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Fala antivacina de Bolsonaro troca certeza por dúvida

Conflito e ambiguidade dificultam execução ao criarem um contexto difícil para ação dos agentes implementadores

2 set 2020 - 15h07
(atualizado às 15h13)
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O presidente Jair Bolsonaro manipula sistematicamente conflito e ambiguidade em sua lógica de governar, criando caos onde não existia e dúvida onde antes havia certeza. Assim, inviabiliza a capacidade de implementação de políticas sem precisar extingui-las. Este é o contexto onde a recente declaração de Bolsonaro se situa. Disse ele: "ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina".

Fala antivacina de Bolsonaro troca certeza por dúvida
Fala antivacina de Bolsonaro troca certeza por dúvida
Foto: fdr

Em 1995, o cientista político americano Richard Matland propôs que a capacidade de execução de uma política pública é determinada por seu grau de conflito e ambiguidade. Conflito é grau de disputas sobre um tema. Ambiguidade é a incerteza sobre a política. Conflito e ambiguidade dificultam execução ao criarem um contexto difícil para ação dos agentes implementadores.

Conflito e ambiguidade são variáveis manipuladas por governantes. Quando querem que uma ideia seja implementada, a regulamentam, diminuindo ambiguidade, ou negociam, diminuindo conflito. E quando não querem a política, retiram recursos, aumentando indecisão, ou criam conflito onde não existe. É uma tática de baixo custo político para os governantes, já que não precisam declarar fim da política, apenas diminuem capacidade de execução.

O programa nacional de imunização, um grande sucesso do SUS, é cenário histórico de baixa ambiguidade, baixo conflito e alta execução, apesar de recentes movimentos antivacina terem avançado na internet. Ao colocar em dúvida a necessidade de vacinação, o presidente desloca esse contexto e cria dificuldades para executar a política. Como as equipes de saúde vão agora convencer as famílias a se vacinarem se o presidente disse que não precisa? Entre o conflito e ambiguidade, Bolsonaro extingue programas históricos e de sucesso do país. E coloca, assim, a vida de todos nós em risco.

Gabriela Lotta, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) e doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP)

Estadão
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