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Especialista: Brasil pode ter epidemia de Febre Chikungunya

Ministério da Saúde registrou os primeiros casos da doença em território brasileiro no final de agosto; o vírus já matou mais de 100 pessoas nos países afetados

6 out 2014 - 09h50
(atualizado em 18/12/2014 às 13h56)
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<p>Um dos mosquitos transmissores da Febre Chikungunya, o <em>Aedes aegypti,</em> está presente em mais de 4 mil municípios</p>
Um dos mosquitos transmissores da Febre Chikungunya, o Aedes aegypti, está presente em mais de 4 mil municípios
Foto: Getty Images

Todo mundo já sabe que o início do verão costuma vir acompanhado, além do calor, de um grande volume de chuvas, um prato cheio para a proliferação do mosquito Aedes aegypti e consequentemente a disseminação do vírus da dengue.

Mas poucos sabem que esse inseto transmite outra doença, a Febre Chikungunya, que chegou recentemente ao Brasil e fez mais de 100 vítimas fatais por onde passou.

Ela tem tudo pra ser a próxima vilã desse verão: ambiente propício, alvos vulneráveis e mosquitos transmissores em quantidade mais que suficiente para gerar uma epidemia. De acordo com o Ministério da Saúde, os dois mosquitos transmissores da doença, o Aedes aegypti está hoje distribuído em 4.318 municípios, e o Aedes albopictus em 2.126.

Diante disso, você deve estar se perguntando: é possível um surto da doença no Brasil? De acordo com o professor de infectologia da Unifesp, Celso Granato, existe, sim, essa possibilidade e ele explica por que. 

“Nossa população é muito vasta e em grande medida, nunca foi contaminada pelo vírus, somos 'virgens'. Além disso, há bastante Aedes aegypti, muitos mosquitos transmissores. Você tem chances de passar a infecção para outras pessoas à medida que o mosquito pica indivíduos com a doença e a transmitem para outros candidatos a serem infectados”, afirma Granato.

O pesquisador Pedro Fernando da Costa Vasconcelos, chefe da seção de Arbovirologia e Febres Hemorrágicas do Instituto Evandro Chagas – referência no diagnóstico da doença no Brasil – também alerta: os números de casos da doença devem aumentar no verão.

“Agora os níveis de chuva estão baixos, então os índices da infestação estão menores, mas lá por dezembro começam as chuvas e elas passam a ser muito fortes nos primeiros meses de cada ano, e em 2015 a perspectiva é que aumente o volume de chuvas, e, consequentemente, aumentem os índices de infestação do mosquito, então existe a possibilidade de aumento de infestação da Chikungunya”, afirma.

Casos no Brasil e Américas

Em 26 de setembro, o Ministério da Saúde confirmou 16 casos da doença transmitidos dentro do país – dois deles em Oiapoque, no Amapá, e 14 em Feira de Santana, na Bahia. O vírus também fez outras 37 vítimas nos estados do Ceará, Paraná, Rio de Janeiro, Roraima, Rio Grande do Sul, São Paulo, Goiás, Maranhão e Distrito Federal. Mas essas pessoas contraíram o vírus no exterior e desenvolveram a doença no Brasil.

A doença se manifestou no Brasil pela primeira vez em 2010 por meio de três casos importados: dois homens de 41 e 55 anos que haviam estado na Indonésia e uma mulher de 25 anos que tinha viajado para a Índia.

O vírus circula hoje em todos os continentes (ver infográfico abaixo) e vem causando o surgimento de casos autóctones (não importados) em cada um deles. Só nas Américas, eles já foram detectados em 35 países, entre eles, Estados Unidos, Costa Rica, República Dominicana, Colômbia, Venezuela e Jamaica. Já os casos importados foram localizados no Canadá, México, Nicarágua, Cuba, Bolívia, Peru, Argentina, Chile e Paraguai, países muito próximos ao Brasil e cujas populações, assim como a brasileira, são totalmente vulneráveis ao vírus.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença vem se espalhando pelo mundo desde 2004, ano em que um surto acometeu a costa do Quênia, propagando o vírus para Comores, Ilhas Reunião e outras ilhas do oceano Índico. Apenas dois anos mais tarde, o vírus chegou à Índia, Sri Lanka, Ilhas Maldivas, Cingapura, Malásia e Indonésia e fez cerca de 1,9 milhão de vítimas, 1,3 milhão apenas em território indiano.

