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A primeira cantora da Dogma é brasileira — agora, ela busca seus direitos na Justiça

Isa Roddy, paranaense radicada na Alemanha, acusa banda de usar sua voz e imagem sem autorização tanto em shows quanto em clipes, após saída em 2022

18 dez 2025 - 14h39
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Uma parcela considerável de fãs brasileiros de rock e heavy metal foi impactada pela Dogma no último mês de maio. A misteriosa banda composta por musicistas vestidas de freiras sensuais estava no país pela segunda vez, mas realizava seu primeiro show realmente grande por aqui, no palco do festival paulistano Bangers Open Air. A repercussão se estendeu às redes sociais, com vídeos gravados pelo público atingindo milhares de visualizações, e foi consolidada nos dias seguintes, quando elas realizaram uma longa turnê nacional abrindo para o cantor Fabio Lione (ex-Angra e Rhapsody of Fire) e datas solo.

A cantora Isa Roddy (Fotos: Jan Mayer e arquivo pessoal)
A cantora Isa Roddy (Fotos: Jan Mayer e arquivo pessoal)
Foto: Rolling Stone Brasil

Aquele era apenas mais um capítulo do sucesso do jovem grupo de hard rock, que nos meses seguintes viajaria pela Europa e marcaria presença em festivais célebres como Bloodstock e Wacken Open Air. Em outubro, porém, a formação implodiu às vésperas de uma turnê pelos Estados Unidos. Três das cinco integrantes afirmaram ter sido expulsas e substituídas por outras mulheres, que usaram as maquiagens e os figurinos das personagens sem a devida comunicação aos fãs. O trio revelou suas identidades e fez denúncias como falta de pagamento adequado, alimentação insuficiente, visto de trabalho irregular (que levou até a uma detenção pela imigração americana), manipulação e misoginia.

Estas três integrantes não foram as únicas a ter problemas com o gerenciamento da Dogma. A brasileira Isa Roddy, que afirma ter sido a primeira vocalista da banda, veio a público pela primeira vez não só para confirmar sua passagem pela formação anos atrás, como, também, expor os problemas que a tiraram do grupo e a levaram a buscar compensação na Justiça.

Embora Isa não cite nomes dos envolvidos, é de conhecimento público que a Dogma tem gestão assumida pela empresa IDL Entertainment, baseada em Los Angeles, mas com atuação destinada ao mercado da América Latina. Um dos três envolvidos com a banda, o músico Alvaro Rabaquino, declarou em publicação recente nas redes sociais que ele, o irmão Federico Rabaquino e o empresário Ian Di Leo foram os criadores do grupo. Alvaro diz que apenas Ian assume a banda atualmente e afirma também estar em uma disputa judicial com o ex-parceiro.

Procuradas, a banda Dogma e a IDL Entertainment não responderam aos pedidos de resposta ligados às declarações apresentadas na sequência deste texto.

Origens e envolvimento com a Dogma

Hoje com 25 anos, Isa é natural do Paraná e sempre esteve envolvida com música. À Rolling Stone Brasil, ela conta:

"Antes de começar a falar, eu já cantava. Ficava brincando de cantora em cima do sofá. Dos meus 11 aos 14 anos, cantei em concursos de escola. Ganhei prêmios até de composição de música religiosa na época — e, veja a ironia, estudava em colégio de freiras. A partir dos 15, até os 19, cantei em pubs e bares, fazendo covers de Black Sabbath, Led Zeppelin e Rush. Era bem ativo em relação a shows."

Ela afirma ter entrado para a Dogma em meados de 2019, aos 19 anos. No início do alegado vínculo, mudou-se para a Alemanha em busca de outros objetivos, inclusive seguir com sua carreira musical. O país europeu nada tem a ver com a banda das freiras mascaradas, diga-se. Ela conta que o convite para se juntar ao projeto chegou porque vídeos de suas performances como cantora chamaram a atenção de pessoas ligadas à produção.

Embora todas as músicas fossem compostas pelos gestores da Dogma, Isa sempre quis trabalhar com material autoral. A banda representava uma oportunidade para entrar de vez no mercado da música, não só para atuar de fato no meio como, também, aprender sobre a parte de negócios.

Como as demais musicistas, Roddy interpretaria um personagem; no seu caso, Lilith, com inspiração bíblica. À época, a paranaense estudava canto na Escola de Música e Belas Artes do Paraná — remotamente, devido à pandemia — e aproveitou para estudar teatro em uma disciplina de extensão. "Não me deram um roteiro, mas deram uma ideia da personagem e a partir disso, comecei a pensar em como poderia ser", diz ela, que garante ter contribuído com ideias e toques pessoais para o desenvolvimento.

