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Cidades

Mãe de Miguel pede condenação de patroa: "Tirou minha vida"

Defesa de punição consta em carta enviada à imprensa nesta quarta-feira, 10, pelo advogado da mãe do menino

10 jun 2020 - 16h50
(atualizado às 16h55)
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A empregada doméstica Mirtes Renata Santana de Souza, mãe de Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, que morreu na semana passada ao cair do nono andar de um prédio do Condomínio do Edifício Pier Maurício de Nassau, no centro do Recife, escreveu uma carta para a então patroa, Sarí Corte Real, indiciada na morte do menino por homicídio culposo. A carta, que também foi enviada à imprensa na manhã desta quarta-feira, 10, é uma resposta a um pedido de desculpas feito por Sarí anteriormente e enviado à imprensa na última sexta-feira, 5.

No Brasil, 60% dos meninos negros de 5 anos, como Miguel, vivem abaixo da linha da pobreza.
No Brasil, 60% dos meninos negros de 5 anos, como Miguel, vivem abaixo da linha da pobreza.
Foto: Reprodução/Instagram / Estadão Conteúdo

"Eu não recebi qualquer pedido de desculpas. A carta de perdão foi dirigida à imprensa, o que me faz pensar que eu não era destinatária, mas sim a opinião pública com a qual ela se preocupa por mera vaidade e por ser esse um ano de eleição", afirmou Mirtes Renata no início do texto, fazendo referência à prefeitura de Tamandaré, município do litoral sul pernambucano cujo prefeito é o marido de Sarí Corte Real, Sérgio Hacker (PSB).

O texto, que foi escrito com ajuda do advogado Rodrigo Almendra, afirma ainda considerar desumano o pedido de desculpas feito por Sarí: "sabemos que ela não trataria assim o filho de uma amiga. Ela agiu assim com o meu filho, como se ele tivesse menos valor, como se ele pudesse sofrer qualquer tipo de violência por ser filho da empregada". De acordo com o advogado Rodrigo Almendra, a carta foi entregue na manhã desta quarta-feira aos advogados de Sarí Corte Real e, em seguida, enviada à imprensa para informar o posicionamento de Mirtes Renata.

Ainda nesta quarta-feira, 10, o zelador do Condomínio do Edifício Pier Maurício de Nassau, conhecido como Torres Gêmeas, que teria informado à empregada doméstica que alguém havia caído do nono andar, prestou depoimento ao delegado responsável pelo caso, Ramon Teixeira. Nenhum dos dois falou com a imprensa. Segundo a assessoria de comunicação da Polícia Civil de Pernambuco, a instituição só vai se pronunciar ao fim do inquérito policial.

Pedido de desculpas

Na última sexta-feira, 5, a primeira-dama de Tamandaré e ex-patroa de Mirtes Renata, Sarí Corte Real, escreveu uma carta na qual pedia perdão à Mirtes pela morte do seu filho, Miguel Santana, de apenas 5 anos. A carta foi divulgada pelo advogado de Sarí e enviada à imprensa pela assessoria de comunicação de Tamandaré, que fica a cerca de 109 km do Recife. "Sou absolutamente solidária ao seu sofrimento. (...) Te peço perdão".

Na terça-feira, 2, Miguel Santana ficou sob os cuidados de Sarí Corte Real enquanto sua mãe, Mirtes Renata, passeava com a cadela da patroa. O menino, porém, pegou o elevador sozinho e caiu do nono andar do edifício. Imagens mostram que Sarí deixou o garoto no equipamento e apertou o botão de um andar superior. A Polícia Civil investiga a primeira-dama por homicídio culposo.

Leia a carta de Mirtes Renata na íntegra:

SOBRE O PERDÃO PEDIDO POR SARI

Eu não recebi qualquer pedido de desculpas. A carta de perdão foi dirigida à imprensa, o que me faz pensar que eu não era destinatária, mas sim a opinião pública com a qual ela se preocupa por mera vaidade e por ser esse um ano de eleição.

Eu não tenho rancor. Tenho saudade do meu filho. O sentido da vida de quem e´ mãe passa pelo cheiro do cabelo do filho ao acordar, pelo sorriso nas suas brincadeiras, pelo "mamãe" quando precisa do colo e do abrigo de quem o trouxe ao mundo. Uma mãe, sem seu filho, sofre uma crise, não apenas de identidade, como também de existência. Quem sou eu sem Miguel? Ela tirou de mim o meu neguinho, minha vida, por quem eu trabalhava e acordava todos os dias.

Quando eu grito que quero justiça, isso significa que eu preciso que alguém assuma a minha dor, lute minha luta, seja o destilado da cólera que eu não quero e nem posso ser. Eu não tenho forças neste momento, não tenho chão. Não tenho vida!

Após poucos dias é desumano cobrar perdão de uma mãe que perdeu o filho dessa forma tão desprezível. Afinal, sabemos que ela não trataria assim o filho de uma amiga. Ela agiu assim com o meu filho, como se ele tivesse menos valor, como se ele pudesse sofrer qualquer tipo de violência por ser "filho da empregada".

Perdoar pressupõe punição; do contrário, não há perdão, senão condescendência. A aplicação de uma pena será libertadora, abrandará o meu sofrimento, permitirá o meu recomeço e abrirá espaço para o que foi pedido: perdão. Antes disso, perdoar seria matar o Miguel novamente.

Mirtes, mãe de Miguel

(carta escrita com auxílio do advogado constituído)

Estadão
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