Percepção de risco para Enel aumenta após Silveira sinalizar com caducidade, dizem analistas
O risco de a Enel perder a concessão de distribuição de energia em São Paulo aumentou após o governo federal voltar a falar em "caducidade" do contrato, segundo avaliação de analistas, em um sinal de maior indisposição do poder concedente com a empresa italiana após reiterados problemas de fornecimento de energia na maior região metropolitana do país.
A caducidade da concessão precisa ser precedida de um processo administrativo, que prevê uma análise técnica, apuração de falhas e transgressões e espaço para defesa da empresa. A agência reguladora Aneel já está debruçada sobre o tema e pode recomendar ou não a medida, e a palavra final é do governo federal.
"Entendemos que a decisão surge como uma reação ao mais recente apagão de grandes proporções em São Paulo e, considerando as reações das autoridades e da opinião pública aos apagões anteriores da Enel São Paulo, consideramos altamente improvável que a decisão (pela caducidade) seja alterada", disseram os analistas do JPMorgan, em nota a clientes.
Silveira disse que a Enel perdeu condições de seguir operando, inclusive do ponto de vista reputacional, referindo-se ao apagão na região metropolitana de São Paulo na semana passada, quando a passagem de um ciclone extratropical prejudicou o fornecimento de energia para milhões de consumidores atendidos pela distribuidora italiana.
Se concretizada, a caducidade da Enel São Paulo seria a primeira a ser decretada na história do setor de distribuição de energia. No passado, a Aneel chegou a recomendar caducidade para outras distribuidoras, como as do Amazonas e Amapá, mas as antigas donas transferiram o controle dessas empresas para que a medida não precisasse ser posta em prática.
Os analistas do JP Morgan apontam ainda que, caso o processo de caducidade, que deverá ser longo, siga adiante, a Enel ainda teria direito a uma indenização bilionária, mesmo que o governo tente reduzir o valor.
O UBS BB afirmou em relatório que o risco regulatório associado a eventos climáticos extremos aumentou não só para a Enel São Paulo, mas também para as outras concessionárias do país, uma vez que as discussões sobre o tema passaram a se centrar mais percepção da qualidade do fornecimento de energia nessas emergências do que no cumprimento formal dos indicadores.
"E essa mudança é importante porque aumenta a flexibilidade regulatória, mesmo que o caminho legal para uma rescisão antecipada (da concessão) continue complexo", disse o banco.
No caso da Enel São Paulo, os analistas do UBS BB avaliaram que, como a concessão termina em 2028, a opção mais "racional" seria um acordo informal do governo com a empresa para que o contrato atual não seja rompido e a troca da operação na região ocorra depois de um leilão após o término efetivo da concessão.
"Um acordo informal parece uma escolha racional, iniciando os preparativos para um leilão na data de vencimento, mas este processo é claramente marcado por uma coisa: incerteza".
O termo de intimação que pode levar à caducidade do contrato da Enel São Paulo já começou a ser avaliado pela diretoria da Aneel no mês passado, mas foi suspenso por pedido de vista do diretor Gentil Nogueira.
Depois do apagão da semana passada, o diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, chegou a pedir em ofício que Nogueira trouxesse o processo novamente para discussão da diretoria na reunião extraordinária do regulador marcada para esta quinta-feira.
Nogueira respondeu, porém, que o processo não poderia ser pautado ainda porque faltam "informações relevantes", citando uma avaliação que está sendo conduzida pela área técnica da Aneel sobre a atuação e o desempenho da Enel São Paulo no evento climático extremo da semana passada.
SAÍDA DA ENEL EM GOIÁS
Em 2022, a Enel vendeu sua concessionária de distribuição de energia em Goiás para o grupo Equatorial após fortes críticas de autoridades sobre má prestação dos serviços no Estado.
Mas diferentemente do caso de São Paulo, em Goiás a Enel possuía um contrato de distribuição mais recente e com cláusulas concretas para disparar a possibilidade de caducidade. Como estava comprovadamente descumprindo indicadores de qualidade, conforme apuração da Aneel, havia maior pressão sobre a empresa para vender a concessão.
No caso da Enel São Paulo, a Enel alega que não há descumprimento dos indicadores de qualidade de fornecimento dos serviços ou de outros parâmetros que pudessem levar à anulação do contrato, e que medidas para tratar de eventos climáticos extremos, como os que vêm ocorrendo recentemente, não estão previstas contratualmente.