Cacique Raoni: 'Se precisar, vou puxar a orelha de Lula' sobre petróleo e Ferrogrão
Uma das vozes mais influentes da floresta amazônica tomou a palavra nesta quarta-feira (12) e advertiu o governo do Brasil: os planos de exploração de petróleo na foz do rio Amazonas e de construção de uma ferrovia para escoar a produção de soja no meio de terras indígenas não podem avançar, disse o cacique Raoni Metuktire.
Lúcia Müzell, enviada especial da RFI a Belém
Aos 93 anos, a liderança indígena participou de um grande protesto de barcos pelo rio Guamá, em Belém. A "barqueata" deu a largada para a Cúpula dos Povos, mobilização da sociedade civil à margem da Conferência da ONU sobre as Mudanças Climáticas (COP30).
"Eu estou acompanhando que o governo quer tirar petróleo aqui na foz do Amazonas. Estou acompanhando que o governo está trabalhando para fazer uma ferrovia para o escoamento da soja perto das nossas terras. Vejo que, cada vez mais, tem desmatamento avançando", comentou, a bordo de uma das embarcações, a Caravana da Resposta. "Se continuarem fazendo essas coisas ruins, nós vamos ter problemas. Não só nós, povos indígenas, como todos vocês", disse. "Há muito tempo eu venho falando isso."
O cacique indicou já ter conversado mais de uma vez com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre os projetos - a última foi na semana passada, junto com o presidente francês, Emmanuel Macron, presente na Cúpula do Clima de Belém.
"Vou falar de novo com o presidente Lula. Vou marcar um encontro com ele e, se precisar puxar orelha do presidente para ele me ouvir, vou fazer isso", avisou, ao responder a uma jornalista. "Ele tem que nos respeitar e garantir o respeito a nós. Eu apoiei o presidente Lula, mas ele tem que me ouvir", reiterou.
Projetos questionados
A três semanas do início da COP30, o Ibama autorizou os testes da Petrobras na margem equatorial do país, a 150 quilômetros da Amazônia. Lula fez forte pressão para que as pesquisas sobre as reservas de petróleo na região fossem liberadas e chegou a dizer que o órgão ambiental transformou o assunto em uma "lenga-lenga".
Já o projeto da ferrovia visa conectar Sinop, no Mato Grosso - epicentro da produção da soja no Brasil - a Miritituba, no Pará, para reduzir os custos de logística do agronegócio. O Ferrogrão está suspenso após uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), que questiona a legalidade das alterações no Parque Nacional do Jamanxim, no Pará, para viabilizar o traçado da ferrovia. A Caravana da Resposta percorreu 3 mil quilômetros da rota da soja, partindo de Sinop.
'Se continuarem, muita coisa ruim vai acontecer'
O cacique Raoni também chamou a atenção para o impacto direto do desmatamento na desregulação do clima no mundo. Ele lembrou que "há muito tempo" vem alertando sobre os riscos da devastação das florestas - que a expansão das fronteiras da soja continua a impulsionar.
"Vocês estão vendo agora muitos furacões, rios secando. É por causa do desmatamento", afirmou. "Quero dar um recado para vocês: se continuarem nesse ritmo, muita coisa ruim vai acontecer. Nós estamos tendo muito calor, rios secando, inclusive esse rio onde nós estamos poderá secar também."
A Cúpula dos Povos vai reunir cerca de 5 mil participantes de movimentos sociais, indígenas e outras organizações da sociedade civil, num total de 1,2 mil entidades de 62 países. Durante cinco dias, eles denunciam as "falsas soluções" promovidas por corporações e governos nas COPs e vão apresentar suas próprias reivindicações e projetos de combate à crise climática.