Decifrando vidas pelo DNA: como o médico Paulo Victor Zattar Ribeiro transforma a genética em esperança
Geneticista e fellow em oncogenética brasileiro fala sobre sua trajetória transformando diagnósticos complexos em acolhimento e como acredita que "a genética é uma bússola" para milhares de pessoas sem respostas.
Em uma realidade onde a medicina frequentemente se apoia em números e estatísticas, o médico geneticista e fellow em oncogenética Paulo Victor Zattar Ribeiro constrói sua carreira sobre um pilar igualmente importante: a sensibilidade. Natural de Joinville e radicado em Ribeirão Preto, Paulo é um dos cerca de apenas 400 geneticistas atuando no Brasil, um número que deveria ser cinco vezes maior para atender adequadamente à demanda do país. Mesmo ainda considerado uma especialidade recente e pouco difundida, a genética já transforma a vida de pacientes que buscam respostas após anos de incertezas.
A trajetória do Dr. Paulo é entrelaçada com um legado familiar médico e uma descoberta pessoal profunda, além de revelar como a genética médica é, acima de tudo, uma especialidade de esperança e acolhimento. "O que mais me encantou na genética foi a possibilidade de fazer a diferença em doenças raras, muitas vezes em pacientes que passaram anos sem respostas. Acredito que a genética é o futuro da medicina porque nos permite sair de uma lógica coletiva e enxergar cada paciente como único", afirma o médico.
Apesar de ter sido criado em uma família de médicos, sendo irmão e filho de pediatras, bisneto do renomado Sadalla Amin Gahnem e cercado por oftalmologistas, Paulo demorou a se enxergar na profissão. Sua sensibilidade falava mais alto. "Desde pequeno eu já sentia vontade de cuidar das pessoas, mas, por ser muito sensível, tinha medo de não lidar bem com o sofrimento. Isso me fez duvidar se a medicina era realmente para mim", relembra.
Mas foi durante a adolescência, inspirado pelo cuidado do pai com os pacientes, que a vocação se tornou inegável. "Aos poucos, percebi que essa sensibilidade, na verdade, poderia ser a minha maior força como médico". O caminho, no entanto, só se iluminou completamente durante o penúltimo ano da faculdade, em uma vivência em Portugal com um médico de oncogenética. Foi nesse período que ele descobriu a genética médica, uma área que une a investigação científica minuciosa ao cuidado humanizado integral.
Genética como uma bússola para pacientes que buscam respostas
Para o Dr. Paulo Victor Zattar Ribeiro, a genética é muito mais do que uma especialidade, é uma ferramenta de direção. Ele relembra de casos que marcaram sua carreira e revelaram o impacto da especialidade. "Nunca vou esquecer do caso da A.B., uma menina de 7 anos que passou três anos indo ao pronto-socorro por dores insuportáveis sem nunca receber um diagnóstico. Após o exame genético, conseguimos identificar a causa e controlar sua dor. Para ela e para a família, foi como encontrar um norte depois de tanto tempo perdida", conta.
Outro caso emblemático e que ganhou repercussão nacional foi o diagnóstico de uma paciente com Síndrome de Moebius, uma condição rara que afeta os nervos responsáveis pelos movimentos faciais e oculares, provocando paralisia e dificuldades motoras. "Foi um dos casos mais marcantes da minha carreira. [...] Conseguir chegar ao diagnóstico e dar visibilidade para o caso foi extremamente gratificante. A repercussão nacional ajudou a mostrar a importância da genética e, principalmente, trouxe luz para muitas famílias que convivem com doenças raras", conta.
Ele mesmo vivenciou o sofrimento por anos em sua pele até chegar em um diagnóstico. "Tenho Hailey-Hailey, uma doença genética de pele, e demorei mais de quatro anos para ter um diagnóstico. Foi só quando procurei uma médica geneticista que encontrei respostas. Por isso, sempre digo que a genética é uma bússola, porque ela dá direção, oferece esperança e transforma o cuidado em algo possível e concreto", afirma Ribeiro.
Uma visão ampliada de cura e avanços da genética
Na prática clínica, o geneticista não aceita a ideia de que o incurável seja sinônimo de desesperança. Por isso, Paulo defende um conceito de cura que transcende a simples eliminação de uma doença. Em uma área onde muitas condições são incuráveis, ele encontra significado no alívio, no acolhimento e na qualidade de vida. "Cura, para mim, vai além da ausência de doença. Na genética, quase nenhuma condição é de fato curável, mas isso não significa desesperança. Cura é oferecer um diagnóstico que finalmente traga alívio, é orientar uma família, é acolher uma dor, é melhorar a qualidade de vida".
Entre os progressos da genética que mais o entusiasmam, Paulo cita três pilares:
• Triagem genética em indivíduos saudáveis: como o carrier screening para casais que querem engravidar, painéis de câncer hereditário e testes moleculares de triagem neonatal.
• Farmacogenômica: que permite escolher medicamentos personalizados de acordo com o DNA de cada paciente.
• Terapia gênica: que oferece opções de tratamento para doenças graves que antes não tinham alternativa.
Seu doutorado também reflete a vocação para unir ciência e impacto social, com pesquisa focada em reprodução humana e menopausa precoce. "Um painel genético pode oferecer diagnóstico preciso, permitir prevenção e até orientar preservação de fertilidade, como congelamento de óvulos. No futuro, pode até se tornar um exame de triagem populacional, ajudando milhares de mulheres a se planejarem", explica o médico.
A democratização do conhecimento
Consciente de que a genética ainda é pouco difundida até entre médicos, Dr. Paulo decidiu investir pesado em educação. Além do atendimento em Ribeirão Preto, Joinville e por telemedicina, ele leva informação a um público ainda maior com o PodRaros, projeto criado ao lado da médica Lisandra Letícia Palaro.
"Criamos o PodRaros com a missão de democratizar o conhecimento sobre genética e doenças raras. [...] A resposta do público tem sido emocionante, mostrando que estamos alcançando pessoas que se sentiam invisíveis e que agora encontram informação, esperança e pertencimento", relata.
A proposta do podcast é tornar a genética acessível e próxima das famílias que convivem com síndromes raras. Para o geneticista, difundir esse conhecimento também entre médicos de outras áreas é fundamental. "Precisamos colocar a genética em pauta de forma ampla, não apenas dentro da academia, mas também em espaços de divulgação. Quanto mais a genética for discutida fora do círculo restrito da especialidade, mais ela será incorporada ao cotidiano clínico e mais cedo os pacientes chegarão ao diagnóstico e ao acompanhamento adequado."
Para sustentar a rotina intensa da clínica e do meio acadêmico, Paulo busca equilíbrio com o esporte. Praticante de tênis, surfe e mergulho, ele vê essas atividades como parte essencial do seu autocuidado. "O mergulho é o meu esporte favorito porque me permite desconectar completamente da rotina, entrar em um mundo silencioso, contemplativo e cheio de beleza", conta.
Com dezenas de publicações científicas e participações em congressos nacionais e internacionais, ele projeta os próximos passos sem perder de vista o propósito que o move. Então, deixa uma mensagem para pacientes e famílias: "Eu vejo vocês. Eu vejo a força de cada mãe que estuda para entender o diagnóstico raro de um filho, o pai que não desiste diante das dificuldades e a coragem de cada criança que enfrenta procedimentos sem perder o brilho no olhar. [...] A genética não é apenas sobre exames, mas sobre cuidado, acolhimento e esperança. Meu compromisso é seguir caminhando ao lado de vocês, para que cada jornada seja mais leve, com mais equidade, acesso e dignidade."