Mestre da imagem, Boris Kossoy recebe homenagem da USP e lembra trajetória
Aos 84 anos, fotógrafo, pesquisador e historiador é homenageado pela ECA-USP por sua contribuição acadêmica e artística que redefiniu a história e a teoria da imagem no País
A trajetória de um dos mais influentes pensadores da imagem no Brasil será reconhecida com a mais alta honraria acadêmica. O fotógrafo, pesquisador e historiador Boris Kossoy, de 84 anos, receberá o título de Professor Emérito da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP) nesta quinta-feira, 25.
A influência da arquitetura
Paulistano, Boris formou-se em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie em 1965. "Eu gostava de desenho e desenhava desde garoto. O caminho natural foi a arquitetura", recorda. Além disso, a década de 1960 foi marcada pela construção de Brasília. "O feito de Lúcio Costa e Oscar Niemeyer causou grande impacto, me impressionou muito e acabou influenciando a minha escolha", disse ao Estadão.
Atuou por cerca de seis anos como arquiteto, até decidir-se pela fotografia. Durante muitos anos, manteve o seu estúdio, o Ampliart, na Rua Marquês de Itu, no centro de São Paulo - endereço que, nos anos 1970, reunia diversos escritórios de arquitetura. A formação na área e a convivência com outros arquitetos marcaram seu olhar fotográfico: "A arquitetura sempre esteve presente. A questão do espaço e da sua interpretação foi fundamental para a composição da minha estética também", afirma.
Também nos anos 1970, Boris foi um dos líderes do Movimento Photogaleria, ao lado de George Racz. O grupo, que levantava a bandeira da inserção no mercado de trabalho e dos direitos autorais, reunia fotógrafos que atuavam no jornalismo, na publicidade e em outras áreas, incluindo fotógrafos amadores. Entre 1973 e 1974, o coletivo chegou a fazer exposições em São Paulo e no Rio de Janeiro. "O projeto estava à frente do seu tempo e fotógrafos de renome participaram da iniciativa", lembra Kossoy.
Viagem pelo fantástico
Ao longo da carreira, Kossoy subverteu convenções estéticas. Em 1971, lançou Viagem pelo Fantástico, um dos primeiros fotolivros publicados na América Latina. A obra o tornou precursor do realismo fantástico na fotografia sul-americana, ao criar narrativas visuais que exploravam o absurdo e a fantasia, questionando a noção de fotografia como mero reflexo da realidade.
"O meu trabalho com a fotografia sempre foi na linha do realismo fantástico, que é uma vertente literária, mas também é cinematográfica e da fotografia, embora sejam raros os fotógrafos que a seguem", comenta o professor.
Em 2021, 50 anos depois do seu lançamento, a obra ganhou edição comemorativa pela Editora Ipsis. Novamente esgotado, hoje não está disponível nas grandes livrarias do País.
O pesquisador que mudou os livros de História
Em paralelo à produção artística, Kossoy construiu uma carreira acadêmica pioneira. Foi sua pesquisa que resgatou do esquecimento o inventor franco-brasileiro Hercule Florence, comprovando que ele realizou experimentos de "impressão pela luz" em 1833, em Campinas, no interior de São Paulo. Na França, Joseph Nicéphore Niépce havia obtido o primeiro registro fotográfico apenas sete anos antes, em 1826.
Essa descoberta, detalhada no livro Hercule Florence, a Descoberta Isolada da Fotografia no Brasil (1977), reposicionou a historiografia da fotografia e deu reconhecimento mundial ao inventor.
"Houve uma imensa polêmica até que isso ficasse devidamente comprovado. A fotografia aqui no Brasil aconteceu na mesma época da invenção europeia. São métodos diferentes, produtos químicos e óticos diferentes, mas é inegável que Hercules Florence também descobriu a fotografia aqui no Brasil", defende.
Hercule Florence, a Descoberta Isolada da Fotografia no Brasil foi reeditado pela EdUsp em 2021 e teve edições na Espanha, México, Alemanha, França e Estados Unidos. Ao contrário de Viagem pelo Fantástico, é facilmente encontrado nas livrarias brasileiras.
O impacto de Kossoy na academia se estende por uma vasta bibliografia, com obras que se tornaram referência obrigatória, como Fotografia e História (1989) e Realidades e Ficções na Trama Fotográfica (1999).
Boris Kossoy colaborou com o 'Estadão'
O fotógrafo também tem uma ligação antiga com o Estadão. Atuou como colaborador, escrevendo sobre fotografia entre os anos de 1972 e 1975 no Suplemento Literário, que marcou época no jornalismo cultural brasileiro. "Quando me convidaram para ser colaborador de O Estado de S. Paulo foi extraordinário", lembra.
Além disso, colaborou com o Suplemento do Centenário, com uma longa reportagem intitulada O Panorama da Fotografia no Brasil desde 1832, publicada ao longo de seis páginas na edição de 18 de outubro de 1975.
Por coincidência, na sessão solene de entrega do título de Professor Emérito, quem fará a saudação a Kossoy será a professora Cremilda Medina, uma das editoras do Suplemento Literário e amiga de Kossoy desde aquela época. "Ela é uma amiga querida. Fizemos uma grande amizade que dura até hoje", lembra.
A homenagem acontece a partir das 15h, no Auditório Freitas Nobre, do Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE - Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, Cidade Universitária, São Paulo-SP).