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Entrevista

Deise Nunes

"Sou um referencial para os negros do Brasil em termos de beleza e sucesso"

     Em 17 de janeiro de 1986, no final-de-semana em que se comemorava os 98 anos da libertação dos escravos, a gaúcha Deise Nunes, de 18 anos, tornava-se a primeira negra a alcançar o título de Miss Brasil, no Palácio das Convenções do Anhembi, São Paulo. Hoje, Deise Nunes, 33 anos, conta como foi vencer o Concurso Miss Brasil e o preconceito que sofreu. Fala da carreira, família, sobre Juliana Borges (atual Miss Brasil) e muito mais. Leia a entrevista.

Quando iniciou na carreira?
     Comecei a desfilar aos 14 anos. Acho que foi positivo em termos de encarar o público. Antes do Miss Brasil, já fazia 4 anos que eu trabalhava em passarela, desfilando para grandes públicos. Então no caminhar, na elegância, na postura e na própria maneira de encarar o público, sem dúvida, isso só veio a somar.

Como Miss Brasil, você viajou muito...
     Em todos os lugares que estive, sempre procurei plantar uma semente de amizade. Algumas pessoas pensam que eu sou esnobe, chata, mas não. Fui criada na mesma rua em que nasci, com meus amigos, estudei em colégio público, depois fui para uma escola particular com bolsa. Minha mãe sempre se sacrificou para me dar as coisas. Sou assim até hoje. A simplicidade é uma coisa importante nas pessoas, não é ser simplório, é ser humilde, não mudar sua maneira de ser. Não é deitar no chão para os outros passarem por cima, mas saber a dosagem. Tem muita gente que não é bonita, mas linda por dentro.

Foi muito explorada a questão de você ter sido a primeira Miss Brasil negra?
     Foi. Quando eu cheguei ao Miss Brasil com a faixa de Miss Rio Grande do Sul, as pessoas não acreditavam que eu era gaúcha. Diziam que eu devia ter nascido no Rio, na Bahia ou em Pernambuco e depois ter ido morar no Rio Grande do Sul porque os meus pais foram transferidos. O Rio Grande do Sul sempre mandou mulheres loiras, na sua maioria. Nós tivemos aqui uma colonização alemã e italiana muito forte, é lógico que as representantes gaúchas sejam loiras. Até no Miss Universo eles até se assustaram, porque o Brasil nunca tinha mandado uma negra. Hoje, as meninas que são eleitas me dizem que as pessoas ainda lembram de mim. Tive sorte de ter sido a primeira Miss Brasil negra. Querendo ou não, as pessoas lembram.

E o racismo?
     O negro no Brasil não tem referenciais, eu sou um referencial para os negros do Brasil em termos de beleza e sucesso. A criança não tem referencial de nada porque não tem uma apresentadora de programa infantil negra. A Mara Maravilha era a única morena. A loira faz sucesso na TV, até a Monique Evans teve que ficar loira para entrar na TV. A única morena hoje á a Luciana Gimenez, que também não é negra. Sobre a lei que exige um percentual de negros em elencos de novelas e peças publicitárias, acho que deve existir no começo, depois não. É preciso uma lei que imponha isso. Não temos apresentadores de TV negros. Tem a Glória Maria que é âncora de uma revista eletrônica, não é um programa dela, e tem uma menina chamada Luciana Camargo que trabalha na TV Cultura em São Paulo. Não temos um programa tipo da Hebe Camargo ou Adriane Galisteu. Tem o Netinho na Record aos domingos porque teve uma resposta muito positiva, ele tem um outro tipo de contrato que já não precisa mais correr atrás de patrocinador.

Teve um protesto contra o "apagão" de modelos negros no São Paulo Fashion Week...
     Foi uma manifestação porque tinha pouquíssimos negros, ainda mais em São Paulo, que tem milhares de modelos negros, até agências especializadas, e foram poucos os contratados para o desfile. Não entendo o que aconteceu este ano, porque a moda sempre foi de inovar, gosta muito de usar negros, japoneses, orientais. É quem tem muita modelo nova surgindo, é muita gente. O mercado é muito procurado e é muito cruel. Se você cai na simpatia do booker, eles vão te chamar sempre. Essa panela não é de agora.

