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Governo Lula está 'de mãos amarradas' com PL da dosimetria, diz analista político

Palácio do Planalto tem 'pouco espaço de manobra' com o PL da dosimetria, avalia analista político.

10 dez 2025 - 14h51
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Governo Lula tem 'pouco espaço de manobra' com a PL da dosimetria, avalia analista político
Governo Lula tem 'pouco espaço de manobra' com a PL da dosimetria, avalia analista político
Foto: EPA / BBC News Brasil

O avanço no Congresso do projeto de lei da dosimetria — que altera as penas de prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros condenados por tentativa de golpe de Estado — deixa o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de "mãos amarradas", na avaliação do analista político Creomar de Souza, sócio-fundador da consultoria Dharma e professor da Fundação Dom Cabral.

Para ele, o governo foi um dos principais perdedores com a aprovação do projeto de lei na Câmara dos Deputados na madrugada desta quarta-feira (10/12) — já que a plataforma do presidente Lula tem sido se ôpor a qualquer tipo de flexibilização das penas dos envolvidos na invasão de Brasília de 8 de janeiro de 2023.

Lula teria teoricamente o poder de vetar o PL da dosimetria — mas Souza acredita que qualquer veto acabaria derrotado pelo Centrão, provocando ainda mais desgaste ao governo.

"O Centrão sempre vence", disse o analista em entrevista à BBC News Brasil nesta quinta-feira (10/12).

Na sua avaliação, o bolsonarismo também teve uma vitória parcial — apesar de ainda não ter conseguido seu objetivo principal, que é uma anistia total.

O analista afirma que o governo se vê agora com as mãos amarradas — sem poder derrubar o projeto de lei da dosimetria, e precisando aceitar as decisões que vêm do Legislativo, hoje controlado pelo Centrão.

O texto foi aprovado pelo Plenário com 291 votos. Votaram contra 148 parlamentares. O chamado PL da Dosimetria segue agora para o Senado, onde será relatado pelo senador Esperidião Amin (Progressistas-SC).

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Otto Alencar (PSD-BA), disse que há um acordo para a PL da dosimetria ser votada na próxima semana dentro da comissão, e em seguida, no mesmo dia, ser apreciada pelo Plenário.

A nova regra prevista no projeto de lei faz com que as penas por dois crimes — golpe de Estado e abolição do Estado democrático de direito — não sejam mais somadas. Passa a prevalecer apenas a pena maior, para tentativa de golpe de Estado, de 4 a 12 anos. Com isso, as penas totais de Bolsonaro e dos demais condenados no julgamento de setembro seriam reduzidas.

Deputados alinhados ao governo tentaram retirar o projeto da pauta da Câmara na terça, mas sua solicitação para isso foi derrotada por 294 votos a 146.

Confira abaixo trechos da entrevista com Cremoar de Souza.

BBC News Brasil - O senhor tem alguma avaliação política de quem sai ganhando e perdendo com o avanço da PL da dosimetria?

Creomar de Souza - Eu acho que quem sai perdendo é o governo do ponto de vista político, porque o governo teoricamente construiu um pedaço da sua plataforma em torno da ideia de que não deveria haver nenhum tipo de flexibilização com relação aos envolvidos no 8 de janeiro.

Eu acho que perde também a própria posição do Supremo Tribunal Federal, que é parte negociadora da transformação pelo Paulinho da Força [do projeto] de anistia em dosimetria.

Mas é preciso levar em consideração o contexto dessa aprovação. É uma semana em que o STF está na defensiva, tentando lidar com os estragos do Banco Master e os impactos disso sobre a figura do ministro Dias Toffoli. E isso tem um impacto político.

Em termos de quem vence, eu creio que o grande vencedor é o Centrão. O Centrão sempre vence. Porque em algum sentido vem um desenho que atende aos interesses eleitorais do Centrão.

E para o bolsonarismo, cuja pauta gira em torno de transformar a eleição de 2026 em um plebiscito sobre Jair Bolsonaro e seu legado, não me parece ruim o avanço da dosimetria, porque eles ganham alguma coisa. Antes não se tinha nada.

BBC Brasil - Quais as opções para o presidente Lula agora? Ele pode vetar a PL da dosimetria, mas corre o risco de ver seu veto ser derrubado.

Souza - Eu acho que o governo pode fazer muito pouco. Porque se o presidente vetar, o veto vai cair. Essa é uma legislatura que tem derrubado muitos vetos presidenciais, inclusive vetos em que o governo se engaja na ideia de que eles efetivamente sejam derrubados.

O espaço de manobra é muito pequeno, tendo em vista a conjuntura eleitoral próxima.

É óbvio que, do ponto de vista de agregação de militância, o governo pode optar por um veto, mas isso vai ser efetivamente pouco eficaz. A expectativa acaba se debruçando dentro de um padrão que a gente identificou aqui na Dharma, que seria dessa espécie de presidencialismo jurisdicional — uma coalizão informal entre a presidência e o STF.

