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"Transparência de gigantes é nula", diz especialista em educação

Segundo Tel Amiel, da UnB, escola tecnológica pensada por grandes empresas apresenta riscos para alunos e instituições de ensino

18 fev 2019 - 04h10
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Especialista alerta para os problemas dos gigantes de tec na educação 
Especialista alerta para os problemas dos gigantes de tec na educação
Foto: Vimeo / Reprodução / Estadão

Na medida que as gigantes tecnológicas, como Google e Microsoft, avançam nas escolas, a preocupação acerca de suas intenções nesse mercado aumenta. Para Tel Amiel, coordenador da cátedra de educação à distância da Unesco na Universidade de Brasília, falta transparência à essas empresas para manipular os dados de jovens e crianças. Ele conversou com o Estado sobre o assunto.

Qual é a sua opinião sobre a presença de gigantes da tecnologia, como Google e Microsoft, no mercado de educação?

O primeiro problema são as escolas públicas dependendo de software fechado de empresas privadas. Esse é um problema de gestão pública. A segunda questão importante é o movimento de dependência. Você ensina desde cedo a criança a mexer naquela plataforma, ela se acostuma com aquilo e é muito fácil fidelizar essa pessoa. Sempre foi um movimento das empresas de software. Isso é ruim porque reforça o discurso de que não há alternativas. O terceiro problema que vejo é que isso limita muito a ponta, porque tira alternativas do que as pessoas podem fazer nas máquinas - se quiser usar algum outro tipo de sistema não pode.Uma crítica que faço em relação ao ensino superior, mas que acredito também se aplica ao básico, é que quando você delega esses serviços para empresas você tira a capacitação dos servidores.

A coleta de dados de alunos preocupa?

O problema é que temos uma massa de informações de alunos, não só informações geradas no ambiente de sala de aula mas também de comportamento, que é gerida por uma empresa estrangeira. Quem controla essas informações, como esses dados serão usados, se vai gerar resultados de propaganda, se isso vai ser cruzado com outros e-mails dos alunos para gerar um perfil. A transparência disso é nula. Não temos a menor noção de como isso é gerido.

O que motiva mais as gigantes a entrar no mercado de educação: os contratos, a fidelização do aluno ou os dados deles?

O Google, quando chega numa secretaria de educação, não traz custos novos. Então, qual é o benefício de oferecer um serviço a custo zero? Fica muito fácil de saber que tem alguma outra coisa sendo gerada. Atualmente, para a Microsoft também não é atrativo vender o pacote. Eles preferem que os clientes fiquem ligados à nuvem. Como consumidor final, você paga isso mensalmente em vez de uma vez só. Não conheço os contratos atuais da Microsoft para ensino básico, mas eles me parecem muito mais próximos ao do Google.

Quais seriam as alternativas a essas empresas?

Vou dar um exemplo concreto: o sistema de edição de documentos da UnB é de software livre. Existem pelo menos meia-dúzia de serviços de processamento de textos, que são pagos e são de altíssimo nível. Poderiam ser instalados em escolas e secretarias.Você poderia trabalhar com uma solução paga que tem garantia de proteção de dados. Temos que ter consciência sobre qual modelo de negócios estamos lidando.Se você está pegando algo de graça, tem que saber o que está dando em troca. No ensino, isso é muito preocupante.

Para que os serviços do Google funcionem, eles exigem conexão o tempo todo. Como você vê esse modelo no contexto brasileiro?

A conectividade é um problema. Nem de perto resolvemos o problema da banda larga nas escolas, por isso ainda estamos presos nesse modelo de laboratório de informática.É por isso também que não conseguimos fazer projetos envolvendo celulares. Todo mundo fala que todos os alunos têm, mas não é possível confiar que você vai conseguir conectar 40, 50 pessoas na rede fazendo coisas significativas. E nem alunos, nem escola, tem 4G disponível para compartilhar. Por isso, o modelo do Google é inviável atualmente. Ainda assim, o processo de fidelização é muito valioso para a empresa, ainda mais numa trajetória de vida. Se não for isso, é filantropia.

Estadão
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