Como faz para manter a beleza?
     Todo mundo vai envelhecer. Hoje tenho 33 anos e dois filhos. Não é fácil, as pessoas cobram muito. Depois de ser eleita Miss Brasil, as pessoas me olham dos pés à cabeça. Eu me cuido, é o mínimo que tenho que fazer. Fui Miss Brasil, mas tenho que me cuidar sempre. Faz bem, tem dias que a gente não está muito disposta, mas faz parte. Quando falo que já passaram 15 anos do concurso, as pessoas dizem “tudo isso?”. Todo mundo diz que continuo igual. Não acho que esteja igual, mas desde muito cedo comecei a cuidar da pele: não tomo sol, uso cremes todos os dias. Minha alimentação não é das melhores, não sou naturalista, adoro carne, mas tudo que é em excesso prejudica. O ser humano não foi feito para não comer alguns alimentos, ele pode simplesmente diminuir. As pessoas dizem que carne faz mal, mas eu adoro. Não como todos os dias, mas adoro uma picanha mal-passada no churrasco do final- de-semana e não vou deixar de comer. É isso que a gente leva da vida, adoro fazer festa, ficar até de madrugada jogando cartas com amigos, tomando vinho. Faço ginástica, já tive uma época que ia todos os dias, agora vou à academia quando dá.

Como você vê a facilidade com que as pessoas fazem lipoaspiração ?
     Venho de uma geração ruim, não muito saudável, da geração Coca-Cola. Hoje, além da Coca-Cola, essa geração tem o fast-food: o Mc Donald's, a batata-frita, o cachorro-quente da esquina, se come muito essas porcarias. Mais cedo ou mais tarde vai ter celulite, estrias, obesidade na adolescência, problema de postura. Essa geração anda, senta de qualquer jeito. Na minha época, minha mãe me corrigia o tempo todo: "não senta assim, olha a coluna". Por isso, me cuidar é algo que vem desde bem nova e a diferença é essa. Quando as pessoas comentam sobre a minha postura, respondo que é em função de ter sido criada assim, cada um tem uma postura. Acho é que as meninas muito novas tinham que cuidar mais do corpo porque não adianta nada comer, comer, fazer uma lipo e depois voltar a comer muito, porque você vai engordar de novo.

E a cirurgia plástica?
     É que a cirurgia plástica há anos era algo que não se falava. As mulheres que faziam não falavam, era um segredo porque somente os velhos faziam plásticas naquela época. Agora não, a coisa é muito escrachada e parece que é como ir à esquina, e não é. É um processo cirúrgico, tem anestesia, recuperação, é preciso todo um cuidado que se tem que ter para um resultado positivo, mas que muitas fazem e já estão saindo logo em seguida, sem nenhuma preocupação.

Nem como recurso estético para amenizar os traços que aparecem com a idade?
     Não posso dizer que não sou adepta, pois hoje está muito banalizada e não adianta ser contra. Não sou contra, mas não sei se faria. Na minha época não tinha isso.

O que você acha do número de cirurgias plásticas da atual Miss Brasil?
     Ela tinha um objetivo que foi alcançado, o título de Miss Brasil. Quando se tem um objetivo, conhece o corpo que tem e sabe onde tem que mexer, se for necessário, tem que mexer. Teve uma época em que eu disse que ela era muito jovem para fazer, mas depois me informei bem e não foram 19 cirurgias plásticas que ela fez, e sim umas correções de rosto que, para ela, eram importantes. Quem sou eu para dizer que ela não tem que mexer? Se ela se olha no espelho e não gosta, tem mais é que mexer. O que se tentou fazer aqui foi o mesmo que se faz na Venezuela, mas com uma diferença: na Venezuela todos sabem que a menina é preparada um, dois ou três anos antes de acontecer o concurso de Miss, onde ela aprende de tudo, inclusive se tiver que fazer plástica para correção, seja no corpo ou no rosto, mas que não é alardeado como aqui. A gente sabe que na Venezuela acontece, mas a diferença é que a Miss Venezuela depois de eleita não vai à televisão, ou em outro veículo de comunicação dizer "eu fiz tantas plásticas". Foi por isso que as pessoas se chocaram tanto quando ouviram a Juliana dizer que tinha feito, e ainda usou um número expressivo. Se tivesse dito que tinha sido umas cinco, que também já é bastante...

