'Vamos usar o dinheiro que tomamos da mulher do Marcola para financiar a Segurança', diz Derrite
Secretário da Segurança de SP afirma ser favorável a uma agência nacional antimáfia para combate ao crime organizado e prevê estruturar departamento de delitos cibernéticos, uma 'Rota da internet'
Guilherme Derrite exibe em seu gabinete a grande tela onde pode acessar os milhares de dados das câmeras acopladas ao Muralha paulista, rede de monitoramento do governo estadual. Ali também estão os números do Recupera São Paulo, programa que destina o dinheiro apreendido pelas autoridades com o crime organizado para a segurança pública.
Foi ali que o secretário contou que o Marco Willians Herbas Camacho - o Marcola, um dos principais líderes do Primeiro Comando da Capital (PCC) - acaba de perder a casa em Alphaville, na Grande São Paulo, avaliada em R$ 3 milhões, e outros R$ 460 mil apreendidos no imóvel pela Polícia Civil.
O dinheiro irá para a Secretaria de Segurança Pública. Esse seria só o começo do programa que pretende irrigar os cofres da pasta com os recursos sequestrados do crime organizado.
No dia do assassinato do ex-delegado-geral Ruy Ferraz Fontes, executado em Praia Grande (SP) quando saía do trabalho, Derrite defendeu ainda a criação de uma agência nacional antimáfia, nos moldes do que existe na Itália.
Eis os principais pontos de sua entrevista sobre a criminalidade comum e organizada no Estado:
Há duas grandes tendências: a digitalização do crime, que migra para a área cibernética e a baixa de crime do crime de rua, principalmente o roubo. Como deve ser a polícia para enfrentar essa realidade?
Quero destacar a polícia que encontramos. Mesmo tendo vindo de uma das polícias do Estado - a minha formação foi na Polícia Militar -, confesso que fiquei um pouco assustado com a falta de integração que existia no início da gestão entre as forças policiais. Cada polícia tinha a sua política em todas as áreas: políticas para mulher, para roubo de carga, de celular. Cada polícia tinha a sua base de dados, a sua fonte de informação e não se comunicavam. O primeiro desafio foi centralizar essas informações e fazer com que as polícias compartilhassem os dados. Trouxemos para cá a coordenação dos trabalhos, sempre com órgãos colegiados, com delegados e oficiais, mas para que pudéssemos ter o real diagnóstico do que acontecia nas ruas. Passamos então a dividir as informações dos boletins de ocorrência da Polícia Militar, da Polícia Civil, centralizar essas informações. A partir do diagnóstico, o que demorou um ano para acontecer, criamos as políticas públicas chamadas SP's: você tem o SP Vida, SP Recrim de Reincidência Criminal, SP Mulher, SP Carga, SP Mobile, o que envolve questão dos aparelhos celulares. Começamos a ter o diagnóstico real do que acontecia para controlar o crime e apresentar resposta do Estado a esses problemas públicos.
Como assim, secretário?
Pudemos ter o diagnóstico de que a boa parte dos crimes são cometidos por pessoas que estavam em livramento condicional ou era procurados pela Justiça ou respondendo por algum crime na sua fase de liberdade. O estudo apontava que 47% das prisões em flagrante eram por por criminosos que estavam nessas condições. Nesse contexto, muitos municípios, tinham as suas iniciativas particulares. Faltava integração. Indaiatuba, Campinas, Sorocaba, Guararema, por exemplo, tinham iniciativas próprias, mas que não tinham tanta efetividade porque o que há de mais rico - as informações, os dados criminais - eram exclusivos da Secretaria de Segurança Pública. Ou seja, base de dados de indivíduos procurados pela Justiça, de veículos roubados e furtados, ficava concentrado aqui. O prefeito tinha um parque tecnológico, que ele usava muitas vezes como ferramenta de gestão ou até como um um capital político. Instalei uma 'muralha' campineira, 'muralha' de Sorocabana, 'muralha' de Indaiatuba. Basicamente câmeras de vigilância. Só que necessitavam, primeiro, de ação humana, alguém que ficasse observando o tempo todo. Dentro desse contexto, criamos o programa Muralha Paulista, que visa a, em um primeiro momento, integrar todos esses municípios que possuem seus parques tecnológicos. As imagens são enviadas aqui para o órgão central que, pela primeira vez na história, devolve esses alertas de indivíduos procurados pela Justiça, de veículos roubados e furtados para os municípios, principalmente aqueles que possuem guardas municipais. É uma política pública de controle da mobilidade criminal.
