O papel do telejornalismo é noticiar a verdade. Mas, quando se trata da cobertura da violência urbana associada ao tráfico de drogas, há um desdobramento perigoso.
A gigantesca visibilidade e o imensurável poder de influência da TV transformam os criminosos mais temidos em personagens com status de celebridades do crime.
A superexposição no vídeo alimenta a fama e a noção de periculosidade. Não mostrá-los ou omitir os nomes seria uma maneira de impedir publicidade na mídia?
Mas, assim, o noticiário não ficaria incompleto ou artificial, escondendo da sociedade a dimensão real do problema e a identidade dos causadores do caos?
Perguntas sem respostas definitivas.
A fronteira entre informar e espetacularizar o crime e os bandidos, ainda que não intencionalmente, torna-se cada vez mais tênue — e é justamente nesse limite que a televisão precisa refletir sobre seu papel ético.
Por certo tempo, alguns canais tiraram a sigla PCC da boca dos apresentadores e comentaristas. Falava-se ‘facção criminosa que domina os presídios de São Paulo’. Soava ingênuo e inútil.
Até porque, quando se consegue uma entrevista exclusiva com um chefe de grupo em presídio, as chamadas na programação parecem anunciar um pop star inatingível. Exagero perigoso em nome da audiência.
Por outro lado, a maioria dos telejornais populares baseados no sangrento mundo cão reforça a narrativa do ‘bandido bom é bandido morto’, induzindo o público ao radicalismo que flexibiliza a lei a fim de atingir a justiça a qualquer preço.
A sensação de insegurança se tornou um produto midiático de alto valor comercial. E o telejornalismo, às vezes, ganha aspecto de entretenimento sensacionalista.
Com pouco tempo para reflexão, a TV aberta falha ao não cumprir um papel pedagógico para discutir as causas estruturais da violência e as possíveis soluções.
Essa ‘missão’ fica com os canais pagos de notícias (com preço de assinatura inviável ao brasileiro de baixa renda), consumidos por uma elite que debate o problema à distância, sem noção real do que ocorre nas vielas do Alemão, da Penha, de Parelheiros, do Capão Redondo…
E assim a vida segue entre balas perdidas, latrocínios, execuções e outras tragédias repetitivas dessa novela da vida real — sem perspectiva de pacificação nem final feliz.