'Avatar 3' é mais um espetáculo visual tocante de James Cameron, mas sua fórmula chegou ao limite?
Depois de um grande salto narrativo e técnico do primeiro para o segundo filme, 'Avatar 3' fica atrás e surpreende pouco, repetindo histórias, visuais e acertos
Se Avatar fala sobre o nascimento de uma família e O Caminho da Água vem da obrigação dessa família se refugiar, Avatar: Fogo e Cinzas, terceiro capítulo da história que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 18, é uma trama sobre luto — ou, ao menos, se propõe a ser isso em seu início. Afinal, Jake (Sam Worthington) e Neytiri (Zoe Saldana) terminam o longa-metragem anterior, após um intenso conflito contra a empresa que quer explorar Pandora, com a morte do filho mais velho. É um choque, uma ruptura, um fim e um começo para a família Sully.
É um início ousado para o filme. De forma mais sensível e bem resolvida do que Pantera Negra: Wakanda Para Sempre, outro longa-metragem hollywoodiano (e da Disney) que trata do luto, este novo longa de James Cameron trafega em zonas cinzentas da existência e tenta encontrar novos caminhos e dinâmicas dentro desse clã familiar. Neytiri não aceita a perda do filho e tenta culpar outras pessoas ao seu redor, enquanto Jake interioriza tudo e não sabe lidar.
O luto acompanha o tom da história e não há respostas fáceis para os personagens. "O cinema comercial tende a passar por cima [do luto]. Normalmente, quando a esposa morre, por exemplo, o marido sai em uma jornada de vingança, e todos celebramos essa violência pelas duas horas seguintes. Não acho que o cinema comercial lide com isso de forma honesta e autêntica", disse James Cameron, em coletiva de imprensa com a participação do Estadão. "O luto não para. Ele não é um gatilho para sair fazendo alguma coisa".
No entanto, apesar do bom começo, logo fica evidente um fantasma que ronda a franquia Avatar: a obrigação permanente de ser maior, mais grandiosa, mais impactante.
Após um primeiro filme que chocou as pessoas por conta do 3D imersivo e dos visuais encantadores e um segundo longa-metragem que conseguiu, 13 anos depois, refinar ainda mais os acertos, a saga criada por James Cameron parece refém de ter sempre ideias maiores, grandiosas, impactantes. Os filmes não chegam às salas apenas para contar histórias, mas para se afirmar como eventos — experiências cinematográficas que precisam justificar sua própria existência.
Avatar: Fogo e Cinzas vem cercado dessa expectativa. "O que James Cameron aprontou agora?", parece ser a pergunta silenciosa que ronda cada pessoa que entra na sala de projeção. O fato, porém, é que essa terceira parte da jornada de Jake e Neytiri é a que traz menos novidades técnicas da franquia e, na ânsia de surpreender narrativamente, Cameron acaba deixando de lado o luto após cerca de 30 minutos para focar em uma trama que soa como um eco direto de O Caminho da Água.
Andando em círculos
Visualmente, por um lado, há uma pontada inexplicável de frustração. Oras, tudo continua lindo na tela e o mundo de Pandora ganha ainda mais camadas, olhares e cores. O visual de Avatar 3 ainda é o principal ponto fora da curva de uma franquia tecnicamente impecável — e ainda é uma forte justificativa para ver o filme no cinema, na maior tela possível, como Cameron defende há décadas. No entanto, volta a bater a sensação de que cada novo capítulo deveria representar um choque sensorial inédito. E, por mais bonito que seja o terceiro filme, isso não acontece aqui.
O 3D se mantém no mesmo patamar do segundo longa e a captura de movimentos dos atores não avança de forma perceptível. Tudo é detalhado e tecnicamente irretocável, mas nada provoca o deslumbramento das sequências com as baleias em O Caminho da Água ou do primeiro contato dos Na'vi com a Árvore das Almas, no filme de 2009. Nada, desta vez, chega a esse patamar.
Talvez percebendo essa limitação, James Cameron tente amplificar a narrativa. O luto é o ponto de partida, mas não o destino final. Após a perda do filho e o embate com a empresa humana, Jake Sully e Neytiri enfrentam uma nova ameaça dentro de Pandora: o Povo das Cinzas, uma agressiva tribo Na'vi conhecida por sua violência extrema e sede de poder, liderada pela implacável Varang. O novo clã, que domina o fogo, surge como uma força desestabilizadora no frágil equilíbrio do planeta.
Diante de novos esforços humanos de colonização e desse inimigo interno, a família Sully precisa lutar pela própria sobrevivência e pelo futuro de Pandora. O conflito leva os personagens ao limite emocional e físico, mas também desloca o foco dramático do filme.
O resultado é claro: o luto, que emociona e impressiona nos primeiros 30 minutos, não se sustenta ao longo dos extensos 197 minutos de projeção — ou três horas e 17 minutos. Não que Avatar 3 precise se restringir a esse tema, mas a mudança abrupta de tom enfraquece a proposta inicial. Quando a tribo do fogo entra em cena, a sensação é de que Cameron abandona um caminho promissor para retornar a conflitos já explorados e resolvidos anteriormente.
Essa escolha reforça a impressão de que a história não avança, apenas gira em falso. O segundo filme já dialogava excessivamente com o primeiro. Agora, o terceiro repete estruturas, dilemas e metáforas do segundo, como se a franquia estivesse presa a um looping narrativo. Parte disso parece vir da insistência de Cameron em trabalhar com personagens de psicologia simples e de manter o foco quase exclusivo na família Sully.
Mesmo quando o roteiro tenta expandir o olhar — seja com Spider, o humano criado em Pandora, ou com Kiri, a adolescente vivida por Sigourney Weaver —, as discussões acabam sempre retornando ao mesmo núcleo e às mesmas tensões familiares. Até o paralelo com refugiados, explorado com força em O Caminho da Água, reaparece quase nos mesmos termos. "Os Sully são deslocados pela violência. Qualquer pessoa que tenha sido forçada a deixar sua casa sabe o quanto isso é emocionalmente traumático. Estamos lidando com essa ideia de: onde eu pertenço? Onde é o meu lar?", explicou Cameron na coletiva. Mas essa não já havia sido exatamente a grande questão do segundo filme?
E, convenhamos, não era necessário retomar, mais uma vez, toda a discussão envolvendo as baleias de Pandora. O arco se repete ponto a ponto, como se pouco tivesse sido dito antes. Faltou disposição para explorar novos símbolos, novos conflitos ou novas relações com a natureza — algo que sempre foi um dos motores criativos da franquia.
James Cameron: emoção genuína
A salvação de Avatar 3, que poderia facilmente se tornar apenas um espetáculo repetitivo, está na certeza de que James Cameron ainda sabe emocionar. Mesmo com poucas novidades visuais e uma história que parece sem grande fôlego, Pandora continua tocando o espectador, e a família Sully convence pelos dramas humanos e reconhecíveis que enfrenta. O luto, a dor da perda, a condição de refugiado, a relação com a natureza — tudo isso segue presente. Pandora funciona como um espelho do mundo contemporâneo filtrado pela sensibilidade do cineasta.
É difícil prever se Avatar: Fogo e Cinzas conseguirá repetir o sucesso comercial dos antecessores. Na coletiva, Cameron deixou transparecer a pressão por uma grande bilheteria. "É o modelo de negócios mais estúpido da história. Para dar certo, o filme precisa estar entre os dez maiores da história antes mesmo de termos escrito uma palavra", disse ele. "A última vez que contei, havia 3.800 nomes nos créditos deste filme. Isso são 3.800 empregos".
A pressão é evidente e, olhando daqui, a sensação é de que este terceiro capítulo dificilmente alcançará os mesmos números estratosféricos dos anteriores. Com menos novidades e menor impacto cultural, o filme também tende a passar discretamente pela temporada de premiações. Talvez seja o momento de James Cameron buscar novos caminhos dentro de Pandora — ou, quem sabe, novos mundos para explorar. Mesmo com toda a excelência técnica do cineasta, toda fórmula tem um limite, e Avatar 3 já indica que essa franquia começa a se aproximar do seu.