Quantos municípios estão incluídos nela?
Temos 598 municípios já com convênio, mas vamos chegar em 645 (total de cidades do Estado). Há 49 municípios totalmente integrados, incluindo a capital, que representam quase 50% de cobertura da população do Estado. Estamos abrindo para todos os particulares a possibilidade de se integrarem a esse sistema de monitoramento. Grandes redes de supermercados e farmácias, que possuem câmeras de monitoramento, vão poder e já estão, incluindo pessoas físicas. Para os municípios que não têm absolutamente nada nem poder de investimento, está previsto, em novembro, o Estado realizar uma licitação para preencher as lacunas de câmeras de monitoramento que estarão ligadas ao Muralha Paulista.
Serão quantos municípios?
São 319 municípios que não possuem absolutamente nada. Tínhamos 830 milhões de placas de veículos lidas só no mês de julho e mais de 113 mil alertas gerados. Esses alertas são de veículos roubados e furtados ou de veículos que constam no CPF de alguma pessoa procurada pela Justiça. Foram mais de 4,3 mil procurados. Os alertas serão gerados em quatro formas. Primeiro, Copom (Centro de Operações da PM). Vai ter uma cabine específica para o Muralha Paulista. O segundo ponto é o Centro de Operações de Inteligência da Guarda Municipal. Essa central também vai receber - é uma dupla checagem. O terceiro ponto de checagem será o tablet, o terminal portátil de dados das viaturas. E o quarto ponto de checagem será o celular, por meio do aplicativo Muralha Connect, tanto para o policial militar, policial civil, quanto para guardas municipais. É realmente uma política de integração.
Com tantos acessos, como se terá controle sobre o uso do dado?
Copom, Central de Operações da Guarda Municipal se (a cidade) tiver, tablet das viaturas e celular de cada um vai baixar o seu aplicativo com login e senha, com o sistema de compliance próprio do Programa Municipal Paulista, que foi uma grande preocupação. A Autoridade Geral de Proteção de Dados, do governo federal participou conosco.
Ao se criar um sistema grande como esse, tem de se pensar na segurança, no controle e fiscalização. Como impedir que o sistema induza o policial a erro ou que seja mal usado?
Tivemos essa precaução desde o início. O próprio sistema gera um limite de acesso, dependendo da senha, da função exercida. Por exemplo, o operacional da ponta da linha vai receber o alerta. Ele não terá acesso como vai ter o comandante-geral da PM, o delegado-geral ou um diretor da Polícia Civil. São acessos hierarquizados, criptografados e que permitem compliance robusto, ou seja, em qualquer acesso, tem de colocar login e senha. Vai ser rastreável dentro do próprio sistema. Cada um desses municípios, na hora de assinar o convênio Muralha Paulista, tem de indicar um CPF de um técnico responsável pela gestão de dados, pelo sistema de comprometimento da informação que for gerada. Então, gera uma série de implicações, até jurídicas e penais no futuro, para um vazamento de senha, por exemplo. Mas tivemos uma outra precaução grande. Foi com o anonimato. Ouso dizer dizer que, com certeza, a minha face e a sua foram lidas, em algum momento, na capital, em Sorocaba ou em Campinas. O que garante a transparência é que garantimos o anonimato. Quando o meu e o seu rosto passam por uma câmera com reconhecimento facial, se ele não estiver no grupo de 200 mil criminosos procurados pela Justiça, essa informação é desprezada pelo próprio sistema. Ou seja: ela não pode ser aproveitada em hipótese alguma, garantindo o que a Lei Geral de Proteção de Dados preconiza.
Será possível planejar o policiamento, a disposição das viaturas com o uso das informações das câmeras? Vai ser possível prever o crime?
