O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, será o primeiro a votar pela condenação ou absolvição de Jair Bolsonaro e outros sete aliados na ação penal da trama golpista --cujo julgamento será retomado nesta terça-feira, 9, após mobilizações pró-anistia terem tomado as ruas de diversas cidades pelo Brasil no Sete de Setembro. A ordem de votação dos ministros é pré-determinada e há motivos para isso. Entenda!
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Moraes é o primeiro a votar, pois é o relator do caso. Depois, os demais ministros se pronunciam de acordo com o tempo que integram o Supremo, em ordem crescente. Por isso Flávio Dino, que se tornou ministro no ano passado, sendo o “caçula” da Turma, é o próximo a votar.
Depois é a vez de Luiz Fux, que foi nomeado em 2011. Na sequência vem o voto de Cármen Lúcia, a mais antiga do grupo, empossada ministra em 2006. Por fim, os votos são encerrados pela manifestação do presidente da Turma, que no caso é Cristiano Zanin.
Desde 2023, ações penais são julgadas nas turmas da Corte para dar celeridade aos processos -- e, por isso, apenas cinco ministros dos 11 que compõem o Supremo votam neste julgamento de Bolsonaro. Os cinco citados integram a Primeira Turma, responsável pelo caso.
Mas por que eles? A Primeira Turma é a responsável pela análise do julgamento porque Moraes, que é o relator do caso, pertence a ela. E Moraes, por sua vez, ficou à frente da relatoria por já estar tocando outros inquéritos relacionados aos possíveis crimes -- tendo como "base" o inquérito das fake news, aberto em 2019. Isso ocorre devido a um regimento interno da Corte que estabelece que a relatororia deve ser assumida pelo mesmo magistrado em casos relacionados, onde haja conexão com inquéritos anteriores sob sua responsabilidade.
São réus no processo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL); ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, Walter Braga Netto; ex-ajudante de ordens Mauro Cid; almirante de esquadra que comandou a Marinha, Almir Garnier; ex-ministro da Justiça, Anderson Torres; ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno; o general e ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira; e o deputado federal e ex-presidente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) Alexandre Ramagem (PL-RJ).
Em relatório final, emitido em julho, a Procuradoria-Geral da República pediu a condenação dos réus (com exceção de Ramagem) pelos crimes:
- Organização criminosa armada – pena de 3 a 8 anos de prisão, podendo chegar a 17 anos se houver uso de arma de fogo ou participação de funcionário público;
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito – pena de 4 a 8 anos de prisão;
- Golpe de Estado – pena de 4 a 12 anos de prisão;
- Dano qualificado pela violência ou grave ameaça – pena de seis meses a 3 anos de prisão;
- Deterioração de patrimônio tombado – pena de 1 a 3 anos de prisão.
As penas máximas somadas podem chegar a 43 anos. Vale ressaltar especificidades que podem pesar em uma possível condenação dos réus: Bolsonaro, para além de denunciado pelos crimes, é apontado como líder da organização criminosa e Mauro Cid deve ter a pena reduzida devido a seu acordo de colaboração premiada com a Polícia Federal.
Já Alexandre Ramagem (PL-RJ), deputado federal e ex-presidente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) que também é réu, é o único acusado por apenas três desses cinco crimes: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.
E se votarem pelas condenações, o que acontece?
A Primeira Turma votar pela condenação dos réus não significa que eles serão presos imediatamente. Isso porque eles ainda podem apresentar recursos --que podem pesar mais ou menos, a depender do placar do júri. A execução de uma eventual pena só pode acontecer após ser dado “trânsito em julgado”, ou seja, quando são esgotados todas as possibilidades de recursos.
Jair Bolsonaro está em prisão domiciliar desde o dia 4 de agosto, mas devido um processo que corre paralelamente no STF. No caso, se trata do inquérito que aponta que as ações do deputado Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos, com o apoio do ex-presidente, tiveram como objetivo pressionar o Supremo a desistir da ação penal da trama golpista. Nisso, ambos foram indiciados pelos crimes de coação no curso do processo e abolição do Estado Democrático de Direito.
Quais as datas das próximas sessões e como acompanhar?
Nesta terça-feira serão duas sessões: das 9h às 12h e das 14h às 19h. Depois, o julgamento segue:
- 10 de setembro (quarta-feira): sessão extraordinária das 9h às 12h;
- 11 de setembro (quinta-feira): sessões extraordinárias das 9h às 12h e das 14h às 19h --essas são sessões extras, solicitadas por Moraes na última sexta-feira, 5, e acatadas por Zanin
- 12 de setembro (sexta-feira): sessão extraordinária das 9h às 12h e das 14h às 19h.
