Bonner não faz falta? Impressão de esquecimento rápido é provocada por profundas mudanças na TV
A nova dinâmica entre público e personalidades do vídeo, somada à baixa presença digital do âncora, pesa contra ele
William Bonner se despediu do ‘Jornal Nacional’ há apenas 1 mês, mas parece que faz muito mais tempo. Saiu da mira da imprensa e deixou de ser comentado nas redes sociais.
O sucessor na bancada, César Tralli, foi instantaneamente aceito pelos telespectadores.
Essa transição tranquila — sem danos ao telejornal nem estranhamento do público — e o suposto desinteresse por Bonner resultam de diferentes fatores. Todos reforçam o enfraquecimento da TV aberta.
Quem não é visto, não é lembrado
A fama e o prestígio de apresentadores de telejornal estão associados à visibilidade diária. A presença constante no vídeo se torna familiar e renova a confiança.
Com a interrupção dessa rotina, o público naturalmente passa a se vincular a outras vozes.
Hoje, a conexão entre o público e os jornalistas de televisão é mais frágil do que 20, 30 anos atrás. Por isso, a ausência de Bonner, anunciada com antecedência, foi rapidamente assimilada.
A TV aberta está sendo atropelada pela velocidade do digital. Com isso, a permanência na memória coletiva se mostra cada vez mais curta. Uma relação líquida, sem fidelidade nem dependência emocional.
Bonner é gigante, mas o ‘JN’ é maior
No ar desde 1969 e líder absoluto de audiência, o ‘Jornal Nacional’ é uma das marcas mais fortes e respeitadas do país.
Tão poderosa e influente que sobrevive à troca de apresentadores, mesmo no caso do recordista Bonner, que foi âncora por 29 anos.
O telejornal se tornou uma entidade autônoma imune a individualidades e, toda noite, oferece uma experiência reconhecível, quase ritualística, que independe de quem está na bancada.
Âncoras se vão, o ‘JN’ permanece inabalável.
Ao contrário do que aconteceu com o 'TJ Brasil', no SBT, nos anos 1990: não sobreviveu à saída de Boris Casoy, por ser indissociável do âncora que o criou.
Sucessor aprovado antes da troca
O baixo impacto da saída de Bonner tem a ver ainda com a popularidade de Tralli, que já era bem avaliado pelos telespectadores fiéis do jornalismo da emissora.
Mais até do que o antecessor: o novo titular do ‘Jornal Nacional’ agrada da esquerda à direita por ser visto como ‘neutro’ na polarização política.
Não foi contaminado — como ocorreu com Bonner — pelo ódio à Globo de alguns grupos ideológicos.
O fato de a audiência do telejornal não ter sido abalada com a troca reforça a impressão de que o antigo apresentador não faz falta.
Pouco exposto por vontade própria
A percepção de que Bonner ‘sumiu’ também se explica pela atuação dele nas redes sociais: faz poucas postagens no Instagram, desistiu do X (quando ainda era Twitter) e não tem perfil público no TikTok.
Essa presença digital discreta, provavelmente em nome da preservação da privacidade, o torna menos captado pelos algoritmos e fora do fluxo contínuo de conteúdos que alimentam a memória pública.
Diferentemente de César Tralli, que abastece todo dia seus mais de 5 milhões de seguidores na internet com fotos, vídeos e informações.
Por fim, o questionamento mais coerente não é por que Bonner foi tão rapidamente esquecido, e sim como ele conseguiu ser presente e relevante por tanto tempo.
Uma carreira inigualável e um legado que sobreviverá às superficialidades do mundo atual.