Após quatro anos, Marcha pelo Clima volta a Belém e leva povos amazônicos às ruas
Milhares de pessoas participam neste sábado (15), em Belém, da Marcha Global pelo Clima, tradicional protesto da sociedade civil nas Conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas. A manifestação marca a volta do protesto pelas ruas, depois de quatro anos em que a a realização do ato foi impedida devido à realização das COPs em países autoritários.
Lúcia Müzell, enviada especial da RFI a Belém
As populações amazônicas estão em peso no trajeto, reivindicando demarcação de terras indígenas, abandono de projetos como a exploração de petróleo na bacia da foz do Amazonas, a hidrovia no rio Tapajós e o Ferrogrão, ambos para facilitar a logística do agronegócio no meio da floresta. As ministras Marina Silva, do Meio Ambiente e Mudança do Clima, e Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas, estavam presentes.
A marcha percorreu 4,5 quilômetros entre o Mercado de São Brás e a Aldeia Amazônica, onde estão concentrados cerca de 3 mil indígenas que participam das atividades da COP30 ou da Cúpula dos Povos, série de reuniões paralelas da sociedade civil.
Uma comitiva de 11 povos indígenas do Acre veio especialmente para a manifestação - como os Kuni Kuin, os Puyanawa, os Shanenawa, os Yura e os Nawa. "Somos homens, mulheres, crianças, quilombolas, pedindo pela justiça social e climática e a demarcação das nossas terras. O presidente Lula tem a oportunidade hoje de demonstrar para o mundo que ele se importa com os povos que há mais de 525 anos resistem aqui no Brasil", afirmou Cristiane Puyanawa. "As pessoas precisam entender que a floresta não é mercadoria e merece respeito. Nossas terras são invadidas por madeireiros e caçadores que derrubam tudo e retiram o nosso alimento", ressaltou.
Lula do alvo
Lula foi alvo de várias faixas de protesto. "Que contradição, tem dinheiro para o agro mas não faz demarcação", diziam os manifestantes. "Se vender a Amazônia, nós paramos o Brasil."
Jorbeson tem esperança de que a pressão da sociedade civil ainda leve o petista a abandonar o projeto de petróleo na Amazônia. "É possível. Pelo que a gente está vendo, tudo está caminhando para essa exploração acontecer, mas acredito que a pressão popular, se for forte, poderá mudar os rumos. Não podemos deixar o bioma amazônico ser destruído", frisou.
"Estamos reivindicando um futuro melhor para todos, que só vai existir com a defesa do meio ambiente. Não existe planeta B", disse a jovem Thuane. "Somos contra toda a exploração dos nossos territórios e a privatização dos nossos rios."
Nas faixas, a denúncia de um agronegócio "destruidor" e que "não resolve a fome". O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra encabeçava o cortejo, seguido por partidos de esquerda, como PT, PC do B e PSTU, e movimentos sociais como o dos Atingidos por Barragens, dos Pescadores e Pescadoras Artesanais e da Soberania Popular na Mineração. "Mudem o sistema, não o clima", lia-se em uma. "Hidrelétrica na Amazônia não é energia limpa", dizia outra.
Muitos também defenderam os palestinos e denunciaram o genocídio em Gaza. "A Amazônia, a Palestina, é pelo clima e contra a chacina", gritavam manifestantes.
Congregações religiosas trouxeram a mensagem de paz e respeito ao planeta Terra. "É a partir da educação popular, a mobilização nos territórios e a aliança nos territórios mais ameaçados que se pode transformar a história do clima e garantir a segurança deles", argumentou o padre Dario Bossi, da Comissão Episcopal para a Ecologia Integral e Mineração da Igreja Católica. "A ONU reconhece a importância da ética e da fé como elemento transformador não só das consciências, como das comunidades e de uma nova sociedade, que precisa ser repensada."
Preocupações com a segurança da COP30
Os arredores do Centro de Conferências da Amazônia, onde acontece a COP30, estavam fortemente policiados, com a presença de militares do exército e da Força Nacional, para proteger o local onde diplomatas e autoridades de 195 países se reúnem para a Conferência da ONU. Durante a semana, dois protestos de indígenas causaram distúrbios no evento e suscitaram preocupações das Nações Unidas quanto à segurança do evento.
Esta é Conferência do Clima que conta com a maior participação de indígenas da história, com 360 credenciados para participar das negociações multilaterais. Mas eles exigem mais: querem um assento próprio na mesa. Também estão aproveitando a ocasião para exigir mais demarcações de terras no Brasil.
Nesta sexta, após a manifestação pacífica de Mundurukus bloquear a entrada da COP30 durante duas horas, o governo federal prometeu acelerar a demarcação de Sawré Muybu e Sawré Ba'pim, no Pará.