar outra solução, ou se proibiria o ensino superior aos pobres”.

Já o professor Leandro Tessler, do Departamento de Física Aplicada da Unicamp, acredita que, mesmo sem cobranças, o ingresso dos estudantes de escola pública no ensino superior é prejudicado. “O Brasil é o único país que cria uma barreira no ensino superior. Mais de 90% dos estudantes que se formam no ensino médio, em São Paulo, são de escola pública. No ensino superior, o número de formando vindos de escola pública gira em torno de 30%”, diz.

Tessler acredita que as pessoas confundem público com gratuito. Para ele, a cobrança ajudaria a valorizar as universidades federais e estaduais. "Não imagino um valor proibitivo, a gente precisa buscar modelos que garantam que os talentos não sejam desperdiçados. A taxa de abandono nas universidades públicas é muito alta.” O professor também entende que a formação superior representa um aumento salarial dos profissionais formados, então, considera justo que haja uma compensação ao Estado.

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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