Entrevista com Kazuyuki Yamai: os bastidores de Raidou Remastered
E o futuro de Shin Megami Tensei? A ATLUS mira na nova geração sem esquecer das raízes.
Para marcar o retorno de um dos títulos mais únicos do universo Shin Megami Tensei, conversamos com Kazuyuki Yamai, diretor da ATLUS, sobre o processo de remasterização de Devil Summoner: Raidou Kuzunoha vs. The Soulless Army. Com uma ambientação noir no Japão da era Taishō, uma abordagem inusitada para combates em tempo real e um protagonista silencioso, o jogo é considerado um clássico cult dentro da franquia. Yamai nos contou como foi preservar a essência dessa obra-prima enquanto a adaptava para uma nova geração — sem sacrificar o que a tornava tão memorável.
Confira a entrevista:
Game On - O Raidou original é considerado um dos spin-offs mais únicos da franquia Shin Megami Tensei. Qual foi o maior desafio em adaptar o jogo para os padrões modernos sem perder sua identidade original?
Kazuyuki Yamai - Durante o desenvolvimento do jogo original, o Japão enfrentava uma recessão prolongada, com um futuro incerto. Kazuma Kaneko sugeriu que explorássemos o tema da paixão, propondo retratar a era Taishō — também marcada pela incerteza, mas cheia de entusiasmo entre o povo — para inspirar as pessoas modernas. Isso levou à criação da versão original.
Infelizmente, o cenário incerto continua atual. Vivemos em uma era repleta de más notícias e escassez de heróis, e por isso acredito que reviver Raidou é de grande importância. Assim, optamos por não alterar o aspecto narrativo do jogo, com exceção de alguns ajustes menores.
Por outro lado, modificamos bastante o sistema de jogo. A versão original estava distante dos padrões atuais de qualidade. Embora tenhamos preservado o espírito do jogo — como a gestão dos demônios aliados, a investigação e o combate — aprimoramos o sistema de ação, implementamos minimapa, quick save e auto save para melhorar a experiência geral.
O maior desafio foi modernizar o sistema de jogo sem perder a identidade do título Raidou. Especialmente difícil foi o aprimoramento das ações do personagem principal. Analisamos cuidadosamente cada ação para garantir que ela se encaixasse na imagem de Raidou e na tradição dos invocadores Kuzunoha, com mais de 1300 anos de história.
Game On - A ambientação da era Taishō sempre foi marcante e distinta no jogo. Como foi o processo visual para preservar essa atmosfera noir no remaster?
Kazuyuki Yamai - Primeiro, refizemos completamente o modelo do Raidou do zero. Não alteramos o design, mas melhoramos as texturas das roupas e dos equipamentos.
Da mesma forma, melhoramos a qualidade das texturas dos demônios e dos cenários, alcançando um nível de detalhe antes impossível nos consoles da época. Também adicionamos sincronização labial e shaders modernos. Curiosamente, ao incorporar tecnologia atual, também renovamos quase todas as placas e letreiros do cenário, que antes eram borrados e agora aparecem com clareza.
Game On - O sistema de combate em tempo real já era inovador na época. A equipe considerou alterar ou modernizar esse sistema? Por que decidiram manter a estrutura original?
Kazuyuki Yamai - Após o lançamento de Devil Summoner 2: Raidou Kuzunoha vs. King Abaddon, muitos fãs disseram que gostariam de jogar o primeiro Raidou com o sistema de combate do segundo jogo. Essa ideia ganhou bastante apoio.
Por isso, sempre quisemos implementar esse sistema na versão remasterizada — e conseguimos fazer isso agora. Além disso, trouxemos também o sistema de fusão de demônios de King Abaddon.
Mesmo com essas mudanças significativas, nosso objetivo era reviver um jogo que se tornou inacessível, sem transformá-lo em algo completamente diferente. Afinal, ninguém quer revisitar um jogo clássico e descobrir que ele virou outro jogo qualquer.
Game On - Raidou é um protagonista bem diferente dos heróis típicos da série — calado, introspectivo, quase enigmático. O que o torna tão memorável mesmo tantos anos depois?
Kazuyuki Yamai - Raidou normalmente não fala, o que evita aquela decepção que alguns jogadores sentem quando o personagem começa a expressar ideias com as quais você não concorda (risos).
Mesmo sendo silencioso, Raidou tem uma personalidade distinta. Desde o início ele se apresenta como um profissional experiente, herdeiro da linhagem dos Kuzunoha. Sua postura é estoica, lembrando um samurai que serve com lealdade, sem se deixar levar por sentimentos pessoais, focado em sua missão de controlar e invocar demônios.
Essa mistura única talvez explique por que Raidou continua tão marcante e carismático.
Game On - Essa remasterização apresenta o jogo a uma nova geração de jogadores. Que tipo de experiência você espera oferecer para quem nunca jogou um título da ATLUS ou da série SMT?
Kazuyuki Yamai - A experiência de investigar mistérios com a ajuda de demônios é algo raro em outros jogos. Mesmo sendo parte da franquia SMT, a história e o universo são independentes, o que facilita o entendimento para novatos.
Espero sinceramente que essa nova geração de jogadores experimente o jogo e descubra por si mesma o quanto ele tem a oferecer.
Game On - The Mystery of the Soulless Army sempre teve um lugar especial no coração dos fãs da ATLUS. Existem planos de remasterizar a continuação, Raidou Kuzunoha vs. King Abaddon, ou até explorar novas histórias com o personagem?
Kazuyuki Yamai - Não temos planos concretos no momento, mas a equipe de desenvolvimento deseja muito remasterizar King Abaddon. Acreditamos que, se esta versão remasterizada for bem recebida, isso pode abrir caminho para novos projetos com histórias inéditas.
Esperamos que todos aproveitem esta nova versão, compartilhem seu amor pelo jogo nas redes e com seus amigos. Isso nos deixaria imensamente felizes.
Conclusão
A paixão por Raidou Kuzunoha e sua misteriosa jornada pela Tóquio da era Taishō atravessou décadas, e agora retorna em grande estilo com esse remaster caprichado. Com novos visuais, ajustes modernos e todo o charme noir de sempre, The Mystery of the Soulless Army é um convite imperdível tanto para fãs nostálgicos quanto para novatos curiosos. E quem sabe? Se a recepção for calorosa, podemos ter mais histórias de Raidou no futuro. A esperança foi plantada — agora é com os jogadores.
