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Prefeito de Tamandaré pode responder por outro crime na morte do menino Miguel

A mãe do garoto, que morreu ao cair de um prédio, está cadastrada como servidora pública da prefeitura municipal desde 2017

5 jun 2020 - 14h32
(atualizado às 16h41)
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RECIFE - O prefeito de Tamandaré, no litoral sul de Pernambuco, Sérgio Hacker (PSB), pode responder por um outro crime no caso da morte de Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, que morreu ao cair do nono andar de um prédio, em condomínio no bairro de São José, no Recife, na última terça-feira.

Após a repercussão do caso, veio à tona a informação de que a empregada doméstica Mirtes Renata Santana de Souza, mãe do garoto e que trabalhava para Sari Corte Real, mulher do prefeito, está cadastrada no Portal de Transparência de Tamandaré, desde 1º de fevereiro de 2017, como servidora pública da prefeitura municipal.

Governador de Pernambuco promete investigação 'mais breve possível' sobre morte de Miguel
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Foto: Reprodução/Instagram / Estadão

De acordo com o documento, consta que a funcionária exercia o cargo comissionado (sem carga horária específica) de gerente de divisão, locada na Manutenção das Atividades de Administração da cidade pernambucana. O pagamento seria equivalente a um salário mínimo. Mirtes disse que não sabia do cargo e que trabalhava apenas na casa dos patrões, segundo o Portal UOL.

O Tribunal de Contas do Estado informou, nesta sexta-feira, 5, que instaurará uma auditoria especial para apurar os fatos junto à prefeitura de Tamandaré. "Após a fiscalização, constatada a veracidade dos fatos, o gestor poderá ser implicado em crime de responsabilidade e infração político administrativa", afirma a nota divulgada à imprensa. Neste momento, a auditoria já foi autorizada pelo relator de contas do município.

O Tribunal explicou, ainda, que o prefeito e possíveis pessoas implicadas na ação devem ressarcir os cofres públicos com a quantia recebida, caso se confirme a ilegalidade no pagamento por serviços não prestados. O prefeito de Tamandaré e Mirtes Renata Santana de Souza, que trabalhava como empregada doméstica para a família Hacker Corte Real, não se pronunciaram sobre o assunto até o fechamento deste texto.

Investigação

Na quinta-feira, o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), afirmou que a investigação deve ocorrer o "mais breve possível".

Sari Corte Real chegou a ser autuada por homicídio culposo, quando não há intencionalidade de matar, mas pagou R$ 20 mil em fiança para responder ao inquérito em liberdade. Em nota, o prefeito comentou que está "profundamente abalado" e que deve prestar contas aos órgãos competentes. O Partido Socialista Brasileiro não se pronunciou sobre o assunto.

De acordo com a Polícia Civil, Miguel Otávio caiu do prédio onde moram a primeira-dama e o prefeito de Tamandaré depois de a moradora apertar um botão no elevador e deixar a criança sozinha no equipamento; imagens do circuito de segurança do condomínio confirmam essa versão. Ao desembarcar no nono andar, o menino despencou de uma área sem tela de proteção. No momento, a mãe da criança passeava com o cachorro da patroa e encontrou o filho praticamente sem vida.

Até o momento, a Polícia Civil sustenta que a morte da criança, em decorrência de queda, em altura de aproximadamente 35 metros, foi acidental. Em nota, o órgão afirma que "segue com as investigações" e se pronunciará "após a conclusão do inquérito". O caso também é acompanhado pela Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Estado, que ofereceu apoio psicossocial e jurídico à família, e deve chegar ao Ministério Público de Pernambuco nos próximos dias.

O Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares, entidade ligada às Organização das Nações Unidas, afirma, no entanto, que a morte da criança "não é um acidente". "É uma infeliz demonstração de quanto vale a vida de uma criança se ela for preta e pobre. Atesta que não é digna de atenção e nem de cuidado, pois numa sociedade incrustada de racismo, vidas negras são consideradas matáveis", divulga nota da instituição.

Protestos pedem justiça

A família de Miguel Otávio organiza um protesto para pedir justiça na investigação sobre a morte da criança. O ato está marcado para esta sexta-feira, a partir das 15h, em frente ao edifício Píer Maurício de Nassau, onde o menino morreu. Amanda Kathllen Souza da Costa, sobrinha de Mirtes Renata, afirma que as pessoas precisam "sentir a dor da gente". Ela também pede para que os manifestantes usem, na ocasião, camisa na cor branca e levem cartazes ao prédio.

Entidades da sociedade civil também devem sair às ruas nesta sexta na capital pernambucana. A concentração do ato ocorre às 13h em frente ao Tribunal de Justiça de Pernambuco, no bairro de Santo Antônio. O grupo deve seguir até o edifício Píer Maurício de Nassau para se unir, às 15h, ao ato da família de Miguel.

Entre as entidades que pedem justiça para o caso está o Movimento Negro Unificado, que atua desde 1978 contra o racismo. A coordenadora Marta Almeida explica que o caso é simbólico. "Não tem como mensurar essa dor, não tem como chamar de fatalidade. Como a gente sabe, isso faz parte do racismo estrutural, que coloca, enquanto posição subjugada, nós mulheres negras. Por que, se fosse ao contrário, como seria?", questiona-se.

Em todo Brasil, manifestações cobram justiça na investigação envolvendo a morte de Miguel Otávio. Na internet, um abaixo-assinado, publicado na plataforma Change.org, conta com mais de 1,5 milhões de assinaturas pressionando o inquérito e a condenação da empregadora Sari Corte Real no caso. No Twitter, a hashtag #JustiçaPorMiguel está entre os assuntos mais comentados do dia.

Estadão
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