É possível acompanhar a transmissão pelos canais oficiais do STF --TV Justiça, Rádio Justiça, aplicativo Justiça+ e o canal do Supremo no YouTube. O Terra também transmite as sessões e traz detalhes do julgamento e de seus bastidores.
Relembre o início do julgamento
O julgamento foi aberto pelo ministro Cristiano Zanin, presidente da Corte, na última terça-feira, 2. No mesmo dia, que contou com duas sessões, Alexandre de Moraes leu o relatório do caso resumindo todas as etapas investigativas e processuais, e o procurador-geral da República, Paulo Gonet, reforçou a denúncia apresentada.
Moraes retomou, como tem sido de costume, o discurso em defesa da atuação do STF e da soberania brasileira, também criticando pressões internacionais --sem citar diretamente os Estados Unidos, que seguem entrave político-econômico com o Brasil-- e se posicionou contra os defensores da anistia para os envolvidos nos ataques antidemocráticos de 8 de janeiro.
Sobre o julgamento, em si, Moraes afirmou que as investigações descobriram "uma verdadeira organização criminosa" que tentou coagir o Supremo e submetê-lo "ao crivo de outro Estado estrangeiro". Caso haja qualquer "dúvida razoável sobre a culpabilidade", os réus serão inocentados. O ministro garantiu que a Corte irá analisar as provas com base no devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório.
Já o procurador-geral, com firmeza, reforçou não ser preciso "esforço intelectual extraordinário" para se reconhecer que um golpe de Estado estava em curso. Para ele, todos os personagens do processo são responsáveis pela tentativa de interferir no processo constitucional de sucessão, com o intuito de manter Bolsonaro no poder após a derrota eleitoral de 2022.
Depois de sua fala, ele "sumiu" do primeiro dia do julgamento e sua ausência foi criticada por apoiadores de Bolsonaro. Segundo o subprocurador-geral, Paulo Vasconcelos Jacobina, que assumiu seu lugar no dia, Gonet tinha um compromisso internacional marcado há alguns meses.
Na sequência tiveram início as falas de defesa. Ainda no primeiro dia se apresentaram as defesas de Mauro Cid, Alexandre Ramagem, Almir Garnier e Anderson Torres. Depois, na quarta-feira, 3, falaram os advogados restantes em representação a Augusto Heleno, Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto. Cada defesa teve uma hora para apresentar suas sustentações orais --que contaram com momentos descontraídos de piadas e floreios à Corte, mas também com situações de críticas duras e bate-boca.
No geral, as defesas pediram por absolvição e argumentaram em prol de, ao menos, tentar reduzir as possíveis penas. A investigação é complexa, e muitos pontos foram levantados – mas alguns ‘costuraram’ as defesas. Como foi o caso das reclamações sobre a colaboração premiada de Mauro Cid e sobre o volume excessivo de arquivos disponibilizado sem padrão e com pouco tempo para análise.
Além disso, um ponto de destaque da primeira semana do julgamento foi quando a defesa de Paulo Sérgio Nogueira, representado pelo advogado Andrew Fernandes Faria, seguiu na linha de que o general e ex-ministro da Defesa do governo Bolsonaro teria tentado “demover” o ex-presidente.
A ministra Carmém Lúcia, questionou sobre o que exatamente ele estaria falando. “Demover de adotar qualquer medida de exceção”, complementou o advogado, confirmando indiretamente a existência da trama. Segundo o advogado, o assunto “roubava a paz” de seu cliente. "O general Paulo Sergio atuou para demover o presidente de incursionar, de caminhar qualquer medida de exceção", afirmou.
Após a primeira semana de julgamento, no domingo, 7, ruas pelo Brasil foram tomadas por manifestantes pró-Bolsonaro que clamaram por anistia "ampla, geral e irrestrita" no Sete de Setembro. No ato da Avenida Paulista, por exemplo, se reuniram lideranças como Michelle Bolsonaro, ex-primeira-dama e presidente do PL Mulher, o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas e o pastor Silas Malafaia, e o recado foi direcionado principalmente a Hugo Motta, o presidente da Câmara dos Deputados, que é quem pode colocar o assunto em pauta para votação. Para além do "perdão", se espera que Jair Bolsonaro -- que está inelegível -- possa concorrer à presidência 2026.
Nos atos, também foi manifestado o descontentamento com as decisões do Supremo por falas e placas -- como as com a frase 'Fora Moraes'. Até Tarcísio subiu o tom de seu discurso frente à questão, com ataques diretos ao Supremo: "Ninguém aguenta mais a tirania de um ministro como Moraes. Ninguém aguenta mais o que está acontecendo nesse país", declarou. No palanque, políticos seguiram na linha de que a condenação a Bolsonaro "já está dada" e, nisso, voltaram seus discursos na luta pela anistia.