Tributação de 10% sobre dividendos pode gerar bitributação e judicialização

A incidência adicional tende a tornar a tributação quase confiscatória, diz especialista

29 dez 2025 - 06h14
Resumo
A nova lei de tributação de 10% sobre dividendos pode levar a casos de bitributação, aumentar consideravelmente a carga tributária e gerar disputas judiciais, especialmente afetando pequenas e médias empresas e profissionais liberais.
Foto: Freepik

A edição da lei 12.570/2025 que prevê a cobrança de 10% a título de Imposto de Renda sobre dividendos, reacendeu o debate sobre a possibilidade de bitributação no país. Isso porque os lucros distribuídos aos sócios já foram tributados anteriormente na pessoa jurídica, pela soma de IRPJ e CSLL. Para especialistas, a nova incidência pode representar uma dupla tributação e abrir caminho para uma onda de ações na Justiça.

O tributarista Jacques Veloso de Melo, advogado e especialista em Direito Tributário, explica que a bitributação ocorre quando o mesmo resultado econômico é tributado mais de uma vez por entes federativos diferentes ou pela mesma esfera de governo, sem que haja uma compensação efetiva. 

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“No Brasil, as empresas já pagam uma carga que chega a 34% sobre o lucro antes de distribuí-lo. Ao aplicar mais 10% na pessoa física, podemos ultrapassar 40% de tributação total. Isso pode caracterizar uma dupla incidência sobre o mesmo rendimento”, afirma.

Segundo ele, embora o projeto preveja um mecanismo de compensação, ele não é suficiente para evitar aumentos substanciais na carga tributária. “A proposta não garante que todo imposto retido sobre dividendos será compensado. Em muitos casos, especialmente para pequenas e médias sociedades, o impacto será direto e imediato. A legislação pode acabar criando um desequilíbrio injustificado entre setores e tamanhos de empresas”, analisa Jacques.

Casos em que pode haver bitributação

De acordo com Jacques Veloso de Melo, os principais cenários de bitributação incluem:

• Lucros distribuídos a pessoas físicas acima de R$ 50 mil por mês, que sofrerão retenção automática de 10%.

• Dividendos pagos por empresas já altamente tributadas, como prestadoras de serviços no lucro presumido.

• Distribuições realizadas por holdings familiares, comuns na organização patrimonial de profissionais liberais e empresários.

• Dividendos distribuídos por sociedades dedicadas a profissões regulamentadas, pois são sociedades de trabalho e não de capital, onde o fruto do trabalho dos sócios já é tributado na pessoa jurídica e será novamente tributado na distribuição.

“Nos casos de estruturas familiares ou de empresas de serviços, que já arcam com uma carga alta na pessoa jurídica, a incidência adicional tende a tornar a tributação quase confiscatória. Isso abre espaço para questionamentos no Supremo Tribunal Federal com base nos princípios da razoabilidade, capacidade contributiva e não-confisco”, diz o especialista.

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Judicialização deve crescer se não houver definição clara

Para o especialista, se o modelo de tributação de dividendos não vier acompanhado de regras objetivas que evitem o excesso de tributação, a tendência é de aumento expressivo nas ações judiciais. “Já há uma tributação das pessoas jurídicas de 34% sobre o lucro, além da tributação sobre o faturamento, impor mais um ônus tributário no repasse aos sócios é um verdadeiro confisco. Nenhuma empresa pode arcar com imposto cobrado duas vezes sobre o mesmo resultado”, afirma.

Ele complementa que a Reforma Tributária traz avanços importantes, mas pontos sensíveis como esse precisam ser resolvidos antes da implementação.“É natural que o país discuta a taxação de dividendos, mas é fundamental que isso não resulte em aumento indireto da carga tributária por erro de estruturação. Caso contrário, teremos mais litígios e menos segurança para empreender”, conclui Jacques Veloso.

Ele destaca ainda que o impacto não ficará restrito a grandes corporações. “Profissionais liberais organizados em sociedades — como médicos, advogados, engenheiros e contadores — podem ser os mais afetados. Para muitos deles, a distribuição de lucros é parte essencial da renda e já sofreu tributação elevada na empresa”, afirma.

Orientação para empresas e contribuintes

Jacques recomenda que empresas e profissionais comecem a revisar seu planejamento. “Esse é o momento de avaliar cenários, rever estruturas societárias e simular a carga efetiva com a nova regra. O objetivo é identificar riscos e evitar surpresas quando a tributação começar a ser aplicada”, orienta.

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(*) Homework inspira transformação no mundo do trabalho, nos negócios, na sociedade. É criação da Compasso, agência de conteúdo e conexão.

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