PUBLICIDADE
URGENTE
Saiba como doar qualquer valor para o PIX oficial do Rio Grande do Sul

A 'mistura' é um dos empecilhos para o veganismo no Brasil?

Para a maioria, um PF brasileiro bem servido é aquele que para além do arroz feijão tem pelo menos uma 'mistura' de acompanhamento.

23 nov 2023 - 15h01
(atualizado às 16h50)
Compartilhar
Exibir comentários
Prato completo, nutritivo e sem nada de origem animal
Prato completo, nutritivo e sem nada de origem animal
Foto: Vegano Periférico

O famoso acompanhamento do arroz com feijão é um dos empecilhos para a popularização do veganismo no Brasil. Aquele preparo de origem animal que ''completa'' o prato do povo brasileiro, conhecido como ''mistura'', tem um papel fundamental para a maioria das pessoas.

Antes de entendermos qual a função da ''mistura'', e porque ela é considerada de extrema importância para uma parcela gigantesca da população. Precisamos entender de onde surge o termo e porque faz sentido não julgar esse hábito sem considerar esse passado.

A palavra ''mistura'' remonta aos tempos da escravidão, os escravizados nas senzalas não tinham acesso a carnes (vermelha, frango ou peixe), era muito caro consumir carnes nessa época. E só os escravizadores conseguiam comprar e consumir esse produto, que era e até hoje é tido como sofisticado.

Devido a isso, eles recebiam uma pequena quantidade que servia apenas como complemento, e tinham que dividir entre eles, o pedaço era tão pequeno que era impossível chamar de prato principal.

O que restava era misturar essa sobra com arroz, feijão e farinha, e daí surge o nome mistura. As bases dessa cultura são tristes e profundamente enraizadas em uma população que sofre até hoje com a colonização europeia.

E quase a totalidade da população brasileira carrega consigo esse hábito até hoje. É comum um espanto ao se depararem com alguém que por escolha própria monta um prato repleto de comida, mas sem um pedaço de carne, ovos ou embutidos. Justamente por conta desse passado tão cruel.

Também tínhamos essa visão e essa mesma sensação. Essa herança é tão forte, que nós pensávamos que não tínhamos o que comer em casa se não tivesse um pedaço de bife, calabresa, salsicha ou um ovo frito para acompanhar o arroz com feijão.

Por isso é muito difícil aceitar que uma alimentação sem pedaços de animais ou derivados é completa e saudável. Porque sempre enxergamos essa ausência como ''falta'', sempre enxergamos isso como insegurança alimentar.

E depois de 8 anos sem consumir nada de origem animal, passamos a enxergar a ''mistura'' como qualquer acompanhamento para além do arroz e do feijão. Seja uma couve refogada, uma abóbora, batata ou macaxeira assada, seja um purê, hambúrgueres de grão-de-bico, lentilha, ervilha ou feijão, entre muitos outros.

Não demorou muito para entendermos que um prato sem carne ou ovos, mas repleto de grãos, cereais, vegetais e legumes é completo, nutritivo e com variedade de ''misturas''.

Desapegados da ideia de que ''mistura'' é apenas de origem animal, e se não tivermos isso, não temos o que comer. E acreditamos que essa mudança na forma de pensar e enxergar é um passo fundamental para compreendermos o que nos mantém reproduzindo os mesmos hábitos de geração em geração, sem questionamentos.

Se liga:

Entendemos claramente que milhões de pessoas clamam pelo básico, para comer e se manter vivos. E sabemos que para 90% da população, poder consumir um símbolo da ascensão social (como as carnes e os demais produtos animais) é quase que um objetivo e uma meta de grande relevância.

Não podemos em hipótese alguma esquecer ou ignorar que o Brasil passou por um período (escravidão) desumano, cruel e devastador entre os anos de 1500 e 1888. É necessário lembrarmos disso para combatermos e superarmos as bases dessa atrocidade.

Vegano Periférico Leonardo e Eduardo dos Santos são irmãos gêmeos, nascidos e criados na periferia de Campinas, interior de São Paulo. São midiativistas da Vegano Periférico, um movimento e coletivo que começou como uma conta do Instagram em outubro de 2017. Atuam pelos direitos humanos e direitos animais por meio da luta inclusiva e acessível, e nos seus canais de comunicação abordam temas como autonomia alimentar, reforma agrária, justiça social e meio ambiente.
Compartilhar
Publicidade
Publicidade