Apesar do jeito frágil, Débora Falabella interpreta uma vilã
- Mariana Trigo
- Direto do Rio
Apesar do jeito frágil, visual retrô, pele alva e aparência de biscuit, Débora Falabella sempre imprimiu força e uma certa petulância aos personagens que interpretou. Essa ambivalência traz equilíbrio e imprime personalidade aos constantes papéis de destaque que esta atriz, de 31 anos, coleciona na TV - desde que estreou como a inquieta Antônia em Malhação. De lá para cá, esta mineira de Belo Horizonte colecionou tipos fortes em novelas e minissérie. No entanto, em seus 15 anos de carreira, Débora ainda não havia interpretado uma vilã ou feito qualquer personagem com vertente cômica. Mas, em seu primeiro trabalho após o nascimento da filha Nina, há 10 meses, a atriz volta à TV unindo estas duas características na pele da maquiavélica e ruiva Beatriz, em Escrito nas Estrelas. Na trama de Elizabeth Jihn, a personagem de Débora é aliada da mãe Sofia, de Zezé Polessa, que interpreta uma mulher interesseira e arma todas ao lado da filha.
Voltar a trabalhar em uma novela das seis é bem mais calmo pelo ritmo das gravações. O que parece que não vai ser tranquilo são as armações da Beatriz. "Ela é uma mau-caráter, não vale nada. Mas tem um lado cômico forte para contrabalançar", adiantou.
Em 15 anos de carreira na TV, você nunca interpretou uma vilã. Por que demorou tanto?
Às vezes olho para trás e falo: "nossa, já trabalhei demais!". Acho que já fiz muita coisa e fui deixando a carreira me levar mesmo. Não pintou uma personagem assim antes. Queria muito não só fazer uma vilã, mas uma personagem voltada para a comédia e papéis diferentes do que já tinha feito. Estava sempre na mesma linha de trabalho. É desafiador poder brincar em cena e pirar nas loucuras com uma atriz que também se propõe a isso, como a Zezé Polessa. A gente não improvisa muito no texto, mas nas ações.
Estrear numa vilã cômica traz leveza e ameniza a maldade?
Acho que ameniza mesmo. Foi bom fazer essa primeira vilã na TV dessa forma, porque vilão é um personagem muito pesado, você acaba mexendo com situações mais carregadas. Sei que ela não é uma vilã de novela das oito, como a Flora, da Patrícia Pillar, que se mostrou uma grande vilã (em A Favorita). Ela é malvada, mas joga para o humor, as coisas que ela faz dão errado. A novela tem uma suavidade no núcleo dela.
Onde você buscou referências para essa composição?
Ela me traz possibilidades de brincar. A Beatriz é over em tudo e isso é muito legal porque me lembra a maneira de trabalhar no teatro. Com ela, posso trazer um tom a mais para a TV sem receios. Ela também é uma mulher atual, uma menina fashion victim, mas é uma vilã. Pratica o mal com a mãe. A vejo muito mais como uma vilã de série de TV americana do que como uma vilã clássica do cinema. Sempre que vou fazer uma composição para uma personagem, acabo assistindo a muitos filmes para ter referências. Mas, nesse caso, assisti a muito mais séries que filmes. Ela tem essa pegada de vilã com muito humor.
De que forma ela interfere no início da história?
Ela começa querendo se passar pela mulher ideal para ser a mãe do filho de Daniel (de Jayme Matarazzo), que é primo dela e morreu no acidente. Como já está morando na casa do tio Ricardo (Humberto Martins), que é pai do Daniel, fica perto de tudo que está acontecendo. A mãe dela também mora na casa e as duas funcionam como uma dupla. Falo que quando gravo sem a Zezé, sinto que tem uma metade faltando.
É um bate-bola de vilania?
Exatamente. Elas parecem uma só. Querem se dar bem a todo custo e são fúteis. Só que a Beatriz não é a tal mulher ideal, apesar de sempre ter sido apaixonada pelo Daniel. Ela não fez faculdade, é uma tapada e a mãe fica encobrindo suas falhas. A Beatriz é uma grande mentira, não tem nenhuma das qualidades que o tio quer para ser a mãe do neto dele. Ela surta, fala que vai fazer faculdade de Física Nuclear, não tem noção das coisas, é mal-humorada e só quer saber de roupas e acessórios. Tem uns 26 anos, mas parece uma adolescente e vai fazer tudo para prejudicar a Viviane (de Nathália Dill), que vai trabalhar na casa da família e vai acabar sendo a mãe de aluguel do filho de Daniel. Mas, antes, vai penar muito nas mãos da Beatriz!
O figurino exagerado da personagem parece refletir o perfil da Beatriz. A sua composição passou pela estética dela?
Muito! Na minha cabeça imagino que ela tem um blog e se fotografa todo dia, com diversas roupas porque ela não faz mais nada na vida além de ler revistas de moda e fofoca. Os figurinos dela devem fazer sucesso na novela, mas ela é realmente muito exagerada. Tem uma roupa bonita, mas coloca milhares de acessórios e fica over. Como diz a nossa figurinista, Nathália Duran: "ela quer sempre ser o último grito da moda, mas acaba não sendo porque ela erra, derrapa sempre" (risos).
O centro da trama, além da inseminação com o sêmen de um morto, aborda a vida após a morte com um foco no espiritismo. Como você lida com essa questão?
Sou de uma família católica e sigo os princípios dessa religião. Discordo de algumas coisas do catolicismo, mas nunca me aprofundei no espiritismo. Me interesso por essa religião da mesma forma que sou curiosa por muitas outras. Mas a novela fala de uma coisa maior, do amor além da vida, do elo entre as pessoas. Mas a minha fé está em acordar todos os dias e olhar para o rosto da minha filha Nina, que está com 10 meses. Aí é que está minha espiritualidade. O engraçado é que todo elenco fez laboratório em centro espírita. Eu fui para a Oscar Freire (rua de comércio sofisticado na região nobre da cidade de São Paulo).
A Beatriz não possui o lado engajado de grande parte de suas personagens. Você já tratou de temáticas sociais, como abolicionismo em Sinhá Moça, racismo em Duas Caras e drogas em O Clone. Essas questões são um estímulo extra para aceitar uma personagem?
Essa não tem nenhuma temática, é uma futilidade só! E ser fútil também é um grande estímulo. É uma outra maneira de se ver e brincar com mais distanciamento da realidade. Isso é muito bom num trabalho porque não invade a minha vida como as personagens que me fazem analisar, pensar. Esse respiro é muito bom. Ela arma demais, apronta todas, rouba um anel para dizer que era noiva, se passa de muito boazinha. Digo que ela deve ter feito um cursinho de interpretação porque chora muito, se acaba. Mais que uma vilã, ela é muito mau-caráter. E destrata as pessoas.
Apesar de sua aparência frágil e delicada, sempre atuou em personagens fortes, audaciosas, mesmo as mocinhas mais pacíficas. A que você atribui sempre ser escalada para papéis com atitudes que destoam do seu biotipo?
A minha grande onda como atriz é mostrar tudo o que não sou numa personagem. É representar em todo o sentido da palavra. Nem sempre tenho essa autonomia na tevê, onde a gente precisa trabalhar com o que nos oferecem, na maioria das vezes. Mas, como também trabalho sempre muito em teatro e tevê ao mesmo tempo - o que quero deixar de fazer simultaneamente -, tenho mais oportunidades de me mostrar das formas mais diversas. Percebo que minhas mocinhas também são muito fortes, como a Sinhá, de Sinhá Moça, que está sendo reprisada. Adoro essas personagens de época fortes.
Por quê?
Me identifico muito com tudo que é antigo, desde roupas, músicas, decoração. Toda vez que me pego pensando nos meus gostos, tenho referências de época, como músicas antigas, filmes antigos, roupas que parecem ser antigas. Talvez eu pense que o passado era mais interessante. Adoro as décadas de 50, 60. Me acho muito de época.
Estilo próprio
O grande fascínio de Débora Falabella por figurinos de época e sua constante procura por roupas antigas se transformou em trabalho. Com a amiga e estilista Mariana Aretz, com quem garimpava brechós em busca de acessórios e roupas com um visual retrô. Até que decidiram começar a mandar confeccionar vestidos para uso próprio. E perceberam que os modelos começaram a fazer sucesso entre as amigas. Bastou alguns meses para que Débora logo lançasse a marca Un Vestido Y Un Amor ao lado da amiga. "Não sou estilista. Sou apenas sócia da Mari. Temos uma sociedade e opino na coleção", minimizou a atriz.
Com a crescente procura da marca no blog da confecção na internet, Débora já prepara um site para aumentar as vendas dos vestidos. "De ratas de brechó passamos a ser empresárias. Mas estamos crescendo de forma muito despretensiosa", avisou.
Xodós antagônicos
Diante do rol de personagens de destaque na TV, os dois maiores orgulhos de Débora em sua carreira televisiva têm perfis absolutamente diferentes. O primeiro papel que mais exigiu da atriz e trouxe reconhecimento à sua carreira foi quando esta mineira interpretou a drogada Mel, em O Clone. Cinco anos depois, a atriz encarnou Sarah Kubitschek, mulher do então presidente Juscelino na minissérie JK, em 2006. "A Sarah foi diferente de tudo que eu já tinha feito e a Mel foi meu primeiro grande destaque", orgulhou-se.
Trajetória Televisiva
# Malhação (Globo, 1998) - Antônia.
# Chiquititas (SBT, 2000) - Estrela.
# Um Anjo Caiu do Céu (Globo, 2001) - Cuca.
# O Clone (Globo, 2001) - Mel.
# Um Só Coração (Globo, 2004) - Raquel.
# Senhora do Destino (Globo, 2004) - Maria Eduarda.
# JK (Globo, 2006) - Sarah Kubitschek.
# Sinhá Moça (Globo, 2006) - Sinhá Moça.
# Duas Caras (Globo, 2007) - Júlia.
# Som & Fúria (Globo, 2009) - Sarah.