Daniele Valente e Astrid Fontenelle expõem a dor crônica; especialista explica impactos e tratamentos
Condições como fibromialgia e lúpus, enfrentadas respectivamente pelas artistas, evidenciam a dor crônica como uma doença complexa que afeta corpo e mente, exigindo diagnóstico especializado e tratamentos personalizados
A atriz Daniele Valente comentou publicamente sofrer de fibromialgia, doença caracterizada por dores constantes, fadiga e sensibilidade. Já a apresentadora Astrid Fontenelle, por sua vez, enfrenta o lúpus, condição autoimune que pode desencadear inflamações e sintomas persistentes. Casos como os delas chamam atenção para um problema que atinge milhões de pessoas em todo o mundo e que vai muito além do físico, afetando o emocional, o sono e até a carreira.
De acordo com o neurocirurgião e especialista em medicina da dor, Wuilker Knoner, a dor crônica precisa ser entendida como uma doença em si, e não apenas como sintoma. "A dor é um sinal elétrico que o corpo envia ao sistema nervoso central quando há uma lesão. O problema é quando esse sinal continua ativo por mais de três meses, mesmo após o tratamento da causa inicial. Isso gera uma alteração no sistema nervoso, que passa a funcionar no modo automático, mantendo a dor ligada continuamente", aponta.
Esse processo, chamado de Síndrome Dolorosa Crônica, pode desencadear uma série de outros sintomas, como ansiedade, estresse, depressão, insônia, irritabilidade, tontura, palpitações e até risco de suicídio. Em casos mais graves, como no chamado "membro fantasma", o paciente continua sentindo dor em uma parte do corpo que já foi amputada.
Estresse como gatilho
No caso de artistas como Daniele Valente e Astrid Fontenelle, o estresse emocional e a pressão de carreiras intensas podem funcionar como gatilhos para o agravamento da dor. "O corpo e a mente não funcionam separados. Quando há desgaste emocional ou noites mal dormidas, a dor encontra terreno fértil para se intensificar", diz o especialista.
Ele ressalta que, enquanto doenças inflamatórias como o lúpus provocam hiperssensibilização das terminações nervosas, a fibromialgia é diferente, pois não há lesão física detectável, mas o sistema nervoso interpreta estímulos normais como dor intensa. Em ambos os casos, o sofrimento é real e pode limitar a vida pessoal e profissional.
Desafios do diagnóstico
Um dos grandes obstáculos no tratamento da dor crônica é o diagnóstico correto. Muitas pessoas recorrem repetidamente a prontos-socorros em busca de alívio, mas acabam recebendo medicações voltadas para dores agudas, sem resolver o problema. "Não existe um exame específico que detecte a dor crônica. Em 90% dos casos de cefaleia, por exemplo, os exames são normais. O diagnóstico depende de uma avaliação clínica detalhada e do olhar integral para o paciente", reforça.
Segundo ele, pacientes com dor que persiste por mais de três meses devem procurar um médico especialista em dor, profissional com registro específico (RQE) nessa área, disponível para consulta nos Conselhos Regionais de Medicina.
Tratamentos cada vez mais personalizados
O tratamento da dor crônica é individualizado e pode combinar diferentes abordagens. Entre elas estão o uso de medicações (antidepressivos, anticonvulsivantes, ansiolíticos e derivados da cannabis), fisioterapia, atividades físicas, acupuntura, psicoterapia e técnicas integrativas, como ioga e mindfulness. Em casos mais complexos, há opções de alta tecnologia, como a estimulação magnética transcraniana, indicada para fibromialgia, e o implante de neuroestimuladores, conhecido como "marca-passo da dor", capaz de bloquear descargas elétricas aberrantes diretamente na medula ou no cérebro.
Para Wuilker, o futuro da medicina da dor está na personalização do cuidado. "Não basta tratar a doença. É preciso cuidar da pessoa que sente dor. O objetivo é devolver qualidade de vida e autonomia ao paciente", finaliza.
Especialista
O neurocirurgião Wuilker Knoner é natural de Campo Mourão, interior do Paraná. Ele é graduado em Medicina pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e realizou residência médica em Neurocirurgia no Hospital Federal de Bonsucesso, no Rio de Janeiro. Sua formação inclui ainda pós-graduação em Neurointensivismo no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Destacam-se também passagens por instituições de referência como o Barrow Neurological Institute, nos Estados Unidos, o Hospital das Clínicas da USP (especialização em Neurocirurgia Funcional e Dor), em São Paulo, e centros europeus de excelência na Itália (especialização em Coluna Vertebral Degenerativa e Tumores, em Bologna) e na França (estágio em Neurorradiologia Intervencionista, em Montpellier).