Trabalho com a Dogma e divergência contratual

Em seus tempos iniciais na Dogma, Isa Roddy afirma não ter tido divergências com os criadores do projeto. Ela diz que, até a gravação do primeiro videoclipe para a música "Father I Have Sinned", era a única integrante de fato, pois a ideia era contar com modelos/atrizes para a filmagem. Na época dessas sessões, porém, descobriu que outras três musicistas estariam vinculadas — a guitarrista brasileira Bruna Terroni, com quem mantém amizade, além de uma argentina e uma colombiana cujas identidades não foram reveladas.

https://www.youtube.com/watch?v=ya69LUa1E_w&list=RDya69LUa1E_w&start_radio=1&pp=ygUaZG9nbWEgZmF0aGVyIGkgaGF2ZSBzaW5uZWSgBwE%3D

Isa declara ter gravado uma demo com 13 músicas; destas, cinco seriam aproveitadas para um EP que acabou não sendo lançado oficialmente, mas pode ser encontrado facilmente, com os vocais da brasileira, em fontes alternativas online.

O centro da divergência entre Roddy e a gestão da Dogma teria ocorrido na forma de compensação por seus trabalhos. A cantora diz que lhe ofereceram apenas um contrato para apresentações ao vivo — que sequer estavam ocorrendo, pois ainda era época de pandemia. Ou seja: as contribuições para as músicas em estúdio e videoclipes, de acordo com ela, não seriam pagas.

Um contrato temporário teria sido assinado para viabilizar a gravação do clipe de "Father I Have Sinned", como justificativa para sua viagem a trabalho até o local das filmagens. Isa alega que precisou se deslocar novamente para registrar outros dois vídeos, para as músicas "My First Peak" e "Forbidden Zone"; e que quando retornou de vez para a Alemanha, analisou o contrato em busca de um acordo definitivo. Surgiu aí a desconfiança.

"Eu já estava tendo uma desconfiança de que aquele contrato não estava correto pelo trabalho que eu estava fazendo, pois era voltado para apresentações ao vivo — que não chegaram a acontecer devido à pandemia — e o que eu estava fazendo na época ia muito além. Não me servia. [...] Perguntei se eu teria ganho em relação ao trabalho de estúdio, de gravar o EP e os vídeos. Foi dito que não: era um contrato de músico de sessão, mas temporário. E o definitivo nunca veio."

https://www.youtube.com/watch?v=X4xaDmrjXhM&list=RDX4xaDmrjXhM&start_radio=1&pp=ygUTZG9nbWEgbXkgZmlyc3QgcGVha6AHAQ%3D%3D

Saída e tentativas frustradas de negociação

Quando Isa Roddy decidiu sair da Dogma, o empresariamento tentou reverter ao, segundo ela, negociar os materiais que estariam gravados e buscar dar uma previsão de quando conseguiriam estabelecer datas de shows em definitivo. "[Não ter as datas de shows definidas] Complicava para dar sequência à minha vida, ainda mais por eu ter vindo para a Alemanha no meio da entrada para essa banda. Afinal, vim para a Alemanha também para trabalhar com música", explica a cantora.

As tratativas não seguiram, pois, nas palavras de Isa, "eu deveria aceitar que não receberia nada por trabalhos feitos por mim". Segundo ela, o ideal teria sido existir um contrato diferente para trabalhos que não eram de músico de sessão, mas "não foi o que aconteceu".

https://www.youtube.com/watch?v=KfmyfcXKgAo&list=RDKfmyfcXKgAo&start_radio=1&pp=ygUUZG9nbWEgZm9yYmlkZGVuIHpvbmWgBwE%3D

Com o tempo, o anonimato das integrantes também se mostrou um problema para Roddy. A cantora queria não apenas contribuir com as composições, como, também, mostrar seu rosto e revelar seu nome.

Ela sabia, desde o início, que toda a banda e os profissionais de bastidores teriam suas identidades ocultas, mas foi dito que "chegaria um tempo em que, sim, tudo seria revelado". "Quando? Não saberíamos. Poderia ser em outro álbum, poderia vir à tona, mas não foi dito de forma concreta quando isso aconteceria", ela explica, evidenciando na sequência outra fragilidade do projeto: não ficava clara a forma de creditar pelas contribuições se o projeto era marcado pelo anonimato. São dilemas que inexistem em bandas como Sleep Token, que têm integrantes anônimos, mas, até onde se sabe, operam de modo mais organizado.

Uso de materiais de Isa Roddy sem autorização

De acordo com Isa Roddy, o rompimento definitivo com a Dogma se deu em meados de 2022. O videoclipe de "Father I Have Sinned" foi lançado em março daquele ano, enquanto ela ainda estava na banda. Os outros dois, para "My First Peak" e "Forbidden Zone", saíram respectivamente em junho e agosto de 2023. Em ambos, a banda teria utilizado a imagem da brasileira — segundo ela, sem sua autorização — e trazido a voz de outra mulher por cima.

Ela comenta:

"Amigos e familiares, que sabiam que era eu nos vídeos, assistiram e perguntaram: 'Isa, é a sua imagem, mas não a sua voz, o que aconteceu?'. Para mim, foi um choque. Quando tentaram renegociar, falaram que iriam utilizar os vídeos. Não houve acordo e existiu uma tentativa jurídica de resolver, mas não ocorreu. Não vejo sentido em vender uma imagem, depois de essa artista ter saído há pelo menos um ano, com outra voz por cima. A performance visual era minha, todo o estudo de artista que estava ali era mérito meu."

Além disso, Isa afirma que suas gravações de backing vocals, gritos (growls e screams), corais e outras vocalizações características teriam sido usadas sem autorização pela Dogma, não apenas em shows, por meio de material pré-gravado, como também no único álbum de estúdio lançado pelo projeto, em 2023. A cantora aponta as seguintes canções e utilizações:

"Father I Have Sinned": growls e backing vocals

"My First Peak": backing vocals e vocalizações características

"Forbidden Zone": backing vocals

"The Dark Messiah": backing vocals, screams e coral no final

"Free Yourself": screams

"Pleasure From Pain": screams

https://www.youtube.com/watch?v=ouO43qtR1yU

Isa já não acompanhava as atividades do grupo nesse período. No entanto, recebia relatos de fãs que conheciam a história mais a fundo e percebiam a reprodução desses materiais.

"Pessoas começaram a notar, durante os shows, a utilização do growl de 'Father I Have Sinned', pois minha voz original está no clipe. Até filmavam e mandavam: 'Isa, esse vocal claramente é um sample da sua voz'. Ou o coral final de 'The Dark Messiah'. Aí vi a irregularidade do uso desse material ao vivo. E eu não tinha conhecimento de que esses vocais também estavam no álbum lançado pela banda."

https://youtu.be/QMvidnZ4oGE?si=s9y2sdqOqk60ReI1&t=190

A artista relata que até mesmo uma máscara da personagem Lilith, vendida como item de merchandise nas turnês, teria sido feita com o molde de seu rosto. Ela explica:

"O molde foi feito durante as gravações dos clipes de 'My First Peak' e 'Forbidden Zone', na segunda viagem. Era uma ideia inicial de talvez usar as máscaras em shows, mas nunca foi falado sobre comercializar essa máscara."

Roddy diz que houve uma nova tentativa de negociação somente após ela iniciar movimentações no âmbito jurídico. Ela recusou as ofertas feitas extrajudicialmente porque, em suas palavras, não era condizente com sua visão e o que acredita ser seu direito.

Controvérsias recentes da Dogma e futuro de Isa Roddy

Perguntada de sua reação ao saber das denúncias de três ex-integrantes — com as quais não chegou a trabalhar em sua passagem pela Dogma —, Isa Roddy admite não ter ficado surpresa. Segundo a cantora, são reflexos de uma "visão profissional que não batia" com a sua. Ela ainda explica que suas divergências ocorreram com "as três pessoas ligadas à produção", por isso não iria pontuar nomes. Todas as críticas abordam o trio, não uma pessoa individualmente.

Roddy pontua, ainda, enxergar uma confusão entre o que a Dogma promete oferecer ao público e o que é, de fato, apresentado. Ela se refere, em especial, à abordagem machista do conceito artístico, que visa refletir sobre a liberdade sexual de mulheres, mas é todo pensado por homens.

"Quando falo que as ideias não eram mais compatíveis, a filosofia da banda também entra. Quando um projeto orgânico é pensado e feito exclusivamente por mulheres para falar da liberdade sexual, por exemplo, vejo muito mais sentido do que um projeto com homens falando sobre o desejo sexual de uma mulher ou a liberdade sexual. Qual é a mensagem musical? Qual é a crítica que você faz? Quando quero passar uma mensagem por meio da minha música e criar uma conexão real, precisa existir verdade."

Mesmo que só agora tenha se revelado ex-integrante da Dogma, Isa acumulou uma série de fãs ligados à banda ao longo dos últimos anos. Seu nome é vinculado ao grupo entre fóruns dedicados há tempos. De início, segundo ela, existiu até mesmo uma confusão em relação à vocalista que estava na formação, pois muitos acreditavam se tratar dela, já que sua imagem foi utilizada nos primeiros videoclipes e materiais promo, além da voz presente em "Father I Have Sinned".

Enquanto a questão judicial ainda está em trâmite, Isa dá sequência à sua carreira musical. Em 2024, ela chegou a participar da edição alemã do "The Voice", cantando "Barracuda", do Heart. A presença no programa repercutiu, claro, no país onde reside — a ponto de receber elogios de cantores como Ralf Scheepers (Primal Fear) e Amanda Somerville —, mas a artista conta ter ganhado bastante público no Brasil, pois o vídeo viralizou nas redes entre perfis nacionais.

https://www.youtube.com/watch?v=uJUhdoK59Kk

No momento, Roddy trabalha em composições próprias, que devem ser lançadas em 2026. Algumas dessas canções estão bem encaminhadas e já no processo de criação do instrumental. São músicas diferentes da Dogma, seja pela abordagem mais pessoal ou pelas influências sonoras mais ecléticas: terá o power/symphonic metal como base, mas abraçando outros subgêneros do metal e até elementos da MPB. Também está nos planos a realização de uma turnê pelo Brasil — e, em suas palavras, não apenas nas regiões Sul e Sudeste.

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