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Coronavírus

Trump nega aumento de casos: "EUA nunca irão fechar"

Nas últimas duas semanas, as infecções cresceram 78% em meio à reabertura do país e à circulação de americanos durante as férias de verão

8 jul 2020 - 12h45
(atualizado às 12h46)
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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. 07/07/2020. REUTERS/Kevin Lamarque.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. 07/07/2020. REUTERS/Kevin Lamarque.
Foto: Reuters

Com o número de casos de casos de covid-19 saindo de controle nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump tem insistido no negacionismo da crise de saúde e vem tentando se descolar do problema. Nas últimas duas semanas, as infecções cresceram 78% em meio à reabertura do país e à circulação de americanos durante as férias de verão. Mas Trump preferiu afirmar que o vírus é inofensivo, politizou a discussão sobre a reabertura de escolas, têm se envolvido na polêmica defesa de símbolos racistas e formalizou que o país deixará a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A ameaça de retirar os EUA da OMS vem sendo feita desde abril, mas nesta terça-feira foi formalmente notificada à Organização das Nações Unidas. O americano acusa a OMS de ser leniente com a China e de ter tomado decisões erradas sobre o coronavírus. Os EUA são uma das principais fontes de financiamento da organização.

Depois de atingir o que parecia o pior momento, em abril, com cerca de 35 mil novos contaminados por dia, os EUA conseguiram desacelerar as infeções para a casa de 20 mil diagnósticos de covid-19 a cada 24 horas em maio. Nas últimas três semanas, no entanto, o país assiste a curva de infecções acelerar novamente batendo o recorde diário de 57 mil casos de coronavírus nos primeiros dias de julho. Na terça-feira, 7, Trump disse que os EUA "nunca irão fechar", pressionando pela continuidade da retomada econômica a despeito da situação de saúde.

O problema migrou da região de Nova York para Estados do sul e oeste do país, com surtos na Flórida, Texas, Arizona e Califórnia. Ao menos 40 dos 50 Estados americanos viram o número de casos per capita aumentar nos últimos 14 dias.

Trump tem argumentado que a mortalidade causada pelo vírus é baixa nos EUA, usando dados falsos. O presidente chegou a dizer que 99% dos casos eram "totalmente inofensivos", contrariando a equipe médica do governo. A taxa estimada de mortalidade da covid-19 nos EUA é de 4,5%, e não 1,0%, como o presidente sugere.

"É uma falsa narrativa ver conforto em uma taxa de mortalidade baixa", disse o epidemiologista Anthony Fauci. Integrante da Força-Tarefa do governo Trump contra o coronavírus, Fauci é considerado o maior especialista no tema. Não foi a primeira vez que ele precisou corrigir uma informação do presidente.

Apesar do aumento dos casos, o número de mortes por dia no país tem caído. Segundo Fauci, isso se deve ao fato de que a nova leva de infecções atingiu os mais jovens - que foram os primeiros a se expor conforme as cidades iniciaram a retomada das atividades. A média de idade dos diagnosticados com covid-19 caiu 15 anos, na comparação com a do início da pandemia, o que diminui o risco de morte.

"Mas há muitas outras coisas perigosas sobre o vírus", disse Fauci. Especialistas alertam que mesmo quando o vírus não é mortal pode causar complicações de longo prazo e extensos períodos de internação. Além disso, epidemiologistas que apontam que o número de mortes registrado agora corresponde a infecções que aconteceram cerca de um mês atrás, quando o processo de reabertura tinha apenas iniciado.

Em férias de verão e diante dos sinais trocados sobre o vírus, com Estados promovendo a reabertura, americanos têm uma vida que já inclui ida a restaurantes, salões de beleza, encontros de grupos de amigos, praia e viagens de verão, enquanto especialistas tentam convencer a população de que o vírus não desapareceu. Os EUA "ainda estão até os joelhos na primeira onda" da pandemia, disse Fauci.