Em 2007, o Chikungunya finalmente atingiu a Europa, causando um surto de pouco mais de 300 casos na região da Toscana. Um ano mais tarde, o vírus chegou à França, na região do Mediterrâneo. Em 2010, voltou a haver relatos de casos na Índia, Indonésia, Mianmar, Tailândia, Ilhas Maldivas, Ilhas Reunião e Taiwan.

No final de 2013, as transmissões autóctones passaram a ser registradas no Caribe.

Embora raras, as mortes por Febre Chikungunya podem ocorrer. De acordo com relatório atualizado pela Organização Pan-americana de Saúde em 26 de setembro, 118 pessoas já morreram por causa da doença.

No entanto, para o pesquisador do Instituto Evandro Chagas, apenas um grupo específico da população pode se tornar vítima fatal do vírus: “As pessoas que não resistem à doença têm idades extremas ou sofrem de alguma deficiência imunológica”.

Embora o vírus tenha se manifestado apenas agora dentro do Brasil, o Chikungunha já vem causando preocupação a especialistas há um ano. “Ela (a doença) caminha paralelamente à dengue e uma hora ia aparecer. Quando começaram a aparecer os casos no Caribe, ficamos em alerta por causa do intercâmbio de pessoas e da quantidade de brasileiros que vão para essa região em lua de mel ou para passar as férias”, explica professor Granato.

Além do fluxo de turistas em países das Américas, em particular do Caribe, a acelerada expansão da indústria de materiais não biodegradáveis, o aquecimento global e a urbanização desordenada em nações em desenvolvimento também podem ser apontados como causas da disseminação da doença, especialmente as duas últimas, que viabilizam a consolidação de criadouros do mosquito.

Eliminando os mosquitos

A exterminação dos focos do Aedes aegypti ainda é considerada a melhor forma de prevenção contra o Chikungunya, mas cientistas já vêm trabalhando no desenvolvimento de outras técnicas que poderão ser usadas futuramente contra o mosquito, entre elas, uma testada recentemente no combate ao vírus da dengue.

Em um teste realizado por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz, mosquitos Aedes aegypti portadores da bactéria Wolbacgia, que impede a transmissão do vírus da dengue, foram soltos no bairro Tubiacanga, no Rio de Janeiro.  A ação dessa bactéria já tinha começado a ser pesquisada por cientistas australianos em 2006, e em 2011 por estudiosos indonésios e vietnamitas.

Os ovos dos mosquitos com o microorganismo vieram da Austrália para que uma colônia brasileira fosse criada nos laboratório da Fiocruz. O projeto prevê que 10 desses insetos sejam soltos semanalmente durante um período de 4 meses, para que os pesquisadores possam avaliar se eles são capazes de se estabelecer e se reproduzir.   

Mas enquanto os cientistas estudam a implementação de métodos biológicos para conter a propagação do vírus, o governo começa a avaliar o uso de ferramentas sociais para incentivar a população a contribuir no combate à doença.

O secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Jarbas Borba, informou no início de setembro que campanhas de prevenção, como a iniciativa do Dia D de Mobilização, serão retomadas ainda este ano como forma de conscientizar as pessoas quanto à importância da eliminação dos focos do mosquito.

Outra ferramenta que também vem sendo estudada pelo governo é a ampliação do número de municípios que participarão da realização do Levantamento Rápido do Índice de Infestação por Aedes aegypti, índice que mede a presença do mosquito transmissor da Febre Chikungunya. O levantamento, que hoje é feito em 1,8 mil municípios, deverá ser realizado em duas mil comunidades.

O controle vetorial já entrou em vigor, em Feira de Santana e Oiapoque, locais onde foram registrados os 16 casos autóctones da Febre Chikungunya, na tentativa de impedir a transmissão do vírus a partir dessas cidades. O pesquisador Pedro Fernando da Costa garante que, embora não haja uma grande quantidade de laboratórios capazes de fazer o diagnóstico pelo fato de a Febre Chikungunya ser  “uma doença exótica”, “a vigilância está ativa” .

“Os estados e o governo federal, através da Secretaria de Vigilância em Saúde, têm feito todos os treinamentos e dado todas as orientações no sentido de tentar evitar a disseminação do vírus no Brasil [...] Estamos descentralizando para que o diagnóstico seja feito no próprio estado”.

Foto: Arte Terra

Fonte: Terra
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