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Sem tabu: repórteres da Globo falam de sua homossexualidade

Jornalistas gays usam histórias de amor para combater a homofobia

5 jul 2018 - 14h00
(atualizado em 17/7/2018 às 17h10)
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“A verdadeira liberdade é um ato puramente interior”, escreveu o poeta e dramaturgo italiano Massimo Bontempelli.

Na TV brasileira existem vários repórteres e âncoras homossexuais. Poucos se sentem livres para viver abertamente a sexualidade.

O temor de prejuízo à carreira e previsíveis ataques homofóbicos faz a maioria buscar proteção atrás de silêncios e fachadas.

Aqueles que se recusam esconder quem amam e usufruem a tal liberdade intrínseca geram manchetes por representar exceção e ousadia.

Foi o que aconteceu com Sandro Fernandes, jornalista baseado em Istambul e Moscou. Durante participação no programa GloboNews Em Pauta para comentar a Copa da Rússia, ele disse despretensiosamente ter um namorado belga.

Sandro Fernandes, Nadia Bochi e Pedro Figueiredo: o amor exposto como antídoto contra a homofobia
Sandro Fernandes, Nadia Bochi e Pedro Figueiredo: o amor exposto como antídoto contra a homofobia
Foto: Twitter, nadiabochi.com e Instagram / Reprodução

A repercussão nas redes sociais foi imediata. Um homem falar a respeito de seu relacionamento com outro ainda é um tabu para muita gente. 

Ainda mais se for ao vivo, em rede nacional, com a segurança emocional de quem optou não criar uma caricatura de si mesmo a fim de se sentir mais aceito – ou menos julgado.

Diante do alvoroço online, Fernandes postou um desabafo pertinente no Twitter: “Triste mundo em que citar o meu namorado belga na TV, dentro do contexto do jogo Brasil x Bélgica, cause tanto auê e tanta comoção. Isso tudo apenas prova que ainda precisamos avançar muito no quesito representatividade de minorias”.

Avanço este que depende, entre outras coisas, da atitude de mais pessoas públicas gays. Usar a visibilidade na mídia para argumentar contra a homofobia e a favor da tolerância é imprescindível. A repórter Nadia Bochi, do programa Mais Você, de Ana Maria Braga, fez isso no Facebook.

Em recente post, a jornalista relatou as dores e delícias de se assumir e contextualizou sua descoberta sexual. 

“Me reconheci lésbica numa época em que ser homossexual não tinha nenhum glamour. Não existia beijo gay nas novelas, pelo contrário as lésbicas explodiam junto com os prédios”, contou, fazendo referência ao casal Rafaela (Christiane Torloni) e Leila (Sílvia Pfeifer), eliminado no incêndio de um shopping na novela Torre de Babel, em 1998, pela rejeição da temática gay de acordo com pesquisas de opinião pública feitas pela Globo.

No mesmo texto, Nadia contou andar de mãos dadas com a namorada nas ruas: “Sinto um prazer sem igual quando alguém para a gente no meio de um abraço pra pedir uma foto e ainda pede desculpas por interromper com tanto carinho uma demonstração de amor”.

Consciente de que a maioria dos gays não vive com igual liberdade, a repórter ressalta a importância de seu ato político. “Somos duas mulheres que têm a chance de viver nossa afetividade sem pudores. E se essa realidade ainda não é para todas e todos, é por isso que hoje escolhemos ser vozes reais. Testemunho vivo, necessário e militante! Porque é urgente poder ser tudo que somos, mais do que nunca e sem nenhum direito a menos.”

Outro profissional de destaque na Globo, o repórter Pedro Figueiredo também escolheu ser livre para amar abertamente o namorado. No Instagram, ele registra momentos de cumplicidade entre o casal.

As fotos são acompanhadas de legendas em prol do afeto e contra o preconceito. “Não importa como: amor é amor sempre”, escreveu em uma delas. Em outra postagem, o jornalista destacou uma pichação num muro: “Doença é não amar”.

É notável que, sob o risco de fuzilamento moral na web e nas ruas, um profissional com relevante exposição de imagem na TV sinta-se livre para demonstrar o sentimento pelo companheiro. Ação tão básica e, ao mesmo tempo, tão reprimida pela sociedade brasileira em tempos de absurdo extremismo.

Intolerância que lembra a perseguição sofrida pelo irlandês Oscar Wilde, um dos maiores escritores, poetas e dramaturgos de todos os tempos. Um juiz o condenou a dois anos de prisão em regime de trabalhos forçados tão somente por ser homossexual. 

Na sentença lida no tribunal, o magistrado disse que não adiantava dar “lição de moral” a Wilde, assumidamente gay, porque ele fazia parte de um grupo de pessoas “sem qualquer sentimento de vergonha”.

A condenação aconteceu há mais de 120 anos. Mas as palavras preconceituosas do juiz são repetidas por milhões de pessoas ainda hoje. 

Há um prazer cruel em tentar destruir a felicidade alheia, seja por simplesmente não compreendê-la, ou pelo sentimento controverso que ela provoca no íntimo.

Da obra de Oscar Wilde é possível pinçar uma frase que representa a coragem dos Sandros, Nadias e Pedros, famosos ou anônimos, na defesa da liberdade e da diversidade, e na decisão de amar plenamente: “Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe”

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