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Jafar Panahi aborda círculo social iraniano em novo filme. Entrevista


Foto: Rogério Lorenzoni

Depois de uma vinda tumultuada para o Brasil, o cineasta iraniano Jafar Panahi chega à cidade de SP para divulgar seu mais novo filme O Círculo, grande vencedor do Leão de Ouro deste ano, em Veneza.
Jafar Panahi foi assistente de direção de Através das Oliveiras, de Abbas Kiarostami, e dirigiu uma série de curtas e documentários antes de filmar O Balão Branco, sucesso internacional, vencedor do prêmio Camea D’Or no Festival de Cannes de 1995. Seu segundo longa, O Espelho, ganhou o Leopardo de Ouro no Festival de Locarno.
Em O Círculo o cineasta acompanha a trajetória de sete mulheres, no cotidiano patriarcal do Irã. Abordando a visão feminina, o diretor discute tabus da república islâmica como aborto, prostituição e abandono de crianças. Apesar de premiado, o filme ainda não foi exibido no Irã, onde aguarda ser liberado pela censura.

Como é o regulada a censura para produção e exibição de filmes no Irã?
Há um Ministério de Cultura que recebe todos os projetos. Estes projetos passam por duas etapas. Na primeira, eles demoram de cinco a seis meses para receber autorização para produção. Depois de prontos, precisam de outra autorização, que é para a exibição. Todos os filmes passam por esse processo.

Como é lidar com problemas de censura em seu país? Ele chega a afetar sua vida pessoal ou limita-se a profissional?
Na verdade, o artista nunca está longe de sua vida privada. Um diretor não é um homem comum que vai do todos os dias para casa depois do trabalho. Cada minuto de sua vida é parte de seu trabalho. Quando há complicações envolvendo sua obra, isso passa a fazer parte de toda sua vida.

Em O Círculo você retrata o universo feminino reprimido. Como é a sua relação com esse universo?
O filme não é apenas sobre mulheres. É sobre um círculo de fatores que estão sempre ligados. Os limites não existem de um lado para o outro. Todos dependem uns dos outros. Quando trato sobre um tema como esse, não é apenas sobre as mulheres que estou falando, mas sobre uma realidade social que envolve uma realidade política, social e cultural do meu país. É um círculo que existe para todos, e todos querem sair ou fazê-lo maior.
Não falamos de troca de um sistema político, mas sobre trocar os limites humanos. É possível que o político fique estável, mesmo com as trocas. Mas cada cidade muda, seu universo muda, e não é possível ficar sessenta, setenta anos sem uma mudança. Meus filmes anteriores eram sobre crianças e meninas. Eu sempre pensava que posição eles teriam futuramente. Será que eles teriam coragem para lutar por seus sonhos ao terminar o mundo suave e bonito de criança? O Círculo começa com uma jovem. Ela é muito idealista e quer chegar aos seus sonhos. Não é pessimista como os outros.

Você ainda não consegui exibir O Círculo no Irã. Você aceitaria exibi-lo se órgão censor sugerisse cortar algumas cenas?
Se me fizessem essa proposta eu diria não. Nem um único frame seria retirado.

Seus filmes fazem sucesso em vários lugares do mundo e foram premiados em grandes festivais. Como são recebidos seus filmes no Irã? Fazem sucesso com o público?
Balão Branco fez muito sucesso. Ele foi exibido na TV e o resultado foi positivo. Mas ainda é difícil a exibição em bons cinemas. Nós passamos por problemas de copyright porque não temos uma regulamentação clara sobre isso. Eu já tive problemas com exibição sem minha autorização e não quero mostrar meus filmes sem que esteja claro este tema.

Qual a bilheteria de um filme de sucesso no Irã?
Chega a dois ou três milhões de pessoas.

Qual a média de produções iranianas por ano, e quantos cinemas há no país?
Cada ano são produzidos de sessenta a setenta filmes e o número de cinemas chega a trezentos. Temos muitos problemas com locais para exibição. Vários cinemas fecharam e não reabriram. Acabaram transformando-se em lojas.

O cinema norte-americano é exibido normalmente?
Às vezes sim. Depende do tema, mas são exibidos mais filmes dos países europeus.

Você já tem projetos de um próximo filme?
Eu tomei a decisão de pensar sobre este filme depois de exibir O Círculo no Irã. Ainda preciso ver a reação do público. Saber o que acharam. Só aí pensarei num novo filme.

Como são financiadas suas produções?
Eu mesmo produzi o filme em parceria com uma empresa italiana. Os filmes iranianos precisam de muito pouco dinheiro. Eu não tenho limite financeiro, posso fazer meu próprio filme. Mas, embora nosso cinema precise de pouco dinheiro, ainda há diretores que têm problemas. Dizemos que o cinema iraniano é barato, mas comparado a outros países. No Irã podem ser proporcionalmente caros.

O cinema iraniano é considerado poético. Já o americano, violento. Como você explica o sucesso do cinema iraniano nos EUA?
Os festivais são totalemente diferentes do cinema normal e comercial. As mostras querem apresentar novos filmes e diferentes caminhos. Os festivais entendem que o público é diferente e de países diferentes. Eu gosto do cinema iraniano e luto para que ele seja apresentado ao mundo. No cinema americano você precisa de muitos atores caros, financiamentos, agências e publicidade. Os filmes são sempre destinados a um público específico. Você sabe onde deve haver sexo e violência. Já o cinema iraniano tem uma poesia e temas sociais muito fortes. Ele é muito suave. Vemos o cinema como arte e não como um negócio. Quando faço filmes não penso em outros lugares, nem festivais, ou pessoas específicas. Penso nas pessoas do meu país. Eu não faço filmes comerciais e não procuro um público específico. Meus filmes são feitos para uma pessoa. Para mim o público tem que descobrir o filme. Sei quando o filme está bom quando apenas uma pessoa me diz que está certo. Eu faço filmes para esta pessoa. Faço filmes para a minha alma. Se ela está satisfeita, sei que o filme é bom.

(Luciana Rocha/ Redação Terra)

 

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