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Do campo ao business: filme explora ascensão do sertanejo

Documentário 'Amor Sertanejo' reconta linha do tempo que fez o ritmo se tornar um fenômeno mercadológico

14 mai 2020 - 09h09
(atualizado às 11h00)
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Principal fornecedor de lives em tempos de pandemia, o ritmo sertanejo acaba de ser explorado em forma de filme, com o documentário Amor Sertanejo. Em pouco mais de uma hora, o longa mostra o início do ritmo rural, exibe compositores, radialista e os próprios artistas, chegando ao boom mercadológico que o tornou o principal produto musical do Brasil. O documentário produzido pela Clube Filmes está disponível nas plataformas Now, iTunes, Google Play e Vivo Play.

Em entrevista ao Terra, o diretor Fabrício Bittar explica que a ideia do longa surgiu a partir da curiosidade de entender como o sertanejo se tornou um fenômeno no país. "Ultrapassou barreiras, né? Porque é uma música que começou lá no interior, mas hoje tem um alcance no Brasil inteiro. É realmente a música popular, a que reúne o maior número de pessoas em shows e movimenta a maior quantidade de dinheiro. Então a gente decidiu fazer esse documentário não só para abordar a história do sertanejo, mas muito mais para entender quais foram as características e os mecanismos que ajudaram o ritmo a chegar nesse patamar", conta. 

Foram quase três anos entre a concepção da ideia, pesquisa, criação do roteiro e as primeiras rodadas de gravação. Isso sem contar no obstáculo que foi conciliar as gravações com a agenda de artistas como Chitãozinho & Xororó, Fernando & Sorocaba, João Bosco & Vinícius, Luan Santana, Michel Teló, Maiara & Maraísa, Naiara Azevedo e Matheus & Kauan. Além de personagens marcantes, o documentário explora espaços simbólicos para o estilo como a Festa do Peão de Barretos, realizada em São Paulo desde 1956, passando por gravadoras de Goiânia e um grande festival em Belo Horizonte. 

Chitãozinho e Xororó, representantes da música sertaneja raiz, em cena do documentário 'Amor Sertanejo'
Chitãozinho e Xororó, representantes da música sertaneja raiz, em cena do documentário 'Amor Sertanejo'
Foto: Amor Sertanejo / Reprodução

Mercado

O interesse do empresariado em investir em artistas que davam retorno imediato com músicas de sucesso é tratado como uma faca de dois gumes pelo filme, que não fecha um diagnóstico sobre o mercado. Sem demonizar ou santificar, mostra que se por um lado o investimento massivo alavanca a carreira de cantores e transforma-os em astros, por outro, exclui talentos que sequer têm entrada em rádios, programas de televisão e festivais importantes para a divulgação do estilo. Tudo isso, na visão do diretor do longa, ajuda a segregar o ritmo dos críticos e formadores de opinião, como se o estilo fosse menor se comparado a outros ritmos brasileiros.

"Às vezes há uma divisão entre o artístico e o comercial e há muito um preconceito em cima do que é comercial: aquilo que fala com o público, o crítico torce o nariz. Mas acredito que falar com o público é uma coisa muito difícil. Precisa de investimento, óbvio, mas também de talento, de qualidade. Então, qualquer tipo de manifestação artística que fala diretamente com as pessoas, me interessa muito. E o sertanejo é isso", avalia o cineasta. 

A estrutura desse mesmo mercado do show business cria obstáculos para os cantores em início de carreira, mostrados no filme como peças importantes para aquecer a paixão pelo estilo e renovar o ritmo. Além deles, há também a linha produtiva do sertanejo, como quem faz a montagem dos super shows ou compõe os hits. "A gente queria dar voz a todos os representantes do estilo no documentário. Por isso que há produtores, uma dupla que no início de carreira, as estrelas de todas as épocas.Tentamos não só contar a história do sertanejo pelos famosos, mas ouvir todos os lados, todas as pessoas que fazem parte dessa indústria. Eu gosto muito de uma parte em que a gente mostra uma dupla nova, que ainda não fez sucesso. A gente fala do camarim, que um dia eles vão ter comida japonesa e tudo", detalha Fabrício.

Parcerias e feminejo

A lealdade entre representantes do estilo é algo que parece uma espécie de mandamento entre os sertanejos. Seja para dividirem hits com outros artistas, ceder palco para parcerias e apadrinhar quem é mais novo na carreira. "Eles se ajudam muito e isso é uma característica que ajuda o sertanejo a chegar onde chegou. O que eu percebi é que os artistas são realmente muito preparados e muito preocupados em divulgar o ritmo. Mesmo com a agenda muito cheia, eles atendiam a gente com muita dedicação, os fãs no camarim... Isso mostra o entendimento de que a divulgação faz parte do negócio", justifica Bittar. 

Se a lealdade está presente no ritmo, entre mulheres ela ganha força de gênero com a chamada sororidade -- irmandade entre mulheres. Elas, inclusive, são responsáveis por representar as fãs do estilo, que antes iam aos shows apenas para assistir os ídolos homens, mas que agora podem ouvir falar sobre dores e amores que elas mesmas vivenciam. 

Ainda que as mulheres ganhem um bloco do documentário com destaque para elas, as artistas do sertanejo raiz são completamente esquecidas. "Eu também sinto falta de ter falado um pouco mais com as mulheres. Até pelo boom que está agora, a gente teve um pouco mais de dificuldade na agenda delas", explica o diretor. 

Maiara e Maraisa, dupla representante do chamado 'feminejo'
Maiara e Maraisa, dupla representante do chamado 'feminejo'
Foto: Amor Sertanejo / Reprodução

Inspiração

Ainda que forte, a história do surgimento do ritmo é apenas pincelada no documentário. O fenômeno verdadeiramente explorado é a ascensão do estilo musical no show business, principalmente no início dos anos 2000. À época, o estilo musical competia em termos de audiência nos programas de TV e de público em shows com o axé music, produto cultural baiano que chegou a ser fonte de inspiração para o Amor Sertanejo, através do documentário Axé - Canto do Povo de Um Lugar (2017). "A gente achou o documentário muito interessante e pensou que seria um formato legal para se ter como registro histórico. Em comparação aos ritmos, o que eu acho é que o sertanejo consegue se adaptar muito bem sem perder as características do sertanejo", explica, ao comparar a força dos estilos musicais. 

"A Claudia Leitte, a Ivete Sangalo, começaram a virar muito mais MPB e música romântica do que exatamente o axé. Porque o axé tinha uma coisa muito de alegria, de escutar na festa do que exatamente no teu carro. O sertanejo consegue ter música tanto para você curtir numa balada quanto para ouvir no carro e você chama de sertanejo. Você tem a sofrência e chama de sertanejo. Mistura com música eletrônica, mas é sertanejo. Mistura com funk e vira funknejo. Eu acho que o axé tinha uma coisa de ser tanto para o trio, para a alegria, que quando ele começou a ganhar esse espaço mais romântico perdeu a força de ser chamado de axé e passou a ser chamado de MPB. Eu acho que nesse sentido perdeu um pouco a força", compara. 

Michel Teló é um dos convidados do documentário 'Amor Sertanejo', lançado no fim de abril
Michel Teló é um dos convidados do documentário 'Amor Sertanejo', lançado no fim de abril
Foto: Amor Sertanejo / Reprodução
Fonte: Redação Terra
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