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Alexandre Gama critica dirigentes: 'Só valorizam o técnico brasileiro quando ele sai do Brasil'

Em entrevista ao LANCE!, técnico diz que comandar um time de fora do país deveria agregar conhecimento e experiência, não ser taxado como 'desatualizado'

19 out 2018 - 07h32
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"Um país onde as pessoas vêm passar as férias e eu sou pago para viver aqui". Assim Alexandre Gama define a Tailândia, que virou casa do brasileiro desde 2014. Com grande prestígio no país, o treinador pode conquistar o seu 11º título no leste asiático neste sábado, quando o Chiangrai United enfrenta o Bangkok Glass FC, pela decisão da Toyota Cup. No dia 27, outra decisão: a final da FA Cup diante do Buriram, que faturou o campeonato nacional nesta temporada. Caso vença um dos torneios, vai garantir um lugar na Liga dos Campeões da Ásia.

Em entrevista ao LANCE!, Alexandre Gama lamenta que os treinadores brasileiros não sejam valorizados pelos feitos fora do país.

- O sonho da grande maioria dos treinadores brasileiros é sair do país, e a Ásia é destino número 1. Na Europa, apesar de ser o sonho de todo mundo, o mercado é um pouco fechado para os brasileiros. O preconceito não existe para você sair, mas quando você volta. Para sair, todo mundo quer. Quando retorna ao Brasil, os dirigentes dizem que você está muito tempo fora do país, que está desatualizado. O que é, para mim, um grande erro - destacou o treinador:

- Fora do país a gente trabalha com técnicos de várias nacionalidades, automaticamente está vendo algo diferente, atuando contra escolas e sistemas diferentes. É melhor do que sair do país para fazer um intercâmbio e ficar assistindo treino e jogos da arquibancada. Isso é valorizado, mas trabalhar fora, não. Os brasileiros deveriam valorizar mais o sucesso de outros brasileiros fora, pois estamos levantando o nome do nosso país.

Gama tem propriedade para falar sobre o futebol tailandês. Em quase cinco anos, vê o crescimento do esporte no país e, em termos de estrutura, diz que alguns clubes não devem nada às equipes brasileiras.

- A diferença é que o Brasil é uma das potências do futebol. Aqui ainda está engatinhando. A Tailândia evoluiu muito desde que eu cheguei em 2014. Mas o Brasil está à frente, apesar de alguns times daqui terem melhor estrutura do que as equipes brasileiras, e isso me surpreendeu. Um país que não tem muita tradição, e os clubes são muito estruturados, com CT, tudo que você imaginar para poder fazer o seu trabalho. Isso me chamou a atenção, com campeonato organizado, com bastante torcida. Aqui quase todos os jogos têm casa cheia. O Brasil tem mais qualidade, revela mais talentos, mas a Tailândia está indo em um bom caminho - declarou.

Na Tailândia, o primeiro clube de Alexandre Gama foi o Buriram, principal equipe do país atualmente e que ficou com o título do campeonato nacional nesta temporada. Para o brasileiro, o time é uma grande referência.

Alexandre Gama é ídolo na Tailândia (Foto: Reprodução/Instagram)

- Quando vi a estrutura do Buriram, pensei: 'vim para o lugar certo, não posso perder essa oportunidade, tenho que me concentrar e fazer tudo certo para não deixar passar isso'. E foi o que aconteceu, fizemos história no Buriram. E ali começou tudo na Tailândia. O que me surpreendeu aqui foi a qualidade dos jogadores, a estrutura dos clubes e principalmente a paixão dos torcedores, o interesse de acompanhar, de seguir. Isso fez voltar a me motivar com o futebol de verdade. Antes estava no Qatar, pouca gente no estádio, não tinha torcida, não havia interesse do público. Aqui não. Os torcedores param você na rua, pedem para tirar foto. É igual no Brasil, mas com muito mais respeito e carinho. Em todos os momentos, quando ganha e quando perde.

Sobre o Qatar, foi um aprendizado para Gama e um lugar que abriu as portas para ser ídolo na Tailândia. Segundo o treinador, a liga nacional não é tão profissional.

- Fiquei uma temporada. Foi bom porque entrei para a história do clube. Em 35 anos, o Al Shahaniya nunca tinha jogado a Primeira Divisão e nós conseguimos colocá-lo na elite. A liga do Qatar é muito conhecida, mas não é tão profissional, não tem público para manter a motivação, a intensidade. Era difícil, mas conseguimos, pois o objetivo era subir o time.

