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Maioria de pacientes hospitalizados com covid ainda tem sintoma seis meses após diagnóstico

Estudo feito com 1.733 pacientes internados no começo da pandemia na China mostra persistência principalmente de fadiga e fraqueza muscular

8 jan 2021 - 20h40
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A maioria dos pacientes que foram hospitalizados com covid-19 no início de 2019 na China continuaram apresentando pelo menos um sintoma da doença mesmo seis meses depois de terem apresentado os primeiros sintomas. É o que revela um estudo divulgado nesta sexta-feira, 8, na revista médica The Lancet.

Relatos de prolongamento dos sintomas e de sequelas são comuns entre pacientes e já motivaram a criação de centros de reabilitação específicos para essas pessoas, o que mostra que ser um "recuperado" do coronavírus não significa necessariamente estar curado. Mas o trabalho de agora é o primeiro a traduzir esse impacto de mais longo prazo em números. Estudos anteriores tinham sido feitos com menos pacientes e por um tempo menor.

Os pesquisadores, liderados por Chaolin Huang, do Hospital Jin Yin-tan, de Wuhan, onde surgiu a doença, avaliaram 1.733 pacientes do hospital diagnosticados entre janeiro e maio com acompanhamento entre junho e setembro. A maioria (76%) ainda apresentava pelo menos um sintoma após seis meses do diagnóstico.

O mais comum a persistir foi fadiga e fraqueza muscular (63% dos pacientes), seguido de dificuldades para dormir (26%). Ansiedade e depressão foram reportados por 23% dos pacientes.

Aqueles que ficaram mais gravemente doentes enquanto estavam no hospital apresentaram com maior frequência, depois de seis meses, a função pulmonar prejudicada e anormalidades detectadas em imagens do tórax, o que poderia indicar uma lesão de órgão e podem demandar uma intervenção de mais longo prazo, segundo os autores.

Somente uma pequena parcela (390 pacientes) passou por esses testes complementares para avaliar a função pulmonar. Entre eles, aqueles que precisaram de ventilação (nível mais grave), 56% tiveram uma redução do fluxo de oxigênio dos pulmões para a corrente sanguínea. Entre os que precisaram de oxigênio, 29% tiveram esse impacto.

Os pacientes avaliados no estudo tinham, em média, 57 anos. Eles receberam visitas dos pesquisadores entre junho e setembro e foram, em média, acompanhados por 186 dias. Durante as visitas eles eram entrevistados sobre a evolução dos sintomas e questões relacionadas à qualidade de vida. Foram também submetidos a avaliações físicas, testes de laboratório e a uma caminhada de seis minutos para checar sua resistência.

Os pacientes que tiveram o quadro mais severo da doença tiveram um desempenho pior nesse teste, conseguindo caminhar uma distância bem pequena naquele intervalo de tempo, na comparação com os quadros moderados.

Os pesquisadores mediram ainda os níveis de anticorpos neutralizantes nos pacientes e observaram em 94 deles uma queda de 52,5% após seis meses, o que levanta preocupações sobre a possibilidade de serem reinfectados pelo vírus.

"Estamos apenas começando a entender alguns dos efeitos de longo prazo da covid-19 na saúde dos pacientes. Nossa análise indica que a maioria dos pacientes continua a viver com pelo menos alguns dos efeitos do vírus após a alta hospitalar e destaca a necessidade de cuidados pós-alta, especialmente para aqueles que apresentam infecções graves", comentou em nota à imprensa Bin Cao, do Centro Nacional de Medicina Respiratória, que orientou o estudo.

Ele aponta que o trabalho reforça a importância de que sejam feitos estudos de acompanhamento mais longos em populações maiores, a fim de compreender todo o espectro de efeitos que a covid-19 pode ter nas pessoas.

Estudo brasileiro também analisa impactos de longo prazo

Para o pneumologista brasileiro Carlos de Carvalho, do Incor e do Hospital das Clínicas de São Paulo, que participa de um estudo nacional para identificar sequelas no longo prazo nos pacientes de covid-19, mais trabalhos como este vão ajudar não somente a orientar a reabilitação de pacientes no futuro como também ajudar no tratamento dos que precisarem ser hospitalizados.

A pedido do Estadão ele avaliou o estudo chinês e disse que os achados são bastante relevantes. Segundo o pesquisador, os sintomas mais comuns relatados pelos pacientes de Wuhan também são mencionados no Brasil.

O trabalho do HC ainda está na fase inicial. A ideia é acompanhar ao longo de um ano 1.200 pacientes que foram internados no hospital. Segundo Carvalho, 10% da amostra começou a ser avaliada em dezembro, seis meses após ser diagnosticada.

"Ainda não temos os resultados, mas numa primeira análise, longe de estar fechada, percebemos os pacientes um pouco mais queixosos do que esperávamos. Eu tinha uma expectativa de que iria encontrar queixas respiratórias ou cardíacas em no máximo uns 20% dos pacientes após seis meses e já vimos que é mais que isso", relata Carvalho.

Uma parte dos participantes já tinha sido avaliada um e três meses após o diagnóstico e alguns dos que já tinham revelado fadiga ou fraqueza foram encaminhados para um programa de reabilitação. Os mais graves foram para o Instituto de Reabilitação Lucy Montoro. "Agora com seis meses, vamos poder comparar se quem já passou por uma reabilitação voltou melhor do que quem não passou", diz.

Uma análise feita pela Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo em novembro já apontou que até 40% dos curados da covid-19 têm sequelas, o que amplia o desafio dos hospitais.

O objetivo da pesquisa, explica Carvalho, é primeiramente conseguir descrever com mais detalhes como se dá a história natural da doença, como ela evolui com o passar do tempo. "Sabemos que a pneumonia viral causada pela covid-19 pode deixar lesões, tipo cicatrizes. Será que quem era fumante pode ter mais do quem não é, por exemplo? Preciso saber como se dá a interação da infecção com quem já tinha alguma lesão prévia, algum problema cardíaco, exemplifica o pesquisador.

"Quero saber se, ao usar o aparelho de respiração, uma pressão mais forte pode gerar uma lesão adicional. São várias dúvidas sobre o que pode deixar sequelas que pretendemos responder com esse tipo de estudo", diz. Esses dados permitirão também tomar cuidados com futuros tratamentos dependendo do histórico de cada paciente, além de mostrar se é caso de promover reabilitações mais precocemente.

Estadão
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