Mas tendo em vista o fato de que na atual conjuntura o governo está mal com a Câmara, está mal com o Senado e tem uma questão da necessidade de tentar aprovar um nome à feição do presidente, que seria do Jorge Messias para o STF, fica meio uma situação de mãos amarradas, em que vai se esperar efetivamente, como a Suprema Corte vai ler a decisão.

BBC News Brasil - Vale a pena para o governo comprar essa briga da dosimetria? Um cálculo possível é que, para o governo, é melhor haver dosimetria do que anistia. Então se a dosimetria ajudar a enterrar os pedidos por anistia, poderia haver uma vantagem para o governo.

Souza - Eu acho que se o governo for muito pragmático, ele pode fazer esse mesmo cálculo que você expôs — de que a dosimetria resolve a questão e vamos embora.

O problema é que, ao mesmo passo que eu não considero que esse governo é hiper pragmático nesse nível, tem os embates da própria narrativa política pensando o ano eleitoral.

E aí existe um elemento gerador de confusão nesse processo, que é a leitura que o bolsonarismo vai fazer caso o governo abra mão de qualquer tipo de embate. Porque eu acho que o bolsonarismo ainda seguirá gritando, dizendo "olha, avançamos a dosimetria que prova o nosso ponto, mas a gente quer anistia, porque a turma é inocente".

E nessa dinâmica, se o governo der um sinal muito expresso de fraqueza ou de concessão, ele alimenta o discurso sem ganho eleitoral.

Do outro lado, se ele criar um discurso que gera alguma resistência, ele pode fazer um movimento que o afaste ainda mais do Legislativo, mas ele pode trabalhar com horizonte futuro de uma possibilidade de vitória eleitoral ou de ganho eleitoral no curto prazo.

Acho que esses dilemas vão estar na mesa. Seria irresponsável da minha parte tentar prognosticar o que o governo vai fazer.

Mas o que a gente tem visto de padrão é que o governo normalmente está oscilando esse entre esses dois lados, porque é fruto também da própria dificuldade na tomada de decisão do governo.

BBC News Brasil - Diz-se que parte do Centrão não quer a candidatura de Flávio Bolsonaro à Presidência, preferindo outros candidatos para a direita. Com a aprovação da dosimetria, o Centrão poderia negociar para que Flávio desista de sua candidatura?

Souza - Eu acho que a liberdade de Jair Bolsonaro é algo que a família coloca na mesa em qualquer processo de negociação ou transferência de apoio. Era assim com o Bolsonaro na prisão domiciliar. É assim com a presença do Flávio.

O que me levaria a ter um pouco mais de cautela é observar os desdobramentos da apreciação. O texto vai ainda ao Senado Federal. Ele vai ter uma relatoria que é do Esperidião Amin. O Esperidião Amin tem um interesse óbvio de ficar nas boas graças do bolsonarismo, porque ele é candidato à reeleição ao Senado.

E deve ter uma disputa entre ele e a Carol De Toni [deputada federal pelo PL-SC] para ver quem fica com a segunda vaga [ao Senado], mantidas as condições de que o Carlos [Bolsonaro] saia candidato ao Senado por Santa Catarina.

Então acho que isso é uma parte do cálculo.

Do ponto de vista nacional, a perspectiva da família Bolsonaro de aprovação do texto pode fazer com que o Flávio, em algum sentido, dê um passo para trás — caso se faça algum tipo de arranjo para uma composição de uma chapa que fique mais à feição do Centrão, mas que não coloque o bolsonarismo em uma condição hiperperiférica.

E aí, eu acho que para o bolsonarismo, quanto mais tarde vier essa solução, melhor será para se reter capital político.

Lembrando a decisão do PT e do Lula pelo [lançamento da candidatura de] Haddad em 2018. Se segurou o máximo possível [a candidatura de Haddad] para que o nome do Lula continuasse sendo falado.

Não importa o fato de Bolsonaro não ser candidato. O importante é fazer com que a eleição seja o máximo possível sobre o Bolsonaro.

Pré-candidatura de Flávio Bolsonaro à Presidência desagradou setores do Centrão
Pré-candidatura de Flávio Bolsonaro à Presidência desagradou setores do Centrão
Foto: Reuters / BBC News Brasil

BBC News Brasil - Como fica a relação do Congresso com o STF? Por um lado, a PL da dosimetria parece ser uma afronta às penas decididas pela Primeira Turma no julgamento de Bolsonaro e demais réus. Mas por outro lado, houve uma reunião com presença do Paulinho da Força, do ex-presidente Michel Temer e do ministro Alexandre de Moraes em que se costurou a ideia de mudar a dosimetria das penas.

Afinal: esse PL é uma afronta do Congresso ao STF ou um acordo?

Souza - Vamos brincar com as palavras: talvez seja um acordo afrontoso (risos) em um momento do jogo político de atrito do Legislativo contra os outros poderes, e em que o Legislativo já derrotou o Executivo.

Eu acho que as emendas orçamentárias são uma prova de que o Legislativo derrotou o Executivo. O Legislativo tem quase tanto dinheiro de emenda parlamentar quanto o governo federal tem de PAC.

A segunda parte do embate é com o Judiciário. E esse embate com o Judiciário, eu acho que tem mais camadas.

Uma camada é o julgamento da constitucionalidade das emendas de orçamentárias pelo Flávio Dino. Uma outra camada é o inquérito das Fake News com Alexandre de Moraes. E uma terceira camada é a eventual permanência em cárcere daqueles envolvidos no 8 de janeiro.

Para cada uma dessas camadas, me parece que há um processo de negociação que tem um componente de paralelismo — o papel do Gilmar, a presença do próprio Alexandre, do ex-presidente Michel Temer, negociando o PL da Dosimetria e à feição dos interesses do STF com o Paulinho da Força.

E em outros temas, o jogo fica meio que em aberto.

A impressão que nós temos olhando de cá, e essa é uma hipótese que a gente trabalha, é que, em alguns sentidos, algumas forças políticas que eram muito pujantes em 2013 e 2014 — como o próprio Michel Temer, Aécio Neves, Marconi Pirillo — estivessem usando esse momento de negociação da dosimetria para se recolocar.

A primeira foto do Paulinho foi com o Aécio e o Temer, logo que ele foi indicado para a relatoria pelo Hugo Motta. É como se o Centrão estivesse, para além da posição de grande operador das emendas e das decisões legislativas, tentando recolocar e reposicionar os seus nomes como atores inescapáveis do debate político.

O que, em algum sentido, acaba dizendo: "o lugar do antipetismo é de alguns desses caras aqui, não é desse pessoal que chegou agora, não é dos novos ricos".

É da turma que tradicionalmente já fazia isso há muito tempo.

Então eu creio que existem esses elementos que dariam essa feição de um acordo afrontoso, de um acordo no limite.

BBC News Brasil - O governo já acumula muitas derrotas para o Centrão no Congresso. Quando existe um grande embate, o Centrão acaba ganhando. Isso já virou uma regra do jogo político?

Souza - Eu acho que essa é uma regra. É uma regra que se apresenta não só para o governo Lula, mas se apresenta também no governo Bolsonaro e nos governos da Dilma e do Temer.

Da Lava Jato para cá, mas sobretudo a partir do impeachment da Dilma para cá, todos os governos tiveram que, em determinado sentido, entregar a chave do cofre para o Legislativo.

E quando a gente está falando do Legislativo, estamos falando basicamente o Centrão.

O Legislativo foi capaz de ir construindo instrumentos de anteparo para sua própria proteção. Em uma escala em que o Executivo sempre começa o jogo já perdendo.

A administração Bolsonaro já tinha entendido que não valia um embate.

É sempre bom lembrar da fala do Bolsonaro "mas eu era do Centrão, sempre fui do Centrão".

E quando vem o Lula, ele tem uma ideia muito consolidada de um presidencialismo de coalizão clássico, em que o governo tem um controle do orçamento e usa isso para efetivamente dizer quem recebe o que a partir das votações no Congresso.

E eu acho que o Lula tentou reconstruir esse presidencialismo de coalizão clássico.

O que o Lula não contava ou o que o governo não conseguiu entender é que a partir desses baixos números que o governo tem de apoio robusto, principalmente na Câmara, essa tarefa se torna quase impossível.

BBC News Brasil - Como fica o eleitor no meio de toda essa discussão no PL da dosimetria? O que estava em discussão originalmente eram as penas de prisão, mas o que acaba entrando também no debate é a pré-candidatura do Flávio Bolsonaro ou a disputa por vagas no Senado em Santa Catarina.

Souza - O grau de degradação institucional que a gente está vendo, que afeta a reputação de todos os poderes, se manifesta na cabeça do eleitor. Eles pensam: "os caras não se importam".

A imagem do Congresso é muito ruim, tanto que se nós olharmos para hashtags que são desqualificadoras ao Congresso — "Congresso, O inimigo do povo" — elas funcionam muito bem. Elas têm muito alcance, porque há um processo de descolamento entre o eleitor e a instituição, que no fim é muito perigoso.

O congressista sabe, sobretudo na Câmara dos deputados, devido ao enorme número de atores políticos envolvidos, que é possível diluir esse estrago. No fim, a figura que aparece é a do Hugo Motta.

Me parece que o impacto direto desse tipo de processo sobre o eleitor é mais um degrauzinho subido na escala de divórcio entre a cidadania e a representação — que é algo muito perigoso e que deu muita robustez da ideia de uma agenda anti-política e antissistema nas eleições de 2018, que continuou presente nas eleições de 2022, com essa bancada que é muito grande, de apoiadores do ex-presidente Bolsonaro.

E que acaba sendo fomentada e estimulada por ações também dos outros poderes. Questões que envolvem o STF, questões que envolvem o executivo, acabam fomentando também um tipo de discurso de descrença.

Acaba que, como o Congresso está muito direcionado e povoado pelas bolhas, isso atende a uma turma de uma outra de uma bolha. Os outros ficam meio indiferentes e a vida segue.

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