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Felipe Hintze faz sucesso na TV após superar gordofobia

Ator ouviu de uma professora que não conseguiria bons papéis sendo gordo; logo depois foi contratado pela Globo

29 mar 2022 - 13h53
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Hintze não se curva ao padrão de magreza
Hintze não se curva ao padrão de magreza
Foto: Camila Bevilacqua/Divulgação

Fazer da arte uma arma política contra todos os tipos de preconceito é a estratégia de Felipe Hintze. O ator, visto como Delegado Torres em ‘Quanto Mais Vida, Melhor’, na Globo, integra o elenco de um espetáculo que fala a respeito de homofobia e intolerância em geral.

‘Névoa - From White Plains’, de Michael Perlman, com tradução de Jorge Minicelli e direção de Lavínia Pannunzio, encerra temporada no Teatro Vivo, em São Paulo, nesta quarta-feira (30).

Na entrevista ao Terra, Hintze comenta a essência da peça, os desafios na vida e na arte de ser um homem gordo, a sobrevivência financeira na carreira e seu posicionamento político.

O ator na novela e no recente espetáculo
O ator na novela e no recente espetáculo
Foto: Divulgação

Qual a importância de você, um homem heterossexual, ter feito parte do elenco de um espetáculo que discutiu aspectos da vida dos gays e a homofobia?

Eu acredito que estar em cena com um texto que discute homofobia e mostra os aspectos da vida da comunidade LGBTQIAP+ é essencial nos dias de hoje. Por isso, escolhi fazer esse texto nessa minha retomada ao teatro, pós-pandemia. Estou recebendo tantos depoimentos de pessoas que passaram por isso, de pais que viveram isso com seus filhos, pessoas que são da comunidade e outras, de fora, mas que são afetadas diariamente pelo que a peça aborda. No final do espetáculo, muita gente vem me agradecer por promovermos uma reflexão sobre esses assuntos. Ainda somos o País onde mais se mata gays no mundo. Os casos de suicídio entre pessoas da comunidade são preocupantes. Em relação às definições de sexualidade, para mim, é um assunto obsoleto. Eu realmente acredito na fluidez da sexualidade, e não como algo estático ou imutável. Como a arte é um lugar livre e democrático, entendo que não importa a sexualidade do ator, seja qual for o assunto discutido em cena. O ‘lugar de fala’ não é só sobre falas, é de escuta também. Nosso trabalho teve uma pesquisa profunda sobre pessoas que perderam amigos por suicídio. O nosso papel social é fazer isso acontecer no palco para que ocorra cada vez menos por aí.

Presenciou algum episódio de homofobia?

Já, na plateia da nossa própria peça. Um casal fez vários comentários inadequados durante a apresentação. No final, uma outra pessoa do público abordou os dois. Disse que foi deselegante atrapalharem o espetáculo. Então o casal levantou e disse que tinha ido na peça errada porque não concordava com as mensagens do texto, como a defesa do casamento gay. Tem muita gente homofóbica no mundo. Eles estão mais perto do que imaginamos. Na peça, damos exemplos de homofobia escondida em argumentos. Os homofóbicos não são só os indivíduos que batem ou matam, são também os que fazem uma piada, aqueles que constrangem, os que fazem perguntas desnecessárias, que humilham, ridicularizam, expõem. Nós vivemos em uma sociedade homofóbica, é nosso dever desconstruir isso.

“A vida na arte é renúncia ao comodismo”, diz Hintze
“A vida na arte é renúncia ao comodismo”, diz Hintze
Foto: Thiago De Lucena/Divulgação

O que acha do homem que se define como ‘hétero top’ e da cobrança social para que a masculinidade/virilidade seja reforçada a todo momento?

Acho ridículo. É tão legal quando vemos alguém que reconhece seus privilégios e usa isso para desconstruir, conhecer a realidade das minorias com o propósito de lutar contra os preconceitos. O contrário é só mais desserviço.

O homem gordo é bastante fetichizado, especialmente no meio gay. Já foi alvo desse tipo de objetificação do corpo? 

Recebo muitas dessas mensagens. Sou bastante assediado tanto por mulheres quanto por homens. Não vejo problema nisso quando se tem respeito, é claro. Geralmente, o corpo gordo ou é totalmente excluído e ignorado ou objetificado e extremamente sexualizado.

O que achou da militância de Tiago Abravanel contra a gordofobia no ‘BBB22’?

Corpos gordos ocupando lugares de extremo alcance midiático se tornam um ato de resistência. A participação do Tiago em um programa desses é essencial. A representatividade é tão necessária que só de ele estar lá já ajuda e inspira muita gente. Pessoas gordas são excluídas o tempo todo. Quando se sentiu deixado de lado, o Tiago refletiu a nossa sociedade. Você, gordo, é excluído quando não tem roupas do seu tamanho, quando não cabe no banco de um transporte público, quando um equipamento médico não suporta seu peso. Ficar de fora de uma prova porque ninguém quis fazer dupla com você, como aconteceu com o Tiago no ‘BBB’, é uma situação de exclusão que se origina do bullying gordofóbico escolar.

Recentemente, a atriz Manuela do Monte revelou ter sido incentivada a fazer dieta radical quando protagonizou ‘Malhação’. Você recebeu esse tipo de sugestão ou imposição?

Quando eu estudava teatro, uma professora me disse que os autores não escrevem personagens para atores gordos e que eu deveria emagrecer se quisesse ter uma carreira. Um ano depois, eu estreei na Globo em uma série da Glória Perez dirigida pelo Mauro Mendonça Filho, ‘Dupla Identidade’. Na Globo, sempre fui bem aceito em todos os projetos que fiz. Poucos personagens eram estereotipados. Tive oportunidade de falar sobre gordofobia em alguns trabalhos. Em outros, nem se comentava o fato de eu ser um homem gordo. Vejo um avanço nas escalações de atores. Percebo que alguns produtores de elenco, como o Guilherme Gobbi, apostam na diversidade em seus castings. Obviamente, ainda temos muito a conquistar. As pessoas ‘padrão’ têm mais oportunidades.

Muita gente acha que, por fazer novela na Globo, um ator está famoso, rico e com os boletos pagos. Você ainda enfrenta desafios para manter sua carreira e se sustentar?

A vida na arte é uma renúncia ao comodismo. Você sempre precisa se reinventar, estar atento a novos trabalhos e oportunidades. Amo a vida que escolhi. O prazer que tenho de viver da arte me deixa extremamente realizado. Eu tive que aprender educação financeira. Nessa profissão, há momentos em que você ganha muito dinheiro e, em outros, não ganha tanto. Precisa saber se organizar. Na pandemia, fiquei mais de um ano desempregado, por exemplo. A vida artística não é fácil.

Como avalia sua participação na novela ‘Quanto Mais Vida, Melhor’?

Me diverti muito. Fui feliz fazendo essa novela. Toda a equipe foi muito bem comandada pela extraordinária direção do Allan Fiterman e do Pedro Brenelli. O público gosta. Pessoas me param na rua para dizer que a novela é a alegria delas no momento. A minha dupla com o Pedroca Monteiro se tornou a experiência mais divertida que eu tive dentro da Globo.

Pretende usar seu poder de influência como artista na campanha eleitoral? Está interessado em política?

Eu, como indivíduo e como artista, gosto de me posicionar politicamente. Infelizmente, vivemos um desgoverno. Não vou fazer campanha eleitoral para ninguém, mas vou manifestar minha opinião política. Não vou cometer o mesmo erro da última eleição, que foi acreditar em uma Terceira Via, votando no Ciro Gomes. Dessa vez, será 13 logo no primeiro turno. A única saída que eu vejo para o Brasil é tirar o Bolsonaro do poder.

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