      As pessoas ficaram se perguntando se era preciso tantas. Muitas criticaram, acharam um absurdo, que não tínhamos mais uma miss com beleza natural, que foi a "Miss robô", "Miss plastificada", mas era o objetivo dela ganhar o concurso e se ela achou que tinha que fazer algumas intervenções, como foram feitas... tanto deu certo que ela foi vencedora do Miss Brasil e se não tivesse feito, talvez gerasse uma outra polêmica. Então, será que valeu à pena tudo o que ela fez ?

Você acha que em função dessas 19 intervenções, o título fica desmerecido?
     É que até então nós só tínhamos misses com beleza natural mesmo, como elas vinham ao mundo. Lógico que ninguém é perfeito, sempre vai ter uma coisinha ali, mas coisas que, de repente, são imperceptíveis ao olho do povo em geral e pra você não, é muito visível. A pessoa se olha todo o dia no espelho e sabe o que gostaria de mudar ou não, se o pneuzinho incomoda ou não. Pode ser mínimo, mas se for retirado vai fazer bem para ela. Acho que a cirurgia plástica deve ser feita, em primeiro lugar, porque a pessoa vai se agradar. Se tem que ser feita, faça para você mesmo, para se sentir melhor e não para contar que fez. Deve ser natural, as pessoas depois vão observar. É muito íntimo. Não é uma coisa para ficar se exibindo, se mostrando.

A Juliana fez um exibicionismo?
     Ela até não se exibiu, mas fez uma coisa que para o concurso de Miss Brasil foi bom. Ela ficou conhecida, querendo ou não, como a "Miss das plásticas". As pessoas perguntam quem é a Juliana Borges e a reposta é "Miss das plásticas”, esse estigma vai ser para o resto da vida. Ela divulgou o concurso, nunca se falou tanto. Foi a vários programas de televisão, deu várias entrevistas em jornais, revistas, foi capa da Folha de São Paulo, enfim, ela badalou pra caramba. Foi bom porque voltou à tona aquela polêmica: por que o concurso não é mais transmitido pela televisão? Porque, na verdade, as pessoas gostam de assistir ao concurso pela televisão, já que não têm a oportunidade de estar no local do evento, como era feito pelo Sílvio Santos na minha época: ele montava o concurso, passava pela TV, no SBT, e as pessoas iam na casa dos vizinhos, faziam uma turma, um bookmaker, uma aposta.

Você tem alguma proposta para a TV?
     Tive um programa chamado “Papos e Pratos”, era bem legal. Não tenho convite de nenhuma emissora, mas tenho projetos de voltar à TV e quero levar para o Amaury Jr, gostaria de fazer algo parecido com o programa dele... Temos acontecimentos importantes aqui, o próprio lançamento do Sheraton teve a presença de pessoas conhecidas como Cristiana Oliveira, Victor Fasano. Também gosto muito do Gente da Noite, do Tatata Pimentel. Acho ele maravilhoso, é um cara extremamente inteligente. Tenho vontade de fazer um talk-show, mas acho difícil. Fazer um programa como o do Jô aqui no Sul é complicado, tem que ser no máximo uma vez por semana pra não esgotar as possibilidades.

Você é uma pessoa da noite, gosta da noite em Porto Alegre?
     Sou completamente gente da noite, não que não goste do dia, mas a noite me fascina. Isso que nem nasci de noite, nasci à tarde. Na noite, já fiz grandes amigos. Adoro a noite, não só pra ir a restaurantes, boates, cinema. É a noite pela noite mesmo, ficar olhando as luzes pela janela de casa.

O marido tem ciúmes de você ?
     No começo foi complicado para ele. Quando me conheceu eu já era conhecida e ele sabia do meu trabalho. Foi complicado ser o “marido da Miss”, mas depois a gente conseguiu desmistificar isso, até porque ele é um empresário e não vive a minha vida, nem só para cuidar dos meus negócios. Isso é normal, depois as pessoas param de falar. Casei dois anos depois de passar a faixa, tinha 21 anos, muito jovem. Foi uma festa enorme, na Catedral, eu jamais poderia imaginar que aquela igreja estaria lotada e estava. Foi emocionante, uma acolhida muito legal. Estava retornando a Porto Alegre depois de quatro anos morando fora do Estado, me senti em casa. Um momento inesquecível da minha vida foi o dia em que casei.

