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Pandemia e crescimento de ensino online alteram ranking do setor de educação

Dados da consultoria Hoper mostram efeitos da consolidação do setor no ensino privado superior, com forças 'emergentes', como Ânima e Vitru, enquanto alguns grupos tradicionais começam a perder força

1 set 2021 - 20h00
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Tanto a pandemia como um forte processo de consolidação contribuíram para mexer no tabuleiro do setor de educação. Se antes os grandes grupos fortaleciam sua presença por meio do ensino presencial, a necessidade de isolamento social obrigou a rápida migração para o online, quebrando a resistência a essa modalidade. Com as peças do jogo de xadrez mudando de casa, a disputa pelo primeiro lugar do ranking das maiores empresas do setor caminha para ser ocupada pela companhia que melhor se posicionar diante das recentes mudanças, com fôlego financeiro para seguir no processo de consolidação.

Essas são algumas das conclusões de pesquisa sobre o setor de educação superior privada no Brasil que será lançada nesta quarta-feira, 1º, pela consultoria especializada no setor Hoper, com os dados de 2020 e do primeiro semestre deste ano. No ranking das maiores companhias do setor, uma empresa que nasceu dedicada ao ensino online está despontando entre as primeiras colocações, posicionando-se como candidata a ocupar a primeira colocação. A catarinense Vitru, dona da Uniasselvi, fez um dos maiores movimentos do setor ao levar uma das empresas mais cobiçadas no setor de educação há vários anos, a UniCesumar, avaliada em nada menos do que R$ 3,2 bilhões.

Com a aquisição, a Vitru passa a ter 635 mil alunos, ocupando agora a terceira posição. No ano passado, antes do movimento, ocupava a sexta colocação. Outra que dá um salto no ranking é a Ânima, dona da São Judas, que comprou os ativos do Brasil da norte-americana Laureate, como as faculdades Anhembi Morumbi, e vai da 11º para a quinta posição neste ano. A aquisição, anunciada ano passado, foi aprovada recentemente pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

"A educação semipresencial é aquela que tem mais aderência com o aluno pós-pandemia. A UniCesumar sempre teve uma educação semipresencial de muita qualidade, e a Uniasselvi também, mas ela com um posicionamento mais de massa, principalmente pelo preço e a UniCesumar um pouco mais premium, com um tíquete maior. Juntas, elas vão fazer uma cobertura de mercado espetacular. É quase imbatível no semipresencial", afirma o presidente da Hoper, Willian Klein.

"Outro fato que mexeu muito nesse mercado foi que a pandemia fez emergir um novo aluno, que tem o mesmo apreço pela experiência do presencial com a entrega online de qualidade", afirma Klein. Nesse processo de mudança, o ensino presencial também precisará ser remodelado, diz o presidente da Hoper. "Os campi estão em transformação para ofertas novas experiências. Eles precisarão prever 'espaços maker', incubadoras de startups e ambientes de trocas para os alunos", comenta.

A UniCesumar, fundada em Maringá (PR) há quatro décadas, vai dar à Vitru um equilíbrio procurado por todo o setor. Além de ter cursos a distância com notas máximas no MEC, tem graduação em medicina - naturalmente, presencial. Esse curso, além de ter melhores indicadores de evasão e inadimplência, tem mensalidade média de R$ 8,5 mil. "Cada instituição tem muito a ensinar para a outra", afirma o presidente da Vitru, Pedro Graça, que diz que, com a união , a disputa pela liderança do mercado será uma consequência.

Líderes sob ameaça?

Por ora, porém, as primeiras posições seguem ocupadas pela Cogna, dona da Anhanguera, empresa que mais sofreu com a pandemia e que vem enfrentando a desconfiança de investidores. Uma das razões apontadas é que a empresa, muito endividada, demorou para mudar sua estratégia de negócio após a mudança do Fies em 2015 - algo que transformou a dinâmica do ensino superior, já que muitas empresas cresceram ancoradas no programa oficial de financiamento.

Prova da mudança radical do setor é que a antiga dona da Uniasselvi é a própria Cogna, que se desfez do ativo para cumprir uma exigência do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em 2016.

