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SP: protestos no centro e na periferia mostram diferença em demandas

27 jun 2013 - 07h56
(atualizado às 08h15)
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Cartazes levados à manifestações na avenida Paulista e no Capão Redondo mostram diferenças em demandas
Cartazes levados à manifestações na avenida Paulista e no Capão Redondo mostram diferenças em demandas
Foto: Fernando Borges/Terra/Alice Vergueiro / Futura Press

Enquanto entre muitas bandeiras e camisetas do Brasil os manifestantes que tomaram a avenida Paulista e outras importantes vias de São Paulo nas últimas semanas exibiam cartazes exigindo a rejeição da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 37,  o “fim da corrupção” e “mais saúde e educação”, moradores da periferia da capital paulista que também decidiram sair às ruas para reivindicar seus direitos traziam outras bandeiras. Com propostas mais voltadas à realidade local, muitos dos presentes nesses atos pediam desde o controle do preço do aluguel a mais corredores para “motoqueiros” na cidade.

Mesmo sendo parte de um movimento que tomou as ruas inicialmente contra o reajuste da tarifa do transporte público e depois cresceu e ampliou seu espectro para diversas insatisfações do brasileiro, os protestos registrados nas últimas semanas deixaram evidentes diferenças de demandas entre os moradores da periferia de São Paulo e os demais manifestantes que saíram às ruas na capital paulista, segundo o professor de Ciências Políticas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Roberto Romano. 

 

Enquanto os manifestantes que fizeram parte dos maiores protestos em São Paulo - em locais como avenida Paulista, avenida Brigadeiro Faria Lima e centro da cidade - variavam suas reivindicações com temas mais relacionados à propostas de projetos parlamentares e problemas no governo federal, como a derrubada da PEC 37 - que retira o poder de investigação do Ministério Público -, a corrupção, o aumento na tarifa do transporte público, o Ato Médico (que regulamenta os limites de atuação dos profissionais de Medicina), o Estatuto do Nascituro, apelidado de “bolsa estupro”, o projeto chamado de “cura gay” e também a saída do poder de políticos como a presidente Dilma Rousseff e o presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL), na periferia paulistana a pauta era também diversificada, porém mais local.

Distante da atenção da grande maioria dos moradores de São Paulo, habitantes do Capão Redondo fizeram uma manifestação na região pedindo, entre outras demandas, fim das remoções arbitrárias, controle do valor dos aluguéis, fim de ações policiais truculentas, controle da violência, escala móvel de salários por conta da alta na inflação, corredores para motocicletas, e reforma urbana; problemas enfrentados pelas populações mais carentes, que muitas vezes ocupam áreas inutilizadas de propriedade privada, onde moram sem estrutura básica, como saneamento, abastecimento e transporte, e sentem mais o peso da alta dos preços no seu orçamento. 

“Eles (moradores da periferia) saem de casa para trabalhar às 3h, pegam um transporte público caro e precário para chegarem ao trabalho, voltam para casa na mesma situação, têm medo da polícia, têm medo do bandido, não veem o que pagam em imposto retornar para eles. É claro que a pauta de reivindicação é mais local, menos global”, disse o professor da Unicamp.

Para Romano, apesar de ter demonstrado à toda população brasileira que a união popular é capaz de fazer com que as demandas da população sejam atendidas pelos governantes, as demandas dos maiores protestos, “com maior adesão da classe média”, não são as mesmas e não chegam à periferia paulista, “mais segregada que em outras capitais”. “As cidades brasileiras nunca obedeceram uma lógica de planejamento. A própria palavra ‘periferia’ explica esse fenômeno (da diferença de demandas nas classes sociais)”, analisou o professor.

Organizados pelos movimentos sociais Periferia Ativa e dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), dois atos, um no Campo Limpo e outro no Capão Redondo, na zona sul da capital paulista, tiveram apoio do Movimento Passe Livre, que promoveu os protestos contra o reajuste das tarifas de transporte público, ato que deflagrou a onda de protestos que se espalhou por São Paulo e pelo País. 

"Esse movimento de manifestações que tem ocorrido no Brasil é importante por abrir um canal de comunicação com os governos. A presidente Dilma, nos dois primeiros anos de governo, passou sem receber os movimentos sociais", considerou um dos integrantes do MPL, Caio Martins. “É importante que se tenha diálogo do poder com a representação social, que as ações sejam tomadas através desse contato, como no orçamento participativo (sessões plenárias em que a comunidade decide onde serão feitos os investimentos), por exemplo”, afirmou Romano.

Para Maria do Socorro Souza Braga, professora do Departamento de Ciências Política da Universidade de São Paulo (USP), apesar de trazer demandas mais localistas, a manifestação nessas áreas periféricas têm importância por demonstrar a compreensão por parte do povo de que, organizado, pode atingir seus objetivos. “A sociedade brasileira é muito estratificada, diferente, é natural que haja uma variedade de reivindicações”, analisou. 

“Não considero as demandas (na periferia) localistas. Elas são mistas”, disse Braga. “As manifestações tiveram maior adesão da classe média, que tem suas demandas. Muitas dessas demandas também estão na pauta dos protestos na periferia, que também traz suas próprias, por conta da inexistência ou ineficiência do Estado, do poder público, nessas áreas.”

Embalados pelas conquistas dos protestos, como as ações anunciadas pelo governo federal e a redução da tarifa do transporte público em São Paulo, manifestantes na região do Capão Redondo carregavam cartazes exaltando a força do povo. “Agora é poder popular”, diziam várias faixas levadas ao ato. 

Protestos contra tarifas mobilizam população e desafiam governos de todo o País

Mobilizados contra o aumento das tarifas de transporte público nas grandes cidades brasileiras, grupos de ativistas organizaram protestos para pedir a redução dos preços e maior qualidade dos serviços públicos prestados à população. Estes atos ganharam corpo e expressão nacional, dilatando-se gradualmente em uma onda de protestos e levando dezenas de milhares de pessoas às ruas com uma agenda de reivindicações ampla e com um significado ainda não plenamente compreendido.

A mobilização começou em Porto Alegre, quando, entre março e abril, milhares de manifestantes agruparam-se em frente à Prefeitura para protestar contra o recente aumento do preço das passagens de ônibus; a mobilização surtiu efeito, e o aumento foi temporariamente revogado. Poucos meses depois, o mesmo movimento se gestou em São Paulo, onde sucessivas mobilizações atraíram milhares às ruas; o maior episódio ocorreu no dia 13 de junho, quando um imenso ato público acabou em violentos confrontos com a polícia.

O grandeza do protesto e a violência dos confrontos expandiu a pauta para todo o País. Foi assim que, no dia 17 de junho, o Brasil viveu o que foi visto como uma das maiores jornadas populares dos últimos 20 anos. Motivados contra os aumentos do preço dos transportes, mas também já inflamados por diversas outras bandeiras, tais como a realização da Copa do Mundo de 2014, a nação viveu uma noite de mobilização e confrontos em São PauloRio de JaneiroCuritibaSalvadorFortalezaPorto Alegre e Brasília.

A onda de protestos mobiliza o debate do País e levanta um amálgama de questionamentos sobre objetivos, rumos, pautas e significados de um movimento popular singular na história brasileira desde a restauração do regime democrático em 1985. A revogação dos aumentos das passagens já é um dos resultados obtidos em São Paulo e outras cidades, mas o movimento não deve parar por aí. “Essas vozes precisam ser ouvidas”, disse a presidente Dilma Rousseff, ela própria e seu governo alvos de críticas.

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Fonte: Terra
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