Meu objetivo, com o Muralha Paulista, é que não vamos depender mais da proatividade do capitão, comandante de companhia. O policial, no início do serviço vai colocar um tablet ou um celular na viatura, clicar o botão e terá um 'waze do patrulhamento' (em referência ao aplicativo que dá coordenadas no trânsito) nas suas 12 horas ou oito horas de serviço. Patrulhamento direcionado pelas evidências e pelos indicadores criminais analisados automaticamente pelo sistema, com inteligência artificial, com leitura de milhares de boletins de ocorrência, análises criminais já realizadas.
Ainda faz sentido ter uma delegacia de roubo a banco em São Paulo, se neste ano tivemos só dois roubos a banco no Estado, em vez de um departamento de crimes cibernéticos, por exemplo, na Polícia Civil?
Concordo plenamente. Duas coisas que tenho pretensão na gestão: que a Divisão de Crimes Cibernéticos, hoje dentro do Deic, se torne departamento próprio. Não só por criar um departamento, uma diretoria, mas com aumento do número de delegacias e de efetivo por causa da migração de crimes para o meio cibernético. Quero também alçar como diretoria de departamento as coordenadoria das Delegacias das Mulher, que hoje são uma assessoria especial ligada à Delegacia-Geral da Polícia Civil.
Não seria preciso, além do departamento, equipes cibernéticas em todo os departamentos do interior?
É o caminho do futuro, sem dúvida alguma. Uma política implementada na nossa gestão foi que ampliamos muito os investimentos no laboratório de lavagem de dinheiro do DIPOL 9departament de Inteligência Policial). Por quê? Justamente por essa tendência dos crimes cibernéticos aumentaram exponencialmente, mas, para além disso, atacar a lavagem de dinheiro do crime organizado é um dos dos três pilares da nossa gestão no combate ao crime organizado. Monitoramento, busca e captura das principais lideranças; inviabilizar a cadeia logística do crime e o terceiro ponto é impedir a lavagem de dinheiro. E identificamos mais de R$ 21 bilhões em lavagem de dinheiro do PCC.
Tem gente que já fala que hoje a Rota é uma polícia do século passado, que o policial hoje tem de estar na internet em vez de estar entrando numa comunidade, pois o crime migrou e a polícia tem que acompanhar. Da mesma forma que a Polícia Civil teria de mudar, essa estrutura da Tropa de Choque, com cinco batalhões, também teria de ser enxugada para colocar esses homens, por exemplo, patrulhando a internet?
No caso da Polícia Militar, não. Porque muitas investigações que acontecem nessa parceria histórica que temos com o Gaeco em São Paulo ou em operações da Polícia Civil, no fim das contas, necessitam de uma tropa que vá realizar um trabalho de campo aí, uma tropa preparada, treinada. A rota evoluiu muito nos últimos 15 anos. A Rota migrou desse patamar de patrulhamento tático em em área urbana para operações de inteligência, apoio nessas operações de inteligência. Então, precisamos ter uma tropa que, no final das contas, vá cumprir 156 mandados de busca, por exemplo, como na operação Carbono Oculto. Agora, não descarto, sem dúvida alguma, nessa questão dos trabalhos de internet, o monitoramento de líderes de facções, não no serviço investigativo, que isso é exclusivo da Polícia Civil.
Se a dona Maria liga para o 190 e fala; 'Por favor, acabaram de tomar meu dinheiro no banco, no meu celular, invadiram o computador da minha casa'. O que a polícia pode fazer por ela? Antes, se o ladrão invadisse a casa dela, despachava a viatura. Que resposta a polícia pode dar para ela? Não seria necessário treinar o atendente do 190 para dar o primeiro atendimento à vítima do crime cibernético, como bloquear celular, mudar senha etc?
