Entenda o embate entre STF e Câmara sobre ação de Ramagem

8 mai 2025 - 10h46
(atualizado em 10/5/2025 às 15h46)

Supremo derruba decisão da Câmara que impedia o avanço da ação penal contra o ex-diretor da Abin de Bolsonaro e outros acusados de integrarem núcleo duro de tentativa de golpe.A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) atingiu unanimidade neste sábado (10/05) para restringir a decisão da Câmara dos Deputados que tentou suspender a ação penal contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) por seu suposto envolvimento na tentativa de um golpe de Estado.

Na prática, a decisão do colegiado mantém parcialmente o processo contra Ramagem, no qual é réu ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro.

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Na última quarta-feira, a Câmara havia aprovado um projeto para eliminar o processo contra Ramagem. Ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), ele é acusado de tentativa de golpe de Estado no plano arquitetado para manter Bolsonaro no poder após ter perdido as eleições presidenciais de 2022.

A Casa se baseou em um artigo da Constituição que trata de imunidade parlamentar e permite que a Câmara e o Senado suspendam o andamento de uma ação penal contra deputado ou senador por crime ocorrido depois de sua diplomação.

O projeto de lei foi apresentado em abril pelo PL, partido de Bolsonado e Ramagem, logo após eles se tornarem réus no STF, e tramitou com rapidez. O texto foi aprovado por 315 votos a favor e 143 contrários. Como não precisa passar pelo Senado, a suspensão foi imediatamente promulgada pelo presidente da Câmara, Hugo Motta.

Contudo, para os ministros Alexandre de Moraes, relator do caso, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Cármen Lúcia e Flávio Dino, apenas os crimes que teriam sido cometidos por Ramagem após tomar posse de seu atual mandato podem ser suspensos. O marco temporal é a diplomação, ocorrida em dezembro de 2022.

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Com isso, Ramagem deve continuar respondendo por três crimes: golpe de Estado, organização criminosa armada e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.

Ficam suspensas apenas duas acusações: a de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado, por se referirem aos atos de 8 de janeiro, que ocorreram após a data de diplomação.

Bolsonaro e aliados poderiam se beneficiar da decisão da Câmara?

O relator do projeto, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), defendeu em seu parecer a suspensão de todo o andamento da ação penal em curso no STF "em relação a todos os crimes imputados". Além de Ramagem, o processo envolve os demais sete denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de integrar o núcleo central da trama golpista, incluindo Bolsonaro.

Pela forma vaga com que foi redigido, o texto tem sido considerado uma tentativa de impedir o julgamento contra o ex-presidente e seus assessores, previsto para este ano.

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Entre os réus, estão ainda o general Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil, o general Augusto Heleno, ex-ministro da Defesa, o almirante Almir Garnier Santos, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e o general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa. Eles compõem o chamado "núcleo crucial" do golpe.

Eles são acusados dos seguintes crimes:

Organização criminosa armada;

Tentativa de golpe de Estado

Abolição violenta do Estado Democrático de Direito;

Dano qualificado pela violência e grave ameaça;

Deterioração de patrimônio tombado.

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Ramagem é acusado de ter prestado suporte técnico, elaborando documentos para subsidiar ações de desinformação, especialmente em relação à segurança e legitimidade do sistema de votação em 2022.

STF sinaliza contra a medida

Alguns ministros do STF têm manifestado o entendimento de que qualquer tentativa de travamento da ação para outros réus que não são parlamentares, como Bolsonaro, seria inconstitucional.

Antes da votação do colegiado, o presidente da 1ª Turma do STF, Cristiano Zanin, já havia indicado que a suspensão só valeria para Ramagem, e não para os demais réus.

No despacho desta sexta-feira, Alexandre de Moraes também defendeu em seu voto que a imunidade parlamentar é um benefício individual.

"Os requisitos do caráter personalíssimo (imunidade aplicável somente ao parlamentar) e temporal (crimes praticados após a diplomação), previstos no texto constitucional, são claros e expressos, no sentido da impossibilidade de aplicação dessa imunidade a corréus não parlamentares e a infrações penais praticadas antes da diplomação", disse. O entendimento foi seguido pelos demais ministros.

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O relator do texto, deputado Alfredo Gaspar, rebateu a posição de ministros do STF dizendo que, mesmo os crimes que teriam ocorrido antes da diplomação, estariam contemplados pela sustação porque seriam "permanentes", ou seja, se prolongam no tempo.

"Puxadinho pra anistia"

A votação da suspensão do processo penal contra Ramagem preencheu o espaço deixado na pauta da oposição após Hugo Motta ter decidido não pautar, por ora, o projeto de lei que anistia os acusados e condenados por tentativa de golpe no 8 de janeiro.

"Estão achando um puxadinho para a anistia. Os senhores acham que podemos votar aqui o sustamento do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro no STF?", disse o líder do PT, deputado Lindergh Farias.

O PL da anistia acabou também envolvendo o STF, mas devido a uma polêmica sobre emendas parlamentares. O líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante, fez um requerimento de urgência para que a proposta de anistia fosse votada diretamente no plenário, sem passar pelas comissões.

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Como forma de pressionar para que fosse colocado em votação, chegou a sugerir que assumiria o controle de emendas nas comissões presididas pelo PL. Segundo ele, havia um acordo que previa 30% das emendas de cada comissão sob o controle do partido que a preside, e os demais 70% para os demais partidos.

O ministro do STF Flávio Dino pediu então esclarecimentos com relação à divisão de emendas de comissão, o que foi negado por Sóstenes no fim de abril - usando como justificativa sua imunidade parlamentar. Dino rebateu afirmando que a imunidade parlamentar não impede a apuração de possíveis irregularidades no uso de verbas públicas e reiterou o pedido de explicações.

sf/bl/gq (Agência Câmara de Notícias, Agência Brasil ots)

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