Mas os problemas financeiros não vão mudar a estratégia da empresa, garante Roberto Valério, presidente da Kroton, que abarca toda a operação de ensino superior da Cogna. De acordo com ele, já está em andamento um processo de digitalização, que foi acelerado pela pandemia. "Estamos vendo que os alunos do presencial estão com uma resistência de voltar às aulas todos os dias na universidade porque eles se adaptaram ao modelo (híbrido)", diz.

Primeiras posições do setor de educação seguem ocupadas pela Cogna, dona da Anhanguera.
Primeiras posições do setor de educação seguem ocupadas pela Cogna, dona da Anhanguera.
Foto: Divulgação / Estadão

Porém, a Cogna continua em reestruturação. A empresa está avaliando todos os cursos para saber quais deles têm mais adesão ao presencial e ao online, além de tentar aproveitar melhor o espaço físico dos campi, já que o ensino híbrido vai virar uma realidade para alunos também do presencial.

"Estamos renegociando aluguéis e encerramos 45 unidades próprias. Isso significa que a nossa estratégia é investir cada vez menos em prédios e mais na distribuição do ensino", afirma Valério. Uma das investidas da Kroton foi uma parceria com a operadora Tim para a criação da joint-venture Amply, plataforma para vender cursos totalmente digitais. "Só a Tim tem 50 milhões de clientes. Estimamos que vamos expandir a captação anual de alunos EAD em 15%", diz o executivo.

Força do presencial x online

A segunda posição do ranking é da Yduqs, ex-Estácio, considerando o número de matrículas. No entanto, considerando a receita líquida, a companhia já está em primeiro lugar, passando a Cogna. A diferença entre ela e a Cogna, segundo Klein, da Hoper, é que a ex-Kroton vem apresentando uma curva descendente, ao contrário da Yduqs, que segue crescendo. Já experiente no ensino a distância, com cerca de 400 mil alunos nessa modalidade, a Yduqs, que tem no guarda-chuva a marca Ibmec, acredita que esse seguirá como um pilar importante de crescimento, principalmente por conta do custo mais baixo e facilidade de acesso ao interior do País.

Apesar do pilar do ensino online ser muito importante, Eduardo Parente, presidente da Yduqs, acredita que a pandemia veio para confirmar a necessidade do ensino presencial. "Cerca de 85% dos alunos do EAD preferiam estar no presencial, mas fazem o EAD por falta de dinheiro, acesso ou tempo", diz.

Para a Yduqs, algumas aquisições com o olhar digital podem fazer sentido. Recentemente, por exemplo, anunciou em junho a aquisição da QConcursos, de ensino a distância (EAD) para alunos que buscam passar em concursos e também em vestibulares.

É um caminho similar ao que a Ânima quer seguir. A compra da rival Laureate representou mais para a empresa do que a posição de quinta maior empresa do setor do País em número de alunos. Com a aquisição, a companhia entrou no mercado do EAD mais puro e agora conta com 61 mil alunos nessa modalidade. Mas, antigamente, a companhia apostava no segmento de ensino híbrido.

"Muitos não entenderam o nosso movimento, mas queríamos sair da dicotomia de que o EAD tinha baixo tíquete e qualidade inferior para um modelo híbrido em que o estudante iria escolher o quanto e como ele iria usar", afirma Marcelo Bueno, presidente da Ânima. "O termo EAD ficou pejorativo, então temos que usar a tecnologia para mudar isso e fazer com que a pessoa nunca mais pare de estudar", afirma Bueno.

Cautela no setor

Apesar do avanço em certas áreas, os investidores ainda estão com um pé atrás com as empresas de educação. Todas as empresas do setor listadas na B3 apresentam queda nas ações desde o início do ano. A maior queda de todas é a da Cogna, que acumula uma baixa de quase 32% desde o início do ano e de 73% em relação ao período pré-pandemia.

Para Daniel Damiani, sócio da JK Capital, esses números podem mudar no futuro com o avanço da vacinação. "O setor está mais descontado do que deveria e muitos investidores estão olhando apenas para o recorte atual. É verdade que tudo pode acontecer, mas as empresas já estão mostrando que estão se readequando ao novo momento."

Estadão
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