Seu casamento foi um tanto polêmico...
     Foi bastante comentado porque tinha uma bronca com a minha mãe. Na verdade, ela nunca quis que eu casasse, mas não deu muito certo. Minha mãe tinha outro pensamento, acho que ela queria que eu casasse com um príncipe encantado, não sei o que ela imaginava. E aí eu voltando para Porto Alegre, ela disse que eu não era caranguejo para andar para trás. Ela tem um pensamento que não é o meu. Fiquei com ela 20 anos da minha vida, que foi quando decidi sair de casa. Fugi de casa na verdade.

Fugiu de casa?
     A minha mãe não gostava de nenhum namoro que eu tinha. Conheci o Lair, a gente começou como amigos e depois de um tempo começamos a namorar. Ela não aceitava e eu já estava ficando cansada. Tubo bem, é sua mãe, mas você quer ter a sua vida, ser responsável pelas suas atitudes. Pensei que fazendo 21 anos não tinha como, tinha que dar um jeito na minha vida. Não ia ficar o tempo todo grudada na minha mãe fazendo o que ela achava que tinha que fazer. Foi assim que, depois de completar 21 anos, decidi fugir de casa porque sabia que ela não poderia me buscar. Saí de madrugada, na calada da noite. Arrumei algumas coisas, a gente já tinha alugado um carro, encostei a porta do apartamento e fui para o interior de São Paulo. Ficamos três meses viajando: interior de São Paulo na casa de um amigo, Curitiba, Paraguai e depois cheguei em Porto Alegre. Aí, minha mãe não quis muito assunto. As pessoas perguntam se não seria mais fácil conversar com ela. Lógico que seria, se ela fosse me entender, mas ela achava que tinha razão sempre, era muito autoritária. Ela não iria argumentar. Por isso tive que tomar uma atitude mais drástica que ela jamais imaginou que pudesse fazer.

Depois disso vocês se falaram?
     Uma vez ela tentou me buscar aqui, mas também não deu certo. Depois a gente ficou muito tempo sem se falar. Ela falou comigo mais algumas vezes, mas coisas muito superficiais, pedir um dinheiro. Ela mora no Rio de Janeiro, com meu irmão. Ele esteve aqui há três anos, conheceu as crianças. Meu relacionamento com ele é normal. Acho que o tempo é o remédio para tudo. Faz 12 anos que eu sou casada. Não sei se em 12, 15 ou 20 anos, mas sei que um dia a gente vai sentar e conversar: dizer “fiz isso por isso”, “não entendi por isso”, e ela vai compreender, porque também não é o bicho de sete cabeças. Todo mundo casa na hora certa, me sentia preparada, já tinha feito tantas coisas. Casei cedo, mas me achava preparada naquele momento. Isso foi uma coisa que ela não admitiu. Ela estava meio que vivendo a minha vida.

E o marido, como lidou com tudo isso?
     Na época muito bem, porque nós combinamos juntos tudo isso. Lógico que não é uma situação confortável para ninguém. Minha mãe ficou com muita bronca por ele ter me ajudado. Ele poderia não ter feito nada e deixado eu sair sozinha se quisesse. Seria muito lógico se ele tivesse feito isso, mas não, ele ficou o tempo todo comigo. Às vezes, é uma situação constrangedora porque as pessoas perguntam "e a mãe, está bem?" e eu respondo "está", o que eu vou dizer?
 

Música
Todos os tipos, depende da fase
Filme
Titanic, achei interessante os efeitos
Livro
A Segunda Dama, de Irving Wallace
Comida
Massas
Bebida
Vinho
Restaurante
Casa Vecchia
Lugar
Garopaba, vou carregar as baterias para o resto do ano
Roupas
Conforto e praticidade. Gosto da roupa que me faz sentir bem, nem tudo o que é moda serve.
Jóias
Dvoskin e Cauduro
Perfumes
Giorgio e First
Mania
Sapatos. Já tive mais de 300 pares e tenho um desde os 14 anos, ele é perfeito e está na moda.
Personalidades
Airton Senna e Gustavo Kuerten. São duas pessoas muito parecidas, exemplos de caráter, humildade e vencedores.
Gosto
Sinceridade e amizade. Tenho muitos conhecidos, mas amigos mesmo não dá pra encher uma mão.
Odeio
Falsidade e oportunismo. Podia ter sido muito oportunista, mas nunca fiquei ao lado de uma pessoa apenas pelo que ela pode me oferecer.

Deise Nunes foi fotografada na Vitrine House
 
Estilo

Lorenzo Zaluski e Oskar Metsavaht
O gosto pelo esporte e pela aventura faz parte do estilo de vida destes dois homens.

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