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Justiça impede mulher chamada Dilma de trocar nome para Manuela

Em nova entrevista à BBC News Brasil, Dilma P. diz que vai recorrer da decisão; "ofensas não cessaram" desde o impeachment da ex-presidente, relata ela.

2 set 2019 - 16h06
(atualizado às 18h03)
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Dilma P., de 37 anos, pede mudança de seu nome de batismo pelas chacotas que vem sofrendo desde que ex-presidente sofreu impeachment. (Crédito: Kako Abraham/BBC)
Dilma P., de 37 anos, pede mudança de seu nome de batismo pelas chacotas que vem sofrendo desde que ex-presidente sofreu impeachment. (Crédito: Kako Abraham/BBC)
Foto: BBC News Brasil

A Justiça de São Paulo negou a uma mulher chamada Dilma a possibilidade de trocar de nome. Na ação, ela dizia que passou a sofrer "bullying" por ser homônima da ex-presidente do Brasil e queria se chamar Manuela, como a BBC News Brasil noticiou em maio do ano passado.

A advogada de Dilma P., Isabelle Strobel, afirmou que sua cliente vai recorrer da decisão.

Em nova entrevista à reportagem, Dilma P. diz que ficou triste com o desfecho.

"Continuo sofrendo bullying. Sei que o impeachment já aconteceu e a Dilma (Rousseff) aparece menos no noticiário. Mas não posso falar meu nome sem que pessoas deem risada. Não quero mais este nome", afirma.

Segundo a decisão judicial a que a BBC News Brasil teve acesso, "Dilma constitui prenome corriqueiro, sem qualquer conotação deletéria em si. Em princípio, não se trata de nome notoriamente vexatório", escreveu o juiz Fábio Henrique Falcone Garcia, do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Para o magistrado, "atualmente, Dilma Rousseff não é figura central nos noticiários, cuja atenção se volta aos mandatários do momento. Por isso, eventual constrangimento não pode ser atribuído ao nome em si, mas à degradação pública de uma figura que tem nome e sobrenome e cuja mácula coincide com o período em que sua imagem esteve em evidência nos noticiários e nas redes sociais".

"Por essa razão, respeitado entendimento diverso, a exposição negativa de personagem pública não autoriza alteração de prenome que em si nada tem de ofensivo ou constrangedor. Ante o exposto, julgo improcedente o pedido", conclui Falcone Garcia.

Dilma P. rebate. "O juiz não sabe o que eu passo diariamente", diz ela.

Relembre a história

Em maio de 2018, quando entrou com a ação, Dilma P. disse à BBC News Brasil que "nunca gostou" do nome de batismo, mas que nunca havia pensado em mudá-lo até o impeachment de Dilma Rousseff.

"Queria ter um nome mais popular, mas nunca pensei na vida em trocá-lo. Quando Dilma se tornou presidente, meu nome passou a ser mais conhecido e as pessoas diziam se tratar de um nome diferente. Ficavam surpresas que eu tinha o mesmo nome da presidente", contou ela.

"Mas o impeachment chocou o país. Quando falo meu nome, todo mundo se lembra de Dilma e as piadas começam", completou.

Ela afirmou que, em seu antigo trabalho - passou dois anos como analista de relacionamento de um banco -, tinha de conversar com clientes via telefone e bate-papo online. Chegou, inclusive, a pedir ao supervisor para mudar o nome. Diante da negativa, precisou criar um "roteiro" para evitar ser alvo de zombaria.

"Um cliente chegou a me dizer que, se eu estivesse diante dele, me mataria. Outro falou que não queria ser atendido por mim. Pedi ao meu superior que mudasse meu nome. Mas ele sugeriu que eu criasse um roteiro, de forma a explicar que eu apenas compartilhava o mesmo nome do da presidente. Não deveria, portanto, ser vítima da fúria das pessoas", disse.

"Manuela"

Cursando Pedagogia, Dilma P. quer se chamar Manuela, uma homenagem ao pai, Manuel, já falecido.

"Foi um homem muito bom que, apesar de não ter estudos, me possibilitou chegar onde estou agora. Ele ficaria orgulhoso de mim", disse ela, quando entrevistada pela primeira vez.

Lembrada na época pela BBC News Brasil que uma das pré-candidatas à Presidência nas eleições também se chamava Manuela (Manuela D'Ávila - PC do B), Dilma P. disse que não "temia" passar pelo "pesadelo" novamente, caso a gaúcha vencesse o pleito.

"Se ela ganhar e vir a ser alvo de impeachment, pelo menos é um nome mais comum", rebateu.

D'Ávila acabou concorrendo como vice na chapa de Fernando Haddad (PT), que foi derrotado por Jair Bolsonaro (PSL) no segundo turno.

Recentemente, o nome da ex-deputada federal voltou ao noticiário após ela ter confirmado que intermediou o contato do hacker Walter Delgatti Neto com o jornalista americano Glenn Greenwald, do site The Intercept Brasil. Delgatti foi preso sob suspeita de hackear autoridades, como procuradores da Lava Jato.

Apesar disso, Dilma P. diz que o nome "Manuela é muito mais comum do que Dilma".

"Nenhuma Manuela é alvo de constrangimento por causa disso. O mesmo não acontece com Dilma", lamenta.

Atualmente, segundo dados do Censo, há cerca de 40 mil Dilmas no Brasil, a maioria no Estado da Bahia. Trata-se do 354º nome feminino mais popular do país. Maria, Ana, Francisca, Antonia e Adriana são, nessa ordem, os mais comuns.

Como funciona a lei

A Lei de Registros Públicos brasileira permite a troca de nomes não como regra, mas como exceção.

É o caso de casamentos, divórcios, adoções e erros ortográficos no registro do cartório.

Porém, para aqueles que desejam mudar o nome por outros motivos, é preciso pedir a substituição pela via judicial.

A troca não é fácil. O requerente deve expor o motivo da mudança e alegar a razão pela qual aquele nome causa constrangimento.

Em seguida, um juiz analisa se o motivo é relevante ou não.

Um dos objetivos é evitar, por exemplo, que um foragido possa querer mudar de nome e despistar as autoridades.

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