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Desde 2020, pessoas negras são as principais vítimas de violência política

Levantamento produzido pelas organizações Terra de Direitos e Justiça Global revela que um episódio de ataque político e eleitoral é registrado a cada 26 horas em 2022

21 out 2022 - 10h04
(atualizado às 10h18)
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Imagem de uma bandeira da vereadora assassinada por violência política Marielle Franco dentro da Câmara dos Deputados.
Imagem de uma bandeira da vereadora assassinada por violência política Marielle Franco dentro da Câmara dos Deputados.
Foto: Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil / Alma Preta

Andréia de Jesus, Benny Briolly, Erika Hilton, Jhonatas Monteiro, Marielle Franco, Matheus Gomes, Renato Freitas: esses são apenas alguns nomes de parlamentares negros que ao longo dos últimos anos sofreram algum tipo de violência política no país. De acordo com a segunda edição do levantamento "Violência política e eleitoral no Brasil" lançado na última semana (10), pessoas negras são vítimas de 50% dos episódios de violência política, sendo 203 casos registrados no período de 2 de setembro de 2020 a 31 de julho deste ano.

No mesmo período, brancos representam 45% dos casos, com 181 episódios, enquanto amarelos e indígenas são 1,2%, com 5 episódios no total. Em 3,2% dos episódios de violência ocorridos no período analisado (13 casos), não foi possível identificar cor e raça.

"Parlamentares negros, mulheres, LGBTQIA+ e defensores dos direitos humanos são as vítimas que mais sofrem com a violência política e eleitoral de forma reincidente", destaca a publicação.

Produzido pelas organizações de direitos humanos Terra de Direitos e Justiça Global, o estudo também revela que o perfil das maiores vítimas permanece sendo os homens cisgênero que, além de serem maioria em representação nos espaços de poder, são vítimas em 58% dos casos de violência política.

As mulheres, que representaram 16% das pessoas eleitas em 2020, são vítimas em 37% dos casos registrados de setembro de 2020 a julho deste ano. Mulheres negras são vítimas em 23% dos casos e mulheres trans e travestis foram alvo de 5% dos episódios de violência.

Crédito: Reprodução/ Levantamento "Violência política e eleitoral no Brasil"

De acordo com a coordenadora de incidência política da Terra de Direitos Gisele Barbieri, o racismo e o machismo andam juntos quando se analisa o cenário de violência política contra mulheres.

"Os corpos negros são alvos de uma violência muito mais intensa, tendo o racismo como vetor dessa violência. A violência política contra as mulheres negras, por exemplo, está presente antes delas se tornarem candidatas e parlamentares, e vai acompanhá-las de forma sistemática quando elas conseguem um mandato, uma forma evidente de retirá-las desses espaços pela intimidação", explica Barbieri, também coordenadora do estudo.

Leia mais: Na primeira semana do ano, dois vereadores negros denunciam novas ameaças

A cada 26 horas, há um caso de violência política no Brasil

O monitoramento revela que no período entre 2 de setembro de 2020 e 2 de outubro de 2022 foram encontrados 523 episódios de violência política e eleitoral, que tiveram como vítimas 482 pessoas - em algumas situações, uma mesma pessoa foi vítima em mais de um episódio. Os casos foram identificados a partir do levantamento de notícias em plataformas de busca da internet e redes sociais e considerou apenas os casos em que houve participação direta de representantes de cargos eletivos, candidatos/as ou pré-candidatos/as e agentes políticos.

Desde o início da série histórica, em janeiro de 2016, foram registrados 850 casos de violência política no país. Nesse período, já foram relatados 122 assassinatos, 166 atentados e 236 ameaças, além de casos de agressões, ofensas, criminalização e invasão. Em 2022, um caso é registrado a cada 26 horas.

Crédito: Reprodução/ Levantamento "Violência política e eleitoral no Brasil"

 "A violência política e eleitoral segue aumentando no país e, apenas nos dois meses que antecederam o primeiro turno das eleições em 2022, o número de episódios de violência política quase se igualou à quantidade de casos registrados nos primeiros sete meses do ano", pontua a publicação.

Apenas no período eleitoral, até o primeiro turno, entre 1 de agosto e 2 de outubro de 2022, 121 casos de violência foram registrados contra 113 agentes políticos, praticamente, dois casos por dia. Considerando os 68 casos de violência política disseminada - que tem como alvo apoiadores, eleitores e trabalhadores em diferentes funções - o período eleitoral registrou 189 ocorrências.

O levantamento também aponta que foi possível observar que, neste ano, o número de casos de violência política e eleitoral aumentou mais de 400% comparado a 2018, ano da última eleição presidencial e quando Jair Bolsonaro foi eleito.

Políticos locais e partidos progressistas são mais atingidos

Também é possível observar que os partidos progressistas e de esquerda se tornaram o principal alvo da violência política no período analisado. Se na primeira edição da pesquisa, que analisava o período de janeiro de 2016 a setembro de 2020, era possível observar que a violência atingia os partidos de diferentes espectros políticos, o período seguinte evidencia uma concentração dos casos em partidos do PT e PSOL.

A coordenadora de incidência política da Terra de Direitos Gisele Barbieri destaca que, embora a violência política se manifeste de forma sistemática, ela é estrutural e reproduz a violência do Estado contra determinados grupos e pessoas.

"Os dados da segunda edição nos mostram uma concentração expressiva de casos de violência política contra esses grupos, mas principalmente contra candidaturas e mandatos que atuam na defesa dos direitos humanos. Uma violência que é incentivada pelo próprio Presidente da República, que se coloca publicamente, há muito tempo e desde o começo do seu mandato, contra quem defende direitos e luta por justiça social no Brasil", finaliza.

Além disso, o estudo revela que os políticos que atuam nas esferas locais destacam-se como as principais vítimas da violência política e eleitoral. Vereadores candidatos, eleitos e em exercício são as principais vítimas, com 227 casos de setembro de 2020 a julho deste ano.

"Mesmo que tenhamos (ainda tímido) um aumento no número de parlamentares mulheres, negros e negras, transexuais, essas populações ainda são sub-representadas nos espaços de poder e decisão. A violência política intensificada contra esses grupos é uma forma de tentar intimidar e até mesmo aniquilar a participação deles nesses espaços, ocasionando uma perpetuação de um projeto de poder único", finaliza Gisele Barbieri.

PSOL: Parlamentares negras e LGBTQIA+ são as principais vítimas de violência política

Alma Preta
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