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Protocolo de Kyoto foi marco climático, mas insuficiente

Primeiro tratado internacional para frear o aquecimento global entrava em vigor há 15 anos

17 fev 2020 - 08h50
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"Até o último momento, tremíamos pensando que tudo poderia fracassar nos últimos segundos", afirma o advogado ambientalista e cientista climático Hermann Ott, descrevendo o clima das negociações que se estenderam noite adentro na tentativa de traçar um caminho para a luta da humanidade contra as mudanças climáticas.

O resultado das conversações, que só entraria em vigor oito anos depois, foi o Protocolo de Kyoto: o primeiro tratado vinculante sob o direito internacional visando reduzir os gases de efeito estufa, um marco na política climática internacional. O documento deu o tom para tudo que se seguiu, diz Saleemul Huq, diretor do Centro Internacional de Mudanças Climáticas e Desenvolvimento.

A história do Protocolo de Kyoto começa em 1992, na Convenção das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, onde a comunidade internacional sublinhou a responsabilidade histórica dos países ricos pela mudança climática.

Em 1997, em Kyoto, no Japão, as negociações sobre o documento definiram como e em que contexto a proteção do clima deveria prosseguir, consumando que grandes emissores de gases de efeito estufa deveriam liderar a desaceleração da mudança climática. Após a assinatura de 141 países, o Protocolo de Kyoto entrou finalmente em vigor em 16 de fevereiro de 2005, exatos 15 anos atrás.

Sob o tratado, 38 países industrializados se comprometeram a reduzir suas emissões de gases nocivos ao clima em 5,2%, em média, até 2012, em comparação com os níveis de 1990. Entre os signatários estavam os Estados Unidos e a União Europeia (UE). "Foi a primeira vez que tivemos algo no direito internacional tão vinculativo", afirma Huq, que esteve envolvido nas negociações para os países em desenvolvimento. "Foi um avanço."

Acordo insuficiente

Quando os Estados Unidos - responsáveis por uma grande parte das emissões históricas de CO2 - se retiraram do acordo em 2011, e o Canadá logo depois, muitos analistas pensaram que o Protocolo de Kyoto fracassara.

Mas, em 2012, as emissões dos países industrializados caíram 20% em relação aos níveis de 1990 - cinco vezes a meta de Kyoto para os demais países. A UE reduziu suas emissões em 19%, e a Alemanha, em 23%. No mesmo período, contudo, as emissões globais aumentaram cerca de 38%.

O acordo não foi suficiente para limitar o aumento do aquecimento global a longo prazo, afirma Andrew Light, do World Resources Institute (WRI). Isso porque o documento se aplica apenas aos países responsáveis por um quarto das emissões globais. "Isso não é suficiente para lidar com o problema. É preciso obter um acordo com participação maior", diz Light.

Comércio de carbono

Mais do que apenas reduzir as emissões, o protocolo introduziu o chamado Mecanismo de Desenvolvimento Limpo para o comércio de carbono. Ou seja, países que não atingissem suas metas de redução poderiam "comprar" de países menos poluentes o direito a emissões extras.

Essas nações emissoras também puderam compensar as emissões excedentes através de medidas de proteção climática em países em desenvolvimento.

Um por cento da receita do comércio de carbono tem sido destinado a um fundo de adaptação às mudanças climáticas, que é gasto em medidas como o reflorestamento de manguezais, construção de barragens e a contenção de erosões em regiões montanhosas de países em desenvolvimento.

Segundo o Banco Mundial, cerca de 10 bilhões de dólares (43 bilhões de reais) foram investidos em projetos por meio do fundo e do comércio de emissões.

O comércio global de emissões acabou se mostrando menos bem-sucedido do que os negociadores esperavam, mas pelo menos impôs um preço ao carbono pela primeira vez, avalia Huq, do Centro Internacional de Mudanças Climáticas e Desenvolvimento.

Governos em todo o mundo estão agora avaliando introduzir impostos sobre o CO2, e vários já o fizeram. A Suécia cobra o preço mais alto pelas emissões de gases prejudiciais ao clima: 114 euros (530 reais) por tonelada.

Pontos fracos

Em relação à energia renovável, o Protocolo de Kyoto foi um "divisor de águas", afirma Karsten Neuhoff, chefe de política climática do Instituto Alemão de Pesquisa Econômica (DIW, na sigla em alemão). "Em 2007, todo mundo ainda dizia que gerar 20% da energia da Europa a partir de fontes renováveis em 2020 seria uma utopia. Hoje é realidade." "Kyoto não é o único responsável por investimentos na transição energética, mas foi um estímulo importante", acrescenta Neuhoff.

Por outro lado, especialistas afirmam que a principal debilidade do Protocolo de Kyoto foi que nações em desenvolvimento não se comprometeram com metas climáticas. Economias de países como China, Índia e Indonésia cresceram rapidamente nos anos seguintes - assim como suas emissões de gases de efeito estufa.

Hoje, mais da metade das emissões globais vem de economias em desenvolvimento e emergentes. "Não fazemos o suficiente para resolver o problema em nível global", diz Huq. "E assim todos nós temos que fazer mais coletivamente." Em princípio, países industrializados ainda têm obrigações sob o Protocolo de Kyoto, substituído por um tratado posterior, o Acordo Climático de Paris de 2015.

Sob o Acordo de Paris, quase todos os países do mundo concordaram em limitar o aquecimento global a 2 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais. Os signatários do pacto se comprometeram com metas climáticas nacionais e de redução de CO2 que eles mesmos elaboraram. Até agora, no entanto, quase nenhum país tem cumprido suas metas.

As emissões globais de gases de efeito estufa aumentaram 41% desde 1990 e continuam a aumentar. Se as emissões de CO2 forem mantidas nos níveis atuais, a Terra se aquecerá cerca de 3 graus Celsius até o final do século. "O princípio do consenso fracassou", afirma o cientista climático Ott. "Países de combustíveis fósseis como Arábia Saudita, Estados Unidos, Rússia e Austrália estão bloqueando qualquer ação real. Portanto, um novo acordo é necessário - uma via expressa para aqueles Estados que realmente têm interesse na proteção do clima."

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