Há 2000 anos o mundo não vê nada parecido. É o que diz o folheto publicitário do polêmico "parque temático cristão", que será inaugurado na próxima segunda-feira, em Orlando, na Flórida, Estados Unidos, e que promete recriar o Velho e o Novo Testamentos, a Terra Santa e a Paixão de Cristo com um aparato digno de um Cecil B. de Mille, o mestre das superproduções bíblicas de Hollywood.Em uma área de 60 mil metros quadrados, localizado entre a Universal Studios e o Walt Disney World, "The Holy Land Experience" (HLE, a "Experiência na Terra Santa") permite ao visitante percorrer a réplica da Via Crucis de Jesus até sua crucificação, proporciona uma visita ao Palácio de Herodes, à praça do mercado de Jerusalém da época do primeiro século de nossa era ou ao Túmulo de Cristo.
Proselitismo religioso pró-cristão? É o que pensa parte da comunidade judia de Orlando. Parque temático para partilhar a mensagem de Deus e de Seu Filho? É o que alega seu criador, Marvin Rosenthal, hebreu-cristão, ou seja, um judeu que acredita em Jesus Cristo. A controvérsia está lançada na terra do Mickey Mouse e do Pato Donald.
O estacionamento do parque fica ao pé de uma réplica das muralhas de Jerusalém. O visitante entra na Cidade Santa por uma de suas portas, uma reprodução de um arco romano. E aí começa "uma viagem multisensorial a 11 mil quilômetros de distâncias (da Terra Santa) e há mais de 3.000 anos no passado", segundo seu criador.
"O ELH é um museu bíblico vivo que pretende abranger, de 1.450 A.C., quando Moisés e os israelenses erravam pelo deserto, até a morte de Jesus. Tudo isso graças aos efeitos especiais de luz e som, cenários com figurantes com trajes bíblicos ou couraças romanas, ou a um filme - exibido em uma sala do Palácio de Herodes - no qual, em vinte minutos, se mostra do Gênesis até a ressurreição de Cristo.
Cerca de 150 pessoas, entre extras e funcionários, "todos cristãos", trabalham no parque, que inclui também uma loja de objetos trazidos da Terra Santa (aqui os mercadores são do século XXI). Quase ninguém saúda com um "olá" e sim o bíblico "shalom".
Ante as escadarias do Templo do Grande Rei, o figurante William Francis, construtor de piscinas, está fantasiado de mercador e tenta vender a "escrava" Joyce Newmayer, que é escritora. Não muito longe dali, seu marido Greg Newmayer, técnico em computadores, faz as vezes de sacerdote do templo.
Os três integram o quadro de figurantes contratado pelo HLE. "Adoramos este trabalho em um lugar incrível", afirmam. O mesmo entusiasmo reina entre os funcionários que terminam, em um recinto fechado, "a maior reprodução do mundo em escala (14 por 8 metros) da Jerusalém do século I", com 10 mil figuras trabalhadas e pintadas a mão.
Segundo Rosenthal, presidente da Zion's Hope Inc, entidade evangélica cristã "sem fins lucrativos" e proprietária do terreno que abriga o parque, o objetivo é "divertir, instruir e reforçar a fé de seus visitantes".
Parte da comunidade judia não acha o mesmo. Daniel Wolpe, presidente da congregação de rabinos de Orlando, teme que o parque tenha fins "proselitistas" em favor da fé cristã. "Uma coisa é criar um centro em que se renda culto a uma tradição religiosa, e outra é fazer proselitismo para que as pessoas renunciem a suas crenças", o que é condenável", afirma.
Rosenthal se levanta contra essas acusações, contrárias à "liberdade de expressão e de religião nos Estados Unidos". "Não obrigamos ninguém a vir ao parque", alega.
Com um custo de 16 milhões de dólares, financiados por contribuições privadas, fundações cristãs e rendimentos próprios, segundo Rosenthal, o parque terá de travar uma dura competição com os megaparques temáticos situados na região. "Esperamos cerca de 225.000 visitantes por ano e com isso sobreviveremos", afirma o promotor. Uma expectativa modesta comparada com os 15 milhões de pessoas que visitam todos os anos o Disneyworld ou os oito milhões que vão ao Universal Studios. "Não nos interessa ganhar dinheiro", insiste Rosenthal.
E se o parque temático cristão virar um êxito financeiro? "Então vamos abaixar o preço da entrada", assegura. No momento, os primeiros visitantes terão de pagar 17 dólares nas bilheterias localizadas junto à "Porta de Jerusalém". Um terço do que custa para entrar no Disneyworld.