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Lava Jato planejou investigar Gilmar Mendes, apontam mensagens

Diálogos revelam que Deltan Dallagnol cogitou acionar investigadores da Suíça para tentar obter provas para impeachment de magistrado

6 ago 2019 - 18h49
(atualizado às 19h52)
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Diálogos atribuídos a procuradores da Operação Lava Jato em Curitiba, obtidos pelo The Intercept Brasil e publicados nesta terça-feira pelo jornal El País, sugerem que os integrantes da força-tarefa planejaram buscar provas e informações contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, para afastá-lo de processos e até do cargo.

As mensagens mostram que, liderados pelo procurador Deltan Dallagnol, os integrantes da Lava Jato tramaram acionar investigadores na Suíça para tentar coletar documentos que comprometessem Gilmar Mendes, além de averiguar decisões do ministro para fundamentar a ofensiva. A estratégia contra o ministro foi debatida ao longo de meses pelo grupo.

Ministro Gilmar Mendes participa de sessão no STF.
Ministro Gilmar Mendes participa de sessão no STF.
Foto: Adriano Machado / Reuters

Desde 2017, Dallagnol expressava no grupo de procuradores o desejo do impeachment de Gilmar Mendes, alegando que o ministro queria "desmontar as investigações de corrupção". As mensagens revelam que ele buscava sistematicamente alguma forma para afastar o magistrado das ações da operação. "Sonho que Toffoli e Gilmar Mendes acabem fora do STF rsrsrs", afirmou em abril de 2017.

Em maio de 2017, Dallagnol chegou a cogitar ele mesmo entrar com um pedido de impeachment contra o ministro, caso ele concedesse um habeas corpus a Antonio Palocci. Os outros procuradores, porém, não apoiaram a ideia e argumentaram que seria melhor que o pedido não fosse feito pelos integrantes da Lava Jato.

Ao longo dos anos, o procurador mobilizou assistentes para apurar decisões e acórdãos do ministro para um eventual processo. "Pede pros estagiários pegarem e gerarem arquivos para todos os casos em que Gilmar Mendes negou liminar e indeferiu HC [habeas corpus] para revogar prisões desde 2014", solicitou a um assessor em setembro de 2018. "O propósito é mostrar eventuais incongruências com os casos da Lava Jato. Faz tempo que já devíamos ter feito isso", acrescentou.

Após a terceira prisão de Paulo Preto, apontado como operador financeiro do PSDB, em fevereiro deste ano, os procuradores da Lava Jato planejaram entrar em contato com investigadores na Suíça para tentar rastrear uma ligação entre o detido e Gilmar Mendes e buscar assim a suspeição do ministro ou até mesmo seu impeachment.

O magistrado já havia concedido dois habeas corpus em favor de Paulo Preto e os procuradores suspeitavam que o ministro poderia ser beneficiário de contas e cartões que o operador possuía na Suíça. Esse material estava sendo analisado por investigadores europeus. "Tem o boato de que parte do dinheiro fora era do Gilmar Mendes", escreve Dallagnol.

Ao longo do diálogo, Dallagnol sugere a ampliação do pedido de cooperação com a Suíça. O procurador Roberson Pozzobon respondeu que a solicitação já foi feita e comenta que poderia aparecer Gilmar Mendes como beneficiário do operador.

Ministro Gilmar Mendes durante sessão do STF.
Ministro Gilmar Mendes durante sessão do STF.
Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

"Você estará investigando ministro do supremo, robinho.. não pode. rs", responde em seguida o procurador Athayde Ribeiro. "Ahhhaha. Não que estejamos procurando. Mas vai que", disse Pozzobon.

A legislação proíbe que procuradores de primeira instância, como os da Lava Jato, investiguem ministros do STF. Segundo a Constituição, a investigação de um magistrado do Supremo requer uma autorização da própria Corte e só pode ser realizada pelo procurador-geral da República.

Gilmar Mendes não foi o único alvo de Dallagnol e de seus colegas no STF. Mensagens reveladas pela Folha de S.Paulo sugerem que o coordenador da Lava Jato incentivou um inquérito contra Dias Toffoli, que era visto como um adversário disposto a frear o avanço da operação.

Ao ser questionada sobre a tentativa de investigação de Gilmar Mendes, a força-tarefa de Curitiba repetiu ao El País que não reconhece as mensagens divulgadas desde junho e alegou que o material seria editado ou estaria fora do contexto "para embasar acusações e distorções que não correspondem à realidade".

Já Gilmar Mendes afirmou que está na hora da Procuradoria-Geral da República (PGR) tomar uma providência sobre o caso. "Tudo indica, à medida que os fatos vão sendo revelados, que nós tínhamos uma organização criminosa para investigar. Portanto, eles [procuradores] partem de ilações absolutamente irresponsáveis", destacou.

O ministro criticou ainda a gestão da PGR, defendeu a indicação de alguém que dê credibilidade para substituir a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, cujo mandato acaba em setembro, e afirmou que acredita que haverá mais surpresas em relação ao vazamento. "Temos que reconhecer que as organizações Tabajara estavam comandando também esse grupo [de investigadores]", disse.

O ministro da Justiça, Sergio Moro, e membros da Lava Jato estão envolvidos num escândalo que começou em 9 de junho, quando o Intercept e outros veículos parceiros começaram a divulgar reportagens que colocam em questão a imparcialidade da maior operação contra a corrupção no país.

As apurações apontam que Moro teria orientado procuradores da Lava Jato, indicado linhas de investigação e adiantado decisões enquanto era juiz responsável por analisar os processos do caso em primeira instância.

A Constituição determina que não haja vínculos entre juiz e as partes em um processo judicial. Para que haja isenção, o juiz e a parte acusadora - neste caso, o Ministério Público - não devem trocar informações nem atuar fora de audiências. Se confirmadas, as denúncias indicam uma atuação ilegal do antigo magistrado e dos procuradores.

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