Isso em certa medida acaba com acontecendo, mas o o mais importante é o seguinte, os outros crimes comuns não pararam de acontecer, como roubo e furto. Claro que a gente tá numa tendência de queda, apresentando as maiores reduções de indicadores criminais, mas os crimes ainda são muito altos no Brasil de forma geral. No Estado de São Paulo são 52 mil ligações pro 190 por dia para despachar viaturas. São mais de 30 milhões de ligações por ano. O importante é que criamos essa integração entre as polícias por meio do do das políticas públicas, dos SP's. O exemplo é o SP Mulher. Criamos um curso, uma política pública, e nas ocorrências de violência contra a mulher, é sempre uma policial militar feminina que atende. Por quê? Porque ela, ela sabe dar a vazão necessária para aquela mulher que foi vítima de agressão e ligou o 190. Então ela sabe falar: 'Olha, baixa o aplicativo SP Mulher Segura, entra em contato com a DDM online'. 'No aplicativo, você consegue fazer o boletim de ocorrência. Se a senhora não puder ir até o DP tem uma parceria com a 99 que te leva gratuitamente.' Aciona, inclusive, a Defensoria Pública, caso a a pessoa precise de uma advogada. Enfim, eu acho que isso em certa medida até já é feito, não, talvez, na proporção ideal, mas essa orientação já é feita pelas pelos atendentes do 190. Mas não descarto a possibilidade de no futuro a gente ter um treinamento para todos os atendentes o 190 Copom para essa para ter essa orientação mais qualificada, né? Para essa vazão mais direcionada para os órgãos de combate a crimes cibernéticos da Polícia Civil. Exatamente no modelo da cabine da política para mulher. Veja, estou criando obrigações para mim mesmo...
Por exemplo?
Agora, em outro despacho recente que eu tive com o governador Tarcísio foi sobre o núcleo de observação e análise digital aqui da doutora Lisandréa Salvariego, o NOAD. O Núcleo de Observação e Análise Digital foi criado por meio da de uma resolução SSP 67 de novembro do ano passado. Nós sentimos a necessidade de ter uma resposta do Estado para crimes que acontecem no ambiente virtual, especificamente nessas redes sociais, como o Discord e outras que os gamers utilizam. A doutora Lisandréa era uma delegada de polícia que trabalhava assessorando diretamente o delegado-geral e por iniciativa própria começou a fazer um trabalho. Nós trouxemos aqui para a secretaria, criamos um núcleo, já aumentamos o efetivo desse núcleo, que funciona 24 horas por dia. Nós temos cerca de 720 alvos que já foram monitorados nesse ambiente cibernético e estamos falando de utilização de software de inteligência, de policiais civis infiltrados na deep web, na dark web e crimes aterrorizantes que acontecem numa escala muito maior e a resposta do Estado sempre foi: "Os pais são os responsáveis, eles tem que saber o que os seus filhos estão fazendo no ambiente virtual". Aí vimos a necessidade de o Estado dar uma resposta para frear esse ciclo da violência. São verdadeiras organizações criminosas, porque o objetivo final deles é lucro com os vídeos de tortura, de automutilação, de estupro virtual que são realizados. Atuamos no caso do Felca e a operação foi bem sucedida. E, no ato da prisão, estavam manipulando sites governamentais, mas essa é uma grande iniciativa que no futuro é um núcleo aqui da Secretaria, mas que Conversei com o governador, mediante decreto dele, precisa ter o decreto, para criar a primeira delegacia no NOAD. Assim como a Rota foi pioneira na década de 70. E continua sendo referência em patrulhamento ostensivo, o NOAD tem tudo para ser essa grande referência de núcleo de inteligência em patrulhamento na internet. Nosso objetivo é criar a primeira delegacia de núcleo, é, primeira delegacia de observação e análise digital do país.
O senhor acha que o senhor consegue ter o departamento de crime cibernético até até março do ano que vem?
