Estudante de medicina é investigado por suposta antecipação de questões do Enem 2025, após mensagens e materiais divulgados em seu curso se assemelharem a perguntas da prova, gerando suspeitas de vazamento e apuração do Inep e da Polícia Federal.
Além das questões quase idênticas às do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2025 divulgadas em uma live dias antes da prova, o estudante de Medicina Edcley Teixeira indicou em um grupo de WhatsApp as respostas corretas de outras duas perguntas de matemática em março deste ano, segundo a TV Globo.
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De acordo com a reportagem, as questões -- que continuam válidas no gabarito oficial -- são as seguintes:
- a sobre probabilidade/lançamento de dados (178 da prova azul, 176 da cinza, 169 da amarela e 172 da verde);
- e a sobre solução com concentração de 99,90% (140 da prova azul, 144 da cinza, 137 da amarela e 148 da verde) .
Em 17 de março, o jovem enviou uma mensagem ao seu grupo de monitoria que dizia "uma coisa eu garanto: se cair no Enem, pode marcar '125/216' sem medo de ser feliz… Nem leia, não". No Enem 2025, uma questão sobre um lançamento de dados cúbicos, a resposta era exatamente "Artur, com possibilidade de 125/216". Confira:
No mesmo mês, ele enviou uma outra mensagem com uma questão: "Você tem 10 ml de uma solução com concentração de 99,95% de água e o restante de cloro. [De] quantos mililitros de água pura você precisaria adicionar a essa solução para que a concentração de água passe a ser de 99,90%?", escreveu. A resposta dessa era 5.
No exame deste ano, caiu uma pergunta com os números idênticos adiantados pelo estudante. Apenas a unidade de medida (litros) é diferente. Veja:
Após a prova, ao saber que as questões caíram, Edcley resgatou as mensagens e celebrou no grupo: "Olha isso!!! Sei que todos vocês acertaram kakakaka", disse sobre a pergunta do lançamento dos dados.
Em relação a da solução com concentração, ele escreveu: "A questão da água, que eu mandei no PV [privado] de todos… Mandei no grupo também! E também tem nos nossos pdfs de pré-teste kakakakkaa. Se alguém errou, é porque não fez".
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pelo exame, ainda não se manifestou sobre essas duas questões semelhantes adiantadas pelo jovem.
Estudante diz que foi 'coincidência'
Edcley disse que "não sabia" que as perguntas que divulgou na live cairiam na prova deste ano e classificou como "coincidência" as similaridades. As declarações foram dadas em entrevista ao Fantástico, da TV Globo, exibida na noite do último domingo, 23.
O jovem, que é de Sobral, no Ceará, oferece cursos pagos de "mentorias" para jovens que estejam estudando para o Enem. Depois da aplicação da prova, surgiram registros nas redes sociais que indicavam que Edcley teria 'previsto' algumas questões praticamente idênticas às aplicadas na prova definitiva, o que gerou suspeitas de vazamento. Com a repercussão, o Inep anulou três perguntas.
O caso foi divulgado primeiramente pela jornalista Luiza Tenente, do site g1. Em entrevista à TV Globo, ela contou que recebeu a mensagem de um aluno alertando sobre a live de Edcley. Ela mostrou trechos da transmissão do estudante, que agora está com acesso fechado ao público, e afirmou que encontrou cinco questões muito parecidas.
"Eu vi que eram os mesmos números, a mesma situação-problema, muitas vezes as alternativas eram basicamente idênticas", disse Luiza. "Então, é muito difícil acreditar que tenha sido sorte. Eu diria que é impossível."
Edcley afirma que soube do material com antecedência não por conta de um suposto vazamento, mas por receber informações de estudantes que realizam um pré-teste do Enem, na prova do Prêmio Capes de Talento Universitário -- prova feita com alunos de universidades federais que serve para premiar desempenhos e também testar a dificuldade de possíveis perguntas de edições futuras do Enem.
A jornalista ainda descobriu que o estudante pagava candidatos para memorizar perguntas dessa prova. Em mensagem exibida na reportagem, ele aparece pedindo para outras pessoas memorizarem até 10 questões e comenta que está disposto a pagar R$ 10 por cada uma.
Ao Fantástico, o jovem se defendeu. "Não vejo má fé porque não existia nenhum termo de compromisso, nenhum termo de sigilo. Não existia nem no edital e nem no processo de inscrição", disse. "Se eles nos avisassem: 'É um pré-teste, você tem que assinar o termo de sigilo, não pode divulgar para ninguém', com certeza ficaria mais seguro o processo", acrescentou.
A respeito de peças publicitárias encontradas em suas redes sociais, como uma em que consta a frase "único monitor do País a realizar o pré-teste do Enem 2025", Edcley disse se arrepender: "É uma forma de publicidade que hoje eu considero infeliz. Era simplesmente para chamar atenção para o meu curso".
No domingo, o jovem foi alvo de mandado de busca e apreensão, cumprido pela Polícia Federal. Os agentes apreenderam aparelhos dele como celular e computador, além de documentos.
O que dizem o Inep e o MEC?
O presidente do Inep, Manuel Palacios, também comentou o caso em entrevista à emissora: "Não há a menor chance de um item memorizado por um estudante que fez uma prova afete, de alguma maneira, a segurança do Enem. Não há risco algum, técnico, neste episódio. Não há a menor possibilidade de algum estudante ter uma nota melhor porque passou os olhos nessa questão".
Palacios ressaltou, porém, que serão mantidas investigações: "Há, aparentemente, neste caso, um esforço concentrado para prejudicar o Enem. Precisamos saber o que está acontecendo."
Camilo Santana (PT), ministro da educação, reafirmou que o Enem 2025 não será cancelado: "Há uma preocupação muito grande para garantir a lisura do processo. Quero tranquilizar a todos que fizeram o exame que o Enem continua, o resultado final sairá em janeiro de 2026." *(Com informações do Estadão Conteúdo).