Após ter braço amputado, passista comemora retorno ao samba: "Pensei que tinha acabado"
Alessandra Silva, de 36 anos, chegou no hospital para retirar miomas e voltou para casa sem útero e com um braço amputado
A passista Alessandra Silva, de 36 anos, da Acadêmicos do Grande Rio, foi internada em fevereiro do ano passado para retirar miomas e, além de voltar para casa sem o útero, ela também teve um braço amputado. Assim, ela se tornou uma pessoa com deficiência.
Após os procedimentos, a trancista se viu sem trabalho, uma vez que precisava dos braços para trabalhar, e sem o samba, pois não se imaginava dançando com um braço amputado. No quarto do hospital Souza Aguiar, Alessandra pensou em pular do prédio.
"Pensei: ‘Se eu rolar para lá, só vão ver quando eu cair’. Mas aí, Deus me deu uma resposta na hora. Entrou uma faxineira e falou: ‘Tá fazendo o que aí? Eu sei o que você está pensando. Pode descer daí agora’. Eu ia pular, mas ela me acolheu e me colocou para ouvir um louvor, me deu um estalo e resolvi lutar", relembrou em entrevista ao gshow.
Alessandra terminou o noivado de 13 anos com o sargento da Aeronáutica Alessandro França Dias. "A ideia de ter filho, família, acabou. Meu trabalho acabou, e pensei que meu samba também tinha acabado, mas foi ele que me salvou", contou.
A mãe da passista, Ana Maria, de 64 anos, encorajou a filha a voltar para o samba e, certo dia, ela foi à quadra da Grande Rio para assistir o ensaio da escola. Alessandra foi convidada pelo mestre de bateria, Fafá, para sambar no lugar da rainha de bateria Paolla Oliveira.
"O coração acelerou e pensei: ‘Eu tô viva! Estou sambando! Não posso desistir, não", disse ao gshow.
De volta ao samba
Alessandra contou que no começo foi difícil por causa do braço, ela não conseguia se equilibrar e o corpo tombava para o lado direito. "O peso do corpo fica uma coisa impressionante e com as plataformas é ainda mais difícil. Mas fui melhorando e percebi que era importante alinhar o ombro e ficar controlando", disse.
A passista ganhou da diretoria da Grande Rio uma prótese para o braço amputado. Ainda em fase de testes, Alessandra começará a usar a prótese em breve, mas não será no Carnaval. Ela tem medo que a chuva danifique o acessório.
"Quando vi o braço levantando, a mão fazendo assim (mexe os dedos da mão direita) eu disse: ‘'Meu Deus! Eu vou poder me olhar no espelho!’ Fui para a internet comprar manguinhas com tatuagem e penso em colocar unhas de acrigel nos dedinhos (risos). A intensidade do braço mecânico é igual a da outra mão", contou.
Ela retomou o relacionamento com o noivo e, ao lado dele, saiu na rua pela primeira vez com o braço amputado. Alessandra contou que duas mulheres riram da situação dela em um bar e decidiu ir até elas. "Falei que estava ali para agradecer porque era por causa de pessoas como elas que me levantava todos os dias para lutar e correr atrás dos meus sonhos. Pessoas como elas me dão munição para levantar e sobreviver. Ainda avisei que tinham duas cervejas pagas para as duas e fui embora", disse ao gshow.
Atualmente, Alessandra conversa com outras pessoas com deficiência para trocar experiências. "Tenho que agradecer a Deus todo dia por ter me deixado as pernas para continuar fazendo o que eu gosto, que é sambar. Também nunca perdi a fé, que me salvou em vários momentos. Agradeço muito pela minha mãe que falava para mim: ‘Minha filha, levanta! Não desiste, não perde seu sorriso lindo que a gente ama ver'", afirmou.
A trancista ainda falou do seu sonho de ser mãe. "Meu sonho era ter um barrigão e a criança já ia nascer com roupa de passista! Mas aconteceu esse desastre todo e as pessoas diziam que eu podia adotar. Resisti um pouco, mas agora eu quero", contou.
"Vou adotar uma pretinha com o cabelo igual ao meu e colocar um monte de laço, vai ser a coisa mais linda do mundo", finalizou ela.
Alessandra Silva
Moradora de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, Alessandra trabalha como trancista há quase 20 anos. Apaixonada por samba e pela Acadêmicos do Grande Rio, ela começou a desfilar pela escola aos 19 anos de idade.
O último Carnaval que participou foi o de 2022, no qual a Grande Rio ganhou pela primeira vez o Carnaval do Rio. Na ocasião, a escola apresentou um enredo sobre o orixá Exu.