Gama pode ganhar mais dois títulos em 2018 (Foto: Divulgação)

Depois da chegada de Gama à Tailândia, os clubes passaram a contratar mais jogadores brasileiros. No entanto, para o treinador, ele não abriu as portas para os compatriotas.

- Aqui sempre teve jogadores brasileiros. O que se abriu, na minha opinião, foi a possibilidade de trazer jogadores com um nível melhor, que jogaram em clubes melhores. O Diogo ajudou muito a isso, que foi o primeiro grande nome, de time grande, que veio jogar aqui na Tailândia. Depois, os clubes visualizaram que era importante poder trazer um cara de Série A do Brasil, porque ele era diferente, e todos os clubes começaram a fazer isso, investir melhor - explanou o treinador.

Por conta de seu bom trabalho no Buriram, Alexandre Gama foi convidado para ser o técnico da seleção da Tailândia. O brasileiro explica o motivo da recusa.

- Já teve essa especulação logo após eu sair do Buriram. Depois que assumi o Chiangrai, estava aqui há dois meses, teve o convite, mas o dono do meu time falou que não abriria mão do pagamento da multa e de mim, pois tinha acabado de chegar, havia feito o planejamento em cima do que eu pedi. Ele não abriria mão, só se a federação pagasse, e mesmo assim não gostaria que eu fosse. Então, preferimos acreditar no projeto, pelo esforço que ele fez para me trazer e tudo aquilo que pedimos. Não foi possível ir, acredito que ainda vai aparecer o convite se continuarmos a ter bons resultados, fazendo bons trabalhos, vai ser algo que irá acontecer. Seria algo que eu gostaria muito, pelo meu conhecimento do futebol tailandês, dos jogadores, das conquistas.

Gama orienta jogador em partida do Chiangrai (Foto: Divulgação)

Alexandre Gama está em fim de contrato com o Chiangrai e não tem futuro definido para a próxima temporada.

- Estou um pouco surpreso, pois até agora o Chiangrai não veio conversar comigo. Apesar de isso ser uma cultura tailandesa. Vi isso acontecer todos os anos. Exceto no Buriram, por isso é um clube diferente, se planeja antes. A maioria dos times deixa para a última hora, quando está perto de acabar o contrato. Estou tranquilo, pois o trabalho foi muito bem feito em todos esses anos. Espero que apareça alguma coisa muito boa.

Antes de vínculo acabar, Gama terá duas finais pela frente e a chance de colocar o Chiangrai na Liga dos Campeões da Ásia. No total, são dez títulos no futebol tailandês em 12 decisões já disputadas.

- Cinco anos, 12 finais e mais duas vindo aí. Hoje são dez títulos. Ficamos felizes, mas o principal disso tudo é o trabalho, não só meu, mas de toda a minha comissão técnica. Conquistei o respeito e a confiança dos jogadores. Muitos atletas tailandeses que me encontram pedem para eu os contratar, porque querem trabalhar comigo. Trabalhamos bastante, sempre focados, mantendo uma linha de trabalho para chegar ao fim do ano e ganhar um título. Em todos os anos em que estou aqui, conquistei algo.

RECONHECIMENTO DO BOM TRABALHO

Alexandre Gama chegou a ser cotado para a seleção da Tailândia (Foto: Divulgação)
Alexandre Gama chegou a ser cotado para a seleção da Tailândia (Foto: Divulgação)
Foto: Lance!

O treinador conta que é reconhecido por onde passa na Tailândia. Fotos e autógrafos são comuns para Alexandra Gama, que lida com naturalidade e satisfação pelo bom trabalho realizado.

Alexandre Gama é o treinador do Chiangrai (Reprodução/Instagram)

- É uma das coisas que me deixam mais feliz é ser reconhecido pelo seu trabalho, as pessoas gostarem de você, te seguirem, quererem fotos, autógrafos. Não tem preço você ter o seu reconhecimento fora do país. Às vezes passam por você, ficam te olhando, você percebe e elas voltam e falam: 'coach Gama'. Gostam muito de mim e tento retribuir da melhor forma possível, sou sempre acessível, nunca nego nada, pois sei do carinho e trabalhei por isso - afirmou Gama, lembrando de um caso envolvendo policiais:

- Já fui parado em uma blitz. Não havia entendido, pois apresentei todos os documentos que eles pediram. Mesmo assim os policiais fizeram questão que eu saísse do carro. Não falavam inglês, assusta um pouco em um país diferente. Quando cheguei, me levaram para uma sala para me apresentar ao comandante. Quando ele me viu, ficou doido. Queria tirar foto, me abraçou, me deu café, chá - concluiu.

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