Os EUA têm quase 3 milhões de casos confirmados de coronavírus e mais de 130 mil mortes. Uma atualização do modelo estatístico do Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME), da Universidade de Washington, atualizado ontem projeta 208 mil mortes nos EUA até novembro. O modelo é o que tem embasado as políticas de saúde da Casa Branca.

Ontem, em um evento na Casa Branca, Trump disse que o país estaria "muito pior" se seu governo não tivesse adotado medidas corretas na condução da crise. Depois de negar a gravidade da pandemia durante os primeiros meses do ano, Trump apoiou as diretrizes federais de distanciamento social no dia 16 de março. A defesa do isolamento não durou muito mais de um mês, quando ele passou a pressionar governadores pela reabertura dos negócios, diante do crescente desemprego no país, que pulou dos 3,5% em fevereiro para 14% em maio.

Os briefings diários da força-tarefa contra o coronavírus da Casa Branca, que informavam a população sobre as medidas de saúde, deixaram de acontecer no fim de abril, ao mesmo tempo em que Estados do sul do país começaram o plano de retomada econômica. No fim de junho, as entrevistas coletivas voltaram, mas com menor periodicidade e já fora da Casa Branca, na sede do Departamento de Saúde.

Em 29 de abril, o governador da Flórida, o republicano Ron de Sanctis, um aliado de Trump, comemorou: "não tivemos uma explosão de casos". Sem um surto identificado no Estado, a reabertura do comércio na Flórida começou em 4 de maio, mais de um mês antes da que entrou em vigor na cidade de Nova York.

Nas últimas semanas a Flórida passou a viver um pesadelo, correndo o risco de repetir a situação vivida por Nova York em abril. A média de casos no Estado tem dobrado a cada dia desde o fim de junho, chegando a mais de 7,3 mil novas infecções nesta terça-feira. Pelos menos 40 hospitais da Flórida anunciaram que não possuem mais leitos de UTI disponíveis.

As praias da região de Miami foram fechadas no fim de semana do feriado de 4 julho, para evitar aglomerações, mas as autoridades locais ainda titubeiam em adotar medidas mais drásticas. O governador anunciou que as escolas vão retomar as aulas no próximo semestre. O prefeito do condado de Miami-Dade, onde fica a cidade de Miami, chegou a anunciar que academias de ginástica e restaurantes teriam que fechar as portas nesta quarta-feira, mas recuou e afirmou que a área externa de restaurantes poderá continuar a atender clientes em mesas de até quatro pessoas.

Trump planeja uma viagem à Flórida na sexta-feira, mas não para tratar de coronavírus. A ideia é que ele tenha uma agenda e faça discurso sobre combate ao tráfico de drogas. O Estado é considerado um dos mais importantes na disputa eleitoral deste ano. Em 2016, os moradores da Flórida ajudaram Trump a se eleger presidente. A Flórida tem o terceiro maior número de delegados no Colégio Eleitoral, com 29 cadeiras.

O presidente tem evitado responder perguntas dos jornalistas enquanto os casos explodem e sua popularidade cai mais de dez pontos, abrindo uma vantagem eleitoral para o democrata Joe Biden.

O aumento das infecções levou Estados a decretarem a obrigatoriedade do uso de máscaras. Até o governo republicano do Texas adotou a medida, diante do aumento das internações em Houston.

Trump decidiu politizar a decisão sobre abertura de escolas. O ano letivo dos Estados Unidos começa entre o fim de agosto e o início de setembro. Sem vacina e com o vírus ainda em circulação, governadores e prefeitos têm precisado decidir qual será o plano para a educação no início do semestre que vem.

Nesta terça-feira, em uma cerimônia na Casa Branca, Trump disse que os que não reabrirem as escolas para ensino presencial estarão adotando "uma medida política". Universidades como Harvard e Princeton já anunciaram que o próximo semestre deve ter a maior parte dos cursos de maneira online. Em Harvard, as atividades presenciais devem incluir no máximo 40% dos alunos por vez.

Estadão
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