Pretendo porque eu dependo da formação. Para formar, eu preciso dessa turma de 552 delegados que vão começar agora na Acadepol e esses 1,4 mil investigadores, escrivães que estão em curso na Acadepol e com os peritos, que são um total de 3,5 mil policiais. Eu dependo dessa dessa turma formada para a gente propor ao governador, tanto a delegacia, a primeira delegacia de observação e análise digital, quanto o departamento de crimes cibernéticos. E junto com o das mulheres. A DDM deixa de ser uma um órgão especial ali de assessoramento, uma coordenadoria, uma divisão e passa também a ser um departamento com vaga no Conselho da Polícia Civil. Acho que conseguiremos. Eu falei do do SP Mulher, mas não do SP Mobile, que foi uma grande sacada. Foi a primeira vez que nós utilizamos IA para fazer leitura de histórico do boletim de ocorrência da Polícia Civil. Quando nós fizemos isso, sabe aquela vítima que tem o celular roubado ou furtado, mas que ela ainda tem a localização? Ela fica revoltada e diz: 'Mas eu sei onde está a localização. Eu sei. Eu A polícia não faz nada'. Quando é um ambiente residencial, ele é inviolável, protegido pela Constituição, a gente tem que solicitar o mandado de busca ao Judiciário para conseguir recuperar o celular. Só que no cruzamento de dados que nós fizemos, quando essas informações do alerta da vítima aparecia em locais públicos, que eram pontos comerciais, muitos eram revendas de aparelhos celulares. Fizemos a Operação Big Mobile e recuperamos mais de 74 mil celulares e devolvemos mais de 27 mil às vítimas. Depois, pegamos IMEIs que constam estavam nesses boletins de roubo e furto e mandamos para as operadoras TIM, Vivo, perguntando: 'Operadora, esse IMEI tá cadastrado em algum CPF?' Se sim, por gentileza, forneça os dados. Quando ela fornece os dados, a polícia manda um SMS: "Senhor Marcelo Godoy, o senhor está usando um aparelho celular, cujo IMEI consta como produto de roubo furto. Por gentileza, vem até a delegacia de polícia no endereço tal horário para devolver ou então para que o senhor possa se explicar sendo sujeito até a responder por um crime de receptação previsto no artigo 180."
E eu devolvo, né...
E aí nós nos surpreendemos nas duas fases que nós fizemos, cerca de 60 a 65% de devoluções dos aparelhos celulares. Estamos atacando toda cadeia logística que envolve o roubo furto de aparelho celular. Os pontos de revenda com a cruzamento de informações onde a polícia pode fazer uma operação e, no segundo ponto, com essas listas que vem das operadoras com a devolução desse aparelhos celulares.
Secretário, o senhor é criticado pela letalidade policial em São Paulo. Está faltando comando e controle na PM? Ou responsabilizar o capitão, o tenente dentro dos limites de que policial não pode roubar nem pode matar? Ou seja, o comando tem que ter responsável por tudo o que acontece na companhia, pelo que ele sabe pelo que ele não sabe?
Eu julgo que não. Nós temos três tipos ali quando acontece o confronto. O policial respondendo a agindo última defesa, os casos em que acontece o erro por parte do policial, e aí pode ser um erro de procedimento ou pode ser um excesso. E tem o caso de abuso de poder. Esse é a gente não pode compactuar de forma alguma. E por que que eu acho que a questão não é falta de comando, não houve falta de comando? Houve uma mudança de paradigma no combate ao crime organizado, em especial as operações de inteligência, aumentaram de forma exponencial no Estado de São Paulo. Se nos anos anteriores à nossa gestão aconteceram 10, 15, 20 operações de inteligência com o Gaeco, nós fechamos 2024 com 164 operações de inteligência.
Mas secretário, não tem morto nessas operações?
Várias tem. É que vocês só dão a atenção várias delas.
Das que eu acompanho do Gaeco, nunca vi nenhuma.
Mas são várias.
Da Cracolândia, Léo do Moinho, por exemplo, não teve, nada, zero. Zero confronto porque você pega o cara de surpresa? A chance de reação dele é muito menor. Né?
Realmente, essas grandes operações, graças a Deus, nós não tivemos nenhum confronto, até porque o escopo da Operação Carbono Oculto é completamente diferente. Agora, uma operação de inteligência, com participação do MP, até da Polícia Federal que houve confronto foi aqui aquele criminoso que tem um apelido um pouco peculiar chamado Cara de Cachorro, que é um indivíduo da sintonia restrita tática do PCC, houve confronto com o primeiro BAEP.
Esses casos de letalidade não estão mais ligados ao chamado crime de varejo, secretário?
Sim, mas é o dia-a-dia do policial. Infelizmente, eu gostaria muito que policial fosse agora na comunidade lá no Morro São Bento e Santos e não fosse recebido por disparo de arma de fogo, mas, infelizmente, atira-se no policial. Esses dois primeiros anos da gestão, realmente, houve esse o aumento dos confrontos entre criminoso e policial e, nesse ano, já estamos com um índice controlado abaixo dos anos anteriores. Se a gente pensar na quantidade de armas que foram retiradas, mais de 35 mil armas, das mãos de criminosos, mais de 517 mil criminosos presos em 2 anos e 9 meses, esse aumento do confronto, ele tá sendo proporcional. O comando atual da PM foi o grande responsável pelas maiores depurações internas ao longo da gestão. Eu dou alguns exemplos, como no caso Vinícius Uhum Gritzbach. Foi a corregedoria da PM que fez um grande trabalho de depuração e prendeu 15 policiais. O policial que comete um erro, é claro, que ele vai responder por isso. Uma coisa é o policial errar tentando acertar. Outra coisa é o policial cometer um abuso de autoridade, aí não permitir não.
Policial não pode roubar e não pode matar, é isso?
Com certeza absoluta.
Secretário, o senhor falou sobre lavagem de dinheiro do crime organizado. Mas o que o estado pode fazer com o dinheiro e os bens apreendidos dos bandidos?
Antes, 100% desses eram para o governo federal, especialmente para o fundo nacional anti-drogas. Aí nós criamos por meio do decreto do governador, o programa Recupera SP. Com o trânsito em julgado, o recurso pode ficar para secretaria. Investimos R$ 30 milhões no laboratório de lavagem de dinheiro da Polícia Civil para identificar essa lavagem de dinheiro. Chegamos a mais de R$ 21 bilhões de 2023 para cá identificados. E assim, dependendo do trânsito em julgado, vai começar a entrar esses recursos. Vai chegar um momento que a secretaria ser autossuficiência. Estamos falando em uma previsão, pé no chão, aí de R$ 1 bilhão por ano. Parte desse dinheiro, 30%, vai para o Ministério Público porque eles são os nossos grandes parceiros históricos no combate ao crime organizado. E isso inclui os Acordos de Não-Persecução Penal (ANPP), cujo dinheiro vem mais rápido. Então a gente ganha muito no varejo.
Dou um exemplo: um ANPP na região de São José dos Campos incorporou R$ 10 milhões que já está sendo executado para construção da nova delegacia seccional de Taubaté, aquisição de viaturas para GCM, para polícia militar e drones. É retirar o dinheiro do crime organizado, reverter para as forças policiais. Quer ver uma outra que foi legal? O Tribunal de Justiça condenou a esposa do Marcola. Ela foi condenada por lavagem de dinheiro. Então, R$ 479 mil em dinheiro e uma residência em Alphaville, no valor de R$ 3 milhões, que vai ser leiloada, wesses recursos virão para o fundo. Os R$ 479.000 já estão no no fundo. Era um dinheiro que tinha em conta-corrente. Para nós, não é uma questão do valor, mas é a simbologia do que representa: a esposa do maior líder da facção criminosa. Criamos uma política pública para tirar dinheiro do crime organizado e transformar em investimento para as forças policiais. A gente gente só não imaginava que a esposa do líder já de cara seria uma das contribuintes. Vamos usar o dinheiro da mulher do Marcola na Segurança Púbica. O Recupera SP já pôs R$ 62 milhões para o caixa do fundo da Secretaria de Segurança Pública. Eu converso muito com o doutor Lincoln Gakiya. A gente precisa criar aqui no Brasil a figura do juiz oculto. E uma agência antimáfia como a Itália criou.
Mesmo se o projeto for do governo federal?
Se vier uma proposta do governo federal de criação da agência antimáfia, sou o primeiro a defender publicamente. Mesmo sendo o adversário político, em tese, no atual governo federal, (a agência antimáfia) tem de existir. Não tem como. Para justamente fazer a coordenação com todos os órgãos. Uma analogia do que aconteceu com a autonomia do Banco Central.