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Eleições 2018: Por que debate sobre segurança não deve dominar 2º turno, segundo professor de Cambridge

Segundo canadense Graham Willis, Haddad deve evitar embate com Bolsonaro na área, em que PT tem propostas fracas e o rival, 'discurso poderoso'.

9 out 2018 - 10h27
(atualizado às 10h42)
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Número de tiroteios no Rio de Janeiro aumentou após intervenção federal comandada por militares
Número de tiroteios no Rio de Janeiro aumentou após intervenção federal comandada por militares
Foto: EPA / BBC News Brasil

Em dez anos, o Brasil contabilizou 553 mil mortes violentas. São, em média, 153 por dia, o que fez o país atingir uma taxa de homicídios 30 vezes superior à da Europa. Nessa conta entram todos os tipos de vítimas.

Apesar da dimensão preocupante de um problema que se arrasta há anos e só se agrava, a segurança pública dificilmente vai ser protagonista do debate entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), na avaliação do canadense Graham Willis, professor da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, que nos últimos anos tem se dedicado a estudar a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).

Isso porque o candidato petista, ele avalia, deve evitar o embate com o militar reformado nessa área. Além de ter propostas "bem fracas" nesse sentido, pondera Willis, o PT sempre teve uma agenda pouco clara em relação à segurança.

Haddad teria dificuldades de enfrentar o "discurso poderoso" de Bolsonaro, que canaliza posições mais radicais que têm ressonância em muitos setores da sociedade. "'Bandido bom é bandido morto - e se você não concorda leva um para sua casa' é um discurso muito poderoso", diz o professor.

Para ele, se o petista quiser atrair o eleitor que não votou nele, vai precisar ter uma retórica mais ampla - que, por isso, dificilmente vai incluir alguma questão potencialmente polêmica - por exemplo, a violência policial.

Para resolver o problema da segurança pública, o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) elenca como primeiro item de suas propostas "redirecionar a política de direitos humanos, priorizando a defesa das vítimas de violência". Também defende penas mais severas para criminosos, a ampliação do direito a posse e porte de armas e o fim da punição para policiais que matarem em confronto.

Já Fernando Haddad (PT) prometeu redistribuir as responsabilidades entre as prefeituras, governos estaduais e o governo federal, aumentar o poder da Polícia Federal no combate ao crime organizado, retomar investimentos nas Forças Armadas e colocar um civil para ocupar o Ministério da Defesa - atualmente o general Joaquim Luna e Silva responde pela pasta.

Bolsonaro e Haddad dificilmente vão concentrar o debate na questão da segurança pública no segundo turno, diz especialista
Bolsonaro e Haddad dificilmente vão concentrar o debate na questão da segurança pública no segundo turno, diz especialista
Foto: Reuters / BBC News Brasil

No ano passado, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, disparou a quantidade de mortos pela polícia. Foram 5.144 em 2017, uma média de 14 mortos por dia, um aumento de 20% em relação a 2016. Foram contabilizadas 367 mortes de policiais no mesmo período, um recuo equivalente a 5% em relação ao ano anterior.

Ainda assim, os embates deixam policiais feridos com frequência. Reportagem do jornal Folha de S. Paulo analisou 491 registros de violência contra policiais militares de 2006 a 2013 em São Paulo e constatou, por exemplo, que policiais militares saem ilesos em apenas 8% dos casos.

Graham Willis lembra que a polícia do Brasil tradicionalmente sempre foi muito violenta e que a discussão de políticas para a segurança precisa passar necessariamente pelo controle interno e externo da atividade policial, por meio de corregedorias.

Mas, segundo ele próprio admite, não há clima para um debate como esse, em especial porque os policiais também são vítimas e isso tem um certo apelo em boa parte do eleitorado.

Intervenções militares como solução para conter a segurança pública precisam ser melhor debatidas, segundo especialistas
Intervenções militares como solução para conter a segurança pública precisam ser melhor debatidas, segundo especialistas
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Para o professor Anthony Pereira, diretor do Brazil Institute da Universidade King's College London, as propostas de Bolsonaro para a área de segurança pública não são avalizadas por nenhum acadêmico que estuda o tema.

"Pessoalmente, acho que as soluções dele não eficazes. Não acho esse tipo de libertação do poder letal dos policiais uma política pública efetiva", afirma o professor, ponderando que Bolsonaro se coloca como uma alternativa, ainda que radical, para o eleitorado que sofre com a deterioração da segurança pública.

Mas Graham Willis lembra que pesquisas mostram que, quando um líder tende a criticar o discurso do politicamente correto ou sugere uma ação mais repressiva contra o crime, há uma tendência das estatísticas de violência aumentarem. É o que aconteceu no Rio de Janeiro, onde número de tiroteios e de mortes aumentou após intervenção federal comandada por militares.

Willis afirma ainda que o protagonismo dos militares na área de segurança pública tende a continuar. Apesar de Bolsonaro ser um ex-capitão e contar com um general que acabou de aposentar a farda como vice, ele acredita que mesmo em uma possível gestão petista as Forças Armadas continuariam fortes.

"Os militares sempre foram muito poderosos mesmo logo depois da ditadura. Nos últimos anos eles estão falando mais abertamente, o que não acontecia", observa.

Além do debate sobre a eficácia do papel das Forças Armadas para conter violência urbana num longo prazo - criticada até mesmo pelo comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas -, Willis defende que se discuta o avanço do crime organizado e de organizações como o PCC.

Durante governo de Alckmin SP, queda de homicídios foi registrada; hipótese de PCC como responsável por redução, como defende o professor Graham Willis, classificada de 'ridícula' pelo governo paulista
Durante governo de Alckmin SP, queda de homicídios foi registrada; hipótese de PCC como responsável por redução, como defende o professor Graham Willis, classificada de 'ridícula' pelo governo paulista
Foto: EPA / BBC News Brasil

Ele acompanhou a rotina de investigadores de homicídios em São Paulo e argumenta no livro PCC - The Killing Consensus: Police, Organized Crime and the Regulation of Life and Death in Urban Brazil (O Consenso Assassino: Polícia, Crime Organizado e a Regulação da Vida e da Morte no Brasil Urbano, em tradução livre), em que descreve os resultados da investigação, que o responsável pela queda de homicídios no Estado é o próprio crime organizado, no caso o PCC.

O governo paulista classificou hipótese de ridícula.

https://www.youtube.com/watch?v=DRwNFOssWJc&t=231s

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