Diretor conta bastidores do filme sobre André Matos
Anderson Bellini conversou com Homework na véspera de lançar segunda das quatro partes do doc ‘André Matos - O Maestro do Rock’.
Por ser amigo de infância do André, seguramente não sou a melhor pessoa para comentar sobre o documentário “André Matos - O Maestro do Rock”. Principalmente desta primeira das quatro partes que compõem/comporão o doc, pois é justamente o período em que tivemos mais convívio - até a saída do Viper.
Dito isso, deixo o diretor, Anderson Bellini, falar sobre. A segunda parte está prometida para março próximo. Aí sim terei maior distância crítica para comentar.
Homework - Quando e por que você decidiu fazer o documentário?
Anderson Bellini -
Eu trabalho com a área audiovisual desde 2005 e como todos que trabalham nessa área, queremos um dia poder fazer um filme só nosso. Eu pensei em fazer um documentário sobre uma banda brasileira e a banda que mais se encaixava com minha ideia era o Angra. Eu acompanhei toda a história da banda como fã e admirador do trabalho do André. Eu viajava para ver shows por todo Estado de São Paulo. Acho que vi uns 50 shows do Angra com a formação com o André no vocal. Eu dominava o assunto o suficiente para roteirizar essa história, que vivi e acompanhei como um grande fã. Em 2018 eu já tinha experiência o bastante para conseguir desenvolver o projeto do documentário. Eu já tinha trabalhado em alguns grandes veículos de imprensa em SP como UOL, Estado de São Paulo e Diário de São Paulo e estava muto acostumado a fazer matérias investigativas e contar histórias em forma de vídeo. Foi então que comecei a colocar no papel o projeto e comecei a filmar em fevereiro de 2019, justamente com o Andre Matos, que foi o primeiro entrevistado. A princípio o filme seria sobre o Angra, mas devido a problemas burocráticos com ex-membros da banda decidi mudar o foco e falar sobre a vida do André. A entrevista com ele durou mais de cinco horas e pela quantidade de informações que apurei na conversa foi fácil decidir mudar o foco do filme. Isso me permitiria falar não só do Angra, mas do Viper, do Shaman, da carreira solo, dos projetos paralelos e também da sua tão desconhecida vida pessoal. Poucos dias depois que tomamos essa decisão o André faleceu.
Por que tão longo, dividido em partes, já que mesmo intensa a vida do André foi curta?
Terminamos as gravações do filme no começo de 2021, então começamos a montagem do documentário. Quando decidi fazer um documentário, lá em 2018, eu queria fazer algo complexo, 100% fiel e detalhista. Que aquele fã conhecedor da vida dele, ficasse espantado em saber coisas que não sabia. Não queria fazer um filme superficial. Queria algo BEM cheio de detalhes, por isso temos mais de 100 entrevistados nesse filme. Falamos com todos os músicos que tocaram com ele, empresários, produtores, amigos, seguranças, roadies, desenhistas e familiares. Conforme fui montando o filme com depoimentos, cenas de bastidores, imagens nunca vistas e materiais inéditos, percebi que o filme estava ficando mais longo que esperávamos. O filme foi montado e editado em ordem cronológica de 1971 até 2019, ano de sua morte. Quando cheguei no ano de 2006 já tínhamos mais de 10 horas de material editado. Realmente tinha ficado muito longo e pensamos em fazer uma série. Depois de conversarmos bastante achamos que ficaria inviável essa série do ponto de vista comercial e de distribuição. Decidimos então dividirmos em quatro filmes. Realmente a vida do André foi curta, mas foi intensa. Colocamos muita coisa da sua vida profissional sim, coisas que muitas vezes entram em conflito com sua vida pessoal. Então não é um filme somente sobre a carreira, de um dos maiores vocalistas de rock do Brasil e do mundo, é a história de 50 anos de um cara que não parava de criar e tinha uma vida extremamente intensa. É o que queremos retratar no documentário.
O que você descobriu ao fazer o doc que mais te surpreendeu?
O que mais me surpreendeu foi como o André lidava com a fama e sua vida familiar. Costumo falar que existiam dois “Andres”. O Andre Matos, o cara do palco, líder de banda que cativava multidões fazendo mil, duas mil, dez mil pessoas cantarem suas músicas, e que sabia lidar muito bem com seus fãs. E tinha o André Coelho, aquele rapaz de rabo de cavalo, com óculos fundo de garrafa, que sempre estava presente nas festas de família, tocando violão com o avô, cantando com a mãe, se vestindo de Papai Noel. Encabeçava as brincadeiras de amigo secreto em família e fazia discursos filosóficos nos eventos familiares. Os dois “Andres” tinham local e data para acontecer. No ambiente do showbusiness o Andre Matos nunca gostava de falar de sua vida pessoal, da família, e do que fazia para desopilar da loucura diária. O André Coelho nunca gostava de falar para sua família dos shows lotados que fazia na França, da loucura no aeroporto no Japão e do quanto ele era querido pela legião de fãs que tinha. Eu brinco que era tipo um super herói, um Clark Kent. Era só ele tirar os óculos, soltar o cabelo, que o Andre Matos surgia para encantar milhares de fãs que estavam esperando seus shows.
Para onde acha que o André caminharia se não tivesse falecido?
Eu acredito que o André HOJE estaria afastado do rock e de turnês pelo mundo. Acredito que ele estaria na Europa trabalhando com música clássica de alguma forma. Regendo uma orquestra, ou fazendo concertos de piano, compondo trilhas para comerciais e filmes. Na entrevista que ele concedeu para o doc, que por sinal foi sua última entrevista, ele me confidencializou, em off, que queria muito fazer uma pós graduação em trilha sonora na Europa e queria trabalhar com música clássica. O que reforça essa minha "teoria" é que ele também ficaria mais perto do filho, o Adrian, que mora na Suécia. Isso era uma das coisas que deixava o André mais triste: estar longe do filho. Acredito que ele estaria tocando um projeto mais para o lado erudito e vivendo ao lado do filho. É o que eu acredito.
Se pudesse resumir o André em uma frase, qual seria?
Dificil essa pergunta, mas vamos lá: O artista e a pessoa mais incrível e completo que eu tive o prazer de conhecer nessa vida.