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'O Ovo de Ouro' narra sensível experiência de judeus que acompanharam execuções

O ator Sérgio Mamberti está no elenco da montagem dirigida por Ricardo Grasson

23 nov 2019 - 09h11
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Revistar os recém-chegados, aguardar enquanto tiram as roupas, conduzi-los para dentro das câmaras de gás e esperar os minutos até que a morte faça silêncio. O relato do judeu Shlomo Venezia é dos mais completos ao retomar a difícil missão do Sonderkommando, grupo especial de judeus responsável pela execução de seus irmãos, na Alemanha nazista.

No mesmo caminho do filme O Filho de Saul, a peça O Ovo de Ouro resgata essa sensível narrativa de guerra e dor na montagem que estreia no Sesc Santo Amaro. "Quando os judeus chegavam aos campos de concentração, os mais fortes e aptos eram escolhidos pelos nazistas para supervisionar a execução dos demais", conta o ator Sérgio Mamberti que interpreta um sobrevivente. Os detalhes contados por Venezia incluem aguardar que todos morram, depois abrir as câmaras, recolher os corpos e prepará-los para a cremação. Em O Filho de Saul, uma criança sobrevive após ser retirada da câmara, mas logo morre, o que desperta o desejo de um Sonderkommando para lhe dar um enterro digno.

Na peça do ator e dramaturgo Luccas Papp, a sobrevivência se impõe como algo relativo, insiste Mamberti. "Qual o sentido de viver testemunhando a morte de seu povo pelas próprias mãos? É um papel ingrato."

Antes de Mamberti dar seu sim para estrelar a montagem dirigida por Ricardo Grasson, outros dois atores de sua geração foram aventados. "Nós mandamos o texto e eles demoraram um pouco para retornar", diz o diretor. "Logo depois que o Sergio confirmou, Fulvio Stefanini e Renato Borghi se manifestaram, todos interessados pela dramaturgia", conta.

Em O Ovo de Ouro, o sobrevivente Dasco Nagy dá entrevista para uma jornalista interessada em escrever sobre o ocorrido. As memórias do veterano invadem a cena para retratar o difícil período. Ambientado nos anos 1940, a peça de Papp se apoia na estrutura de um dramaturgia tradicional, mas ele coloca sua mira nos tempos atuais. "Exercer o poder sobre o outro e oprimir sempre esteve na história da humanidade. Nesse caso, a atuação de Hitler acabou moldando a sociedade alemã e deixou sua marca profunda, que ainda permanece", conta o autor. Completam o elenco, Leonardo Miggiorin, Rita Batata e Ando Camargo.

Ao escolher judeus para cuidar da execução de seu próprio povo, o nazismo não se envolvia diretamente com o massacre. Até o fim desse período, grande parte dos integrantes do Sonderkommando tiveram o mesmo destino. Como queima de arquivo, foram levados para as câmaras de gás. "Shlomo Venezia foi um dos sobreviventes porque estava quase no fim do regime. Nessa época, muitos judeus foram transferidos e ganharam proteção", diz Grasson.

Ao encontrar o relato dos Sonderkommando, Papp percebeu que além de uma narrativa com aspecto dramático, algo caro ao teatro, a peça também poderia traçar paralelos e ultrapassar um recorte histórico. "Um texto é político quando consegue traçar paralelos com o momento atual. Perseguições e guerras santas, além de violência a grupos específicos são ações semelhantes. Não é difícil ver que todos os dias no Brasil há um pequeno holocausto."

O Ovo de Ouro já garantiu mais duas temporada e deve estrear em teatros do centro da cidade e viajar pelo interior do Estado, com datas a confirmar.

SERVIÇO. O OVO DE OURO. SESC SANTO AMARO. RUA AMADOR BUENO, 505. TEL.: 5541-4000. 5ª E 6ª, 21H; SÁB., 20H; DOM., 18H. R$ 15 / R$ 30. ATÉ 15/12.

Estadão
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