Professor de escola pública em São Paulo, Jeferson Reis Santos venceu o Prêmio Sesc com uma coletânea de contos sobre o bairro de Massaranduba, em Salvador, surpreendendo-se com o reconhecimento e com a descoberta pessoal que marca sua estreia literária.
Jeferson Reis, 31 anos, professor de escola pública na zona oeste de São Paulo, nunca pensou em ser escritor. Mas, após vencer — meio sem querer — o Prêmio Sesc com seu primeiro livro, sobre o bairro periférico de Massaranduba, em Salvador, ele se vê agora obrigado a “atender ao chamado da literatura”.
Não que seja algo torturante — ele, aliás, está gostando da ideia. Já escreve um romance, também sobre os periféricos da capital baiana, porque “escrever é a maneira mais rápida de voltar a Salvador”. O que ainda o intriga é como essa virada literária foi possível em apenas um ano, sem nunca ter feito qualquer tentativa na ficção — nem sequer se interessar por isso.
Abáz, como prefere assinar, fez um curso de redação criativa “para destravar na escrita do doutorado”. Ficou extremamente acanhado em mostrar suas produções, mas foi incentivado e, quando se deu conta, tinha criado contos suficientes para compor um livro. Inscreveu-se no Prêmio Sesc de última hora — e ganhou.
Abáz é professor de escola pública e doutorando na USP
Até vencer o Prêmio Sesc, Abáz seguia os planos que o levaram da periferia de Salvador a Minas Gerais e, depois, a São Paulo: estudar. Fez mestrado e ingressou no doutorado em Educação na Universidade de São Paulo (USP).
Paralelamente, foi aprovado em um concurso para professor de História na rede municipal paulistana. Hoje, na EMEF Júlio Mesquita, leciona para jovens de comunidades vizinhas, como São Remo, Sapé e 1010. Entre as aulas e as pesquisas, viu um curso gratuito na Biblioteca Mário de Andrade, se inscreveu — e deu no que deu.
“Não tinha pensado em escrever, não tinha escrito nada. Meu primeiro texto literário foi em agosto de 2024. Sempre gostei muito de artes, mas escrever, nada”, diz Abáz, que adotou como nome literário o apelido de infância — embora não saiba explicar seu significado.
Massaranduba, a quebrada de Salvador onde Abáz se criou
Surpreendido — ou “sequestrado” — pela literatura, o novo autor reflete sobre a compreensão literária que está construindo. “Não encaro exatamente como ficção. O nome é reivindicar o território do qual fiz parte. Quando criança, achava a coisa mais bonita do mundo morar numa palafita, em cima da água, mas fui percebendo que viver ali era motivo de vergonha”, lembra Abáz.
Isso fez com que, durante a adolescência, ele mentisse dizendo que morava na Ribeira, “mais famosa”. Segundo Abáz, “falar que minha história é no Massaranduba é lidar com essa vergonha da adolescência — a de um garoto pobre, criado pela mãe com a ajuda dos avós, em um barraco sobre as palafitas”.
O prêmio inclui a impressão e distribuição de dois mil exemplares de Massaranduba pela Editora Senac Rio, além da divulgação em um circuito pelas unidades do Sesc. Em dezembro, haverá o lançamento no Rio de Janeiro. Abáz vai levar a mãe, que nunca saiu da Bahia e sempre sonhou em conhecer a capital fluminense.