Opinião: A economia melhorou, mas Lula sabe que isso ainda é pouco

Ao país que viveu 'fila do osso', não basta qualquer melhora econômica

8 dez 2023 - 16h12
Presidente Lula colhe frutos na economia, mas ainda não são suficientes
Presidente Lula colhe frutos na economia, mas ainda não são suficientes
Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República

Em um país que há pouco conviveu com miseráveis se amontoando em filas para comer ossos, a realidade melhorou muito. O cenário econômico está mais positivo do que o mercado projetava no início do ano. Com a eleição de Lula (PT), as expectativas dos investidores e do Fundo Monetário Internacional (FMI) eram de que o PIB (soma de todos os bens e produtos produzidos) deste ano ficaria abaixo de 1%. No entanto, a notícia é que o crescimento do país deve fechar na casa dos 3%, um desempenho bem melhor, como a equipe econômica do governo vinha defendendo.

O desemprego caiu ao menor nível desde fevereiro de 2015, em 7,6%, e pela primeira vez o país passa o número de 100 milhões de pessoas ocupadas. Há melhora no consumo das famílias, algum controle na inflação e os juros estão em queda. Ainda assim, é pouco.

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Lula sabe disso, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também. E principalmente, a população sabe disso. Os dados da pesquisa Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec) divulgados ontem, 7, ajudam a entender um pouco do que o brasileiro pensa sobre o cenário atual.

Mesmo com os indicadores que listei, tem menos gente achando que a economia está “melhor” atualmente do que a seis meses atrás. Em setembro, eram 42%, hoje são 39%. Já os que consideram que a economia está “pior”, aumentou de 29% para 36%. Ambas alterações são para além da margem de erro de 2%. Os que consideram igual foram de 27% para 23%, neste último levantamento.

A percepção das pessoas sobre o futuro também parece pior do que em setembro. A quantidade de entrevistados que imaginam que a situação econômica estará “melhor” daqui a seis meses era de 51%, agora está em 45%. A variação de quem acredita que estará “pior” foi de 27% para 30%.

Os entrevistados, lembremos, respondem sem ficar pesquisando este amontoado de dados ou fazendo projeções econômicas. Falam sob a percepção da vida real, do salário, das contas da casa.

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O resultado do PIB do terceiro trimestre, divulgado nesta semana, parece dialogar com essa percepção futura da população. Segundo os dados do IBGE, a taxa de investimento ficou nos baixos 16,6%. Caiu em 2,5% a "formação bruta de capital fixo" (a ampliação da capacidade produtiva futura por meio de investimentos), pela quarta vez seguida. Isso nos levanta dúvidas sobre de onde virá o impulso para o crescimento em 2024.

No governo há a mesma percepção (e preocupação). Já em outubro, em um café da manhã com jornalistas, Lula disse que “dificilmente” o país atingirá a meta de déficit zero. “Não vou estabelecer uma meta fiscal que me obrigue começar o ano fazendo corte de bilhões nas obras que são prioridades neste país”, afirmou. O petista aposta no bom funcionamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para ser um dos motores do país.

Existe um embate entre os diferentes quadros do governo sobre qual caminho deve ser seguido, se com mais ou menos dinheiro público. Sob esse contexto e risco de ver naufragar as últimas propostas da área econômica, Haddad adiou a ida ao encontro do Mercosul desta semana para fazer reuniões presenciais com lideranças do Congresso. O ministro tenta aprovar as últimas pautas, melhorar a arrecadação do caixa e ter um pouco menos de dor de cabeça em 2024.

A cada dois anos, políticos, marqueteiros, jornalistas e analistas vão às ruas tentar entender o que quer e o que pensa a população naquele momento. Claro, não é só economia, mas trabalho e dinheiro no bolso são determinantes para o eleitor escolher em quem vai votar.

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O PT sabe disso (ou deveria saber) melhor do que ninguém, afinal foi em 2013, quando os brasileiros atingiram a maior renda per capita de sua história, que o governo Dilma Rousseff (PT) começou a tropeçar em manifestações. Trupes pediam melhorias no transporte público, hospitais padrão Fifa (lembram disso?), eram contra a Copa do Mundo e outras coisas que nem sabiam dizer.

Dali em diante, Dilma e o PT venceram uma eleição agressiva, foram vaiados na rua e em estádios, entraram na crise econômica, perderam apoio político e saíram sob um impeachment com cara de golpe. A direita que conhecíamos, e ajudou a chutar o PT, sem perceber, foi embora junto.

Explicar 2013 é algo difícil, um desafio que fervilha na cabeça de pesquisadores Brasil afora. Não vou me arriscar no tema.

O que podemos imaginar com alguma margem de acerto é que em um país polarizado, se a economia não vai bem (ou melhor, não vai bem como a população espera), há uma extrema-direita de braços abertos para receber os votos dos infelizes.

Entre outros fatores, foi em um contexto assim que os radicais tomaram o poder no Brasil e tomarão o poder domingo, 10, na Argentina, quando Javier Milei assumirá a Presidência.

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A pesquisa Ipec mostra que, na percepção dos entrevistados, a melhor atuação do governo do presidente Lula é no “combate à fome, pobreza e miséria” (30%), seguido por Educação (20%) e Saúde (14%). Apesar de todo desafio e esforço político que existe em assumir um país destruído, numa terra de miseráveis, o governo Lula 3 ainda tem feito pouco.

Bom fim de semana!

Este texto foi publicado originalmente na newsletter semanal Peneira Política, assinada por Guilherme Mazieiro. Assine aqui, gratuitamente, e receba os próximos conteúdos.

Fonte: Guilherme Mazieiro Guilherme Mazieiro é repórter e cobre política em Brasília (DF). Já trabalhou nas redações de O Estado de S. Paulo, EPTV/Globo Campinas, UOL e The Intercept Brasil. Formado em jornalismo na Puc-Campinas, com especialização em Gestão Pública e Governo na Unicamp. As opiniões do colunista não representam a visão do Terra. 
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