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Nos EUA e no Japão, robôs são alvo de violência humana

Na visão de especialistas, ataques a robôs e carros sem motorista refletem a agressividade comum entre os humanos

31 mar 2019 - 05h12
(atualizado em 1/4/2019 às 13h55)
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Um robô que pedia carona foi decapitado na Filadélfia. Outro, vigia no Vale do Silício, foi nocauteado. Um terceiro, que também era segurança em São Francisco, foi afogado com molho para churrasco. Mais: é um fenômeno global. Em Osaka, no Japão, três garotos deram uma surra num androide. Em Moscou, um homem atacou um robô com um bastão de beisebol. Por que fazemos isso? Será medo de que eles tirem nossos empregos? Que controlem cada vez mais nossas mentes com sua capacidade e malícia?

É possível que sim: o espírito de "revolta" está já presente na própria palavra robô, usada pela primeira vez por um dramaturgo tcheco, Karel Capek. Ele utilizou um termo antigo para "servidão" ao se referir aos autômatos. O medo feudal de revolta se transferiu aos servos mecânicos - não à toa, filmes de ficção científica teorizam sobre isso.

Em uma pesquisa, o comediante Aristotle Georgeson descobriu que vídeos de robôs levando surras, postados por ele no Instagram na conta Black Webber, são bem populares. Muitos dos comentários que a conta recebe parecem refletir o medo de que uma rebelião de robôs esteja em curso. Segundo ele, parte dos comentaristas aprova a pauleira nos robôs, sob alegação de que "temos que fazer isso para que eles nunca se rebelem". Outros se preocupam: "Se os robôs virem esses vídeos, eles podem não gostar e aí sim se rebelar."

Para Agnieszka Wykowoka, neurocientista cognitiva, o antagonismo humano aos robôs se assemelha ao modo como humanos se agridem. O abuso contra os robôs, disse ela, pode derivar da psicologia tribal de que existem "os de dentro e os de fora". "Você tem um personagem que pertence a uma categoria diferente da humana", explicou. "É fácil, portanto, entrar nesse mecanismo psicológico de ostracismo social porque o robô não é um membro do grupo. A desumanização ocorre mesmo os robôs não sendo humanos."

Paradoxalmente, nossa tendência a desumanizar os robôs vem justamente do instinto de querer torná-los humanos. William Santana Li, presidente executivo da Knightscope, a maior provedora de robôs de segurança dos EUA - dois dos quais sofreram vandalismo na Califórnia -, disse que, embora ele próprio evite tratar seus produtos como se tivessem sentimentos, seus clientes parecem não ser capazes disso. "Uma maioria significativa acaba dando nomes a suas máquinas", afirmou Li. "Elas viram a Rose dos Jetsons e o C-3PO de Star Wars."

Para Wyslowska, a crueldade que resulta dessa tendência reflete em uma síndrome de Frankenstein. "Tememos essas coisas que criamos, mas não entendemos bem. Elas se parecem um pouco conosco, mas não o suficiente", diz a pesquisadora.

Semelhança. Em seu ensaio "Quem tem Medo dos Humanoides?", Fredéric Kaplan, catedrático da Escola Politécnica de Lausane, na Suíça, sugeriu que os ocidentais se acostumaram a se ver como máquinas informadas - e talvez não consigam separar a ideia de humanidade da visão de máquinas. O sistema nervoso só pôde ser entendido após a descoberta da eletricidade. O DNA é explicado como análogo a códigos de computador. "A cada momento nos vemos espelhados nas máquinas que criamos", escreveu Kaplan.

Abusos contra robôs humanoides podem custar caro, mas talvez haja uma solução, disse Wykowska. Ela relatou uma história sobre robôs que foram introduzidos numa sala de aula de um jardim de infância. Segundo ela, as crianças "eram brutais" com os robôs.

"Isso prosseguiu até que os cuidadores começaram a dar nomes aos robôs", explicou Wykowska. "De repente, eles deixaram de ser apenas robôs - viraram Andy, Joe, Sally. Nesse momento, acabou o comportamento brutal. "Batizar um robô começa imediatamente a trazê-lo para mais perto do